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Nascentes do Plano sob ameaça

CB, Cidades, p. 38
28 de Mar de 2009

Nascentes do Plano sob ameaça
Erosões próximas aos olhos d'água, bocas de lobo insuficientes para dar vazão às enxurradas, raízes de árvores expostas e lixo nas lagoas são indicadores de que o manejo urbano não tem sido adequado

Izabel Toscano
Da equipe do Correio

As nascentes do Plano Piloto estão ameaçadas por erosões crescentes e entulho. Logo na entrada do Parque Ecológico de Uso Múltiplo da Asa Sul, na 613/614 Sul, um irônico sinal de alerta.
Apesar de cercado com placas de proibido jogar lixo ou entulho, bem embaixo da sinalização há pneus velhos, uma caixa com lixo e um galão de água com a boca virada para cima. Mais adiante, garrafas de vidro e sacolas plásticas contaminam a lagoa. Na nascente, o mais preocupante: uma grande erosão.
Sem grama ou árvores próximas às nascentes, a enxurrada resultante dos dias de forte chuva carrega terra e toda sorte de dejetos das vias para a lagoa. A vegetação das margens é atingida e, gradativamente, destruída. O acúmulo de terra assoreia córregos e lagos. O lixo contamina a água.
No parque da Asa Sul, a situação se complica porque as bocas de lobo não conseguem dar vazão ao volume de água da chuva, em parte porque não têm o tamanho adequado e em parte porque frequentemente ficam repletas de lixo urbano. Dessa forma, a água transborda e segue em direção à nascente. E o ciclo recomeça: boca de lobo ineficiente, ausência de vegetação, lixo. Tudo contra a preservação. "As enxurradas abriram uma erosão de 12m antes da nascente. Essa erosão já tem 4m de profundidade", lamenta o voluntário que adotou as nascentes do parque da Asa Sul e do Olhos D'água, na 412/413 Norte, o advogado Ricardo Eugênio Montalvão Coelho.
No Olhos D'água, a nascente, que fica fora do parque, na entrequadra 212/213, está próxima de prédios residenciais. Foi recentemente cercada, mas já se observam sinais de vandalismo.
Qualquer pessoa tem acesso ao local. "A gente usa na hora do descanso para se banhar ou escovar os dentes", confirmou um auxiliar de limpeza que preferiu não se identificar.
Além da ausência de consciência ambiental, em tempos de chuva a água escorre das ruas carregando o que encontra pela frente e desembocando na nascente. A erosão no local aumenta a cada dia, como indicam as raízes de árvores que protegem as margens, cada vez mais expostas.
Para a geógrafa e participante do Fórum de ONGs ambientalistas Mara Moscoso, a área do parque da Asa Sul está degradada.
"Em muitas partes não se vê nem ao menos grama. A água ali é mais turva do que no Parque Olhos D'água. Como fica próximo à L2 Sul, quando chove a água carrega óleo dos carros e lixo para a nascente. Se existisse vegetação próxima a ela, a área verde funcionaria como filtro. A própria raiz seguraria a água e diminuiria sua intensidade", explica a geógrafa. Segundo ela, a diminuição da velocidade da água reduziria, também, o risco de erosão. "A água cava a terra, causando erosão, porque não há nada que a impeça. Até a grama é importante. Caso contrário, ocorre o assoreamento, que é o acúmulo de terra na água, como acontece no Lago Paranoá", alertou Mara. Na prática, as agressões à natureza causam a morte da vegetação e de animais que dependem dela. "Isso além de tornar o espaço visualmente desagradável e de tornar real a possibilidade de falta de água no futuro", disse a geógrafa.

Saiba como ajudar
Faça sua parte
As nascentes devem, preferencialmente, estar cercadas. Mesmo que não estejam, procure não se aproximar, principalmente com animais, ou usar a água dali para evitar contaminação
Não jogue lixo na rua. Isso evita que as bocas de lobo entupam em época de chuva, o que prejudica o escoamento da água, que pode parar na nascente em forma de enxurrada, levando e arrancando o que encontra pela frente.
Recomponha a vegetação nativa nas margens da nascente. Uma maneira é plantar mudas de espécies naturais da região para conservar o solo e evitar ou minimizar o assoreamento

Solução exige trabalho em duas frentes

Apesar de o diagnóstico ser pouco otimista, a solução para o problema não é tão complicada, de acordo com os especialistas. "Há que se rever o funcionamento das bocas de lobo para que a água da rua não vá para as nascentes e é urgente que se faça uma recuperação da vegetação no local. É mais fácil gastar menos prevenindo, porque a água é sempre prioridade, por isso é importante a educação ambiental", alertou a geógrafa Mara Moscoso.
Presidente do Instituto Brasília Ambiental, Gustavo Souto Maior reconhece que as nascentes estão ameaçadas, mas explica que os danos estão sendo minimizados com os parceiros do programa Adote um Parque. "Temos 69 parques e sozinho o governo não tem dinheiro para cuidar de todos. Com os parceiros, temos certeza de que a situação vai melhorar. Acredito que até o fim do ano o cenário seja outro no parque da Asa Sul", comentou.
O Ibram estima que existam mais de mil nascentes espalhadas pela cidade. Das 300 identificadas, 199 foram adotadas desde 2001, quando surgiu outro programa, o Adote uma Nascente. Cuidar de um olho d'água significa arcar com os custos da preservação e impedir a invasão dos 50m destinados à área de preservação permanente (APP).
Souto Maior concorda, no entanto, que apenas com a recuperação dos parques e uma solução para a rede de drenagem do Plano Piloto haverá solução definitiva para a questão. Nesse sentido, espera que o programa Águas do DF, do governo local, engrene. A iniciativa prevê a ampliação da rede de drenagem, com o consequente aumento de captação das águas da chuva nos pontos críticos do DF, incluindo o Plano Piloto. Um empréstimo de R$ 100 milhões de dólares já foi aprovado pela Comissão Andina de Fomento.
Faltam ainda a aprovação do governo federal e do senado.

CB, 28/03/2009, Cidades, p. 38

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