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Mutirão tenta salvar 198 crianças índias desnutridas

Folha de S. Paulo-São Paulo-SP
Autor: HUDSON CORRÊA
04 de Mar de 2005

Desnutrição atinge 23% de 860 crianças em aldeia do MS

Uma equipe da Funasa (Fundação Nacional de Saúde) começou ontem um mutirão na aldeia de Porto Lindo, no município de Japorã (464 km de Campo Grande), para socorrer 198 crianças índias desnutridas menores de cinco anos de idade.
Segundo a Funasa, 23% de 860 crianças estão desnutridas, sendo que 98 delas apresentam desnutrição grave e cem apresentam a do tipo moderada. A média nas aldeias de Mato Grosso do Sul é de 12%. Diante da situação, foi montada uma operação de emergência pela equipe local da Funasa em Japorã.
Neste ano, seis crianças morreram na aldeia e uma nasceu morta. Nos atestados de óbito arquivados no posto da Funai (Fundação Nacional do Índio), dentro da aldeia, constam como causas da morte doenças com pneumonia, desidratação e diarréia.
O médico da Funasa, Luiz Fernando Ribeiro, 57, disse que a desnutrição pode ser entendida como um dos principais fatores que causaram as mortes, pois diminuiu a defesa de crianças contra doenças.
A assessoria da Funasa em Brasília disse ontem que apenas duas mortes de crianças em Japorã foram realmente causadas pela desnutrição. Anteontem, os prefeitos de Japorã, Rubens Marinho (PT), e de Iguatemi (cidade vizinha), Lídio Ledesma (PDT), disseram ter recebido informação de técnicos da Funasa local de que as seis crianças morreram desnutridas.
Ribeiro, acompanhado de uma enfermeira, uma auxiliar e agentes de saúde, pesava ontem crianças menores na casa de reza em uma área dentro da aldeia.
Na estrutura coberta de sapé, a equipe usava um saco para levantar cada criança, pesá-la, depois medir a altura e comparar os dados com a idade.
A índia guarani Cássia Ramires, de um ano e um mês de idade, foi encaminhada após a pesagem direto ao hospital de Iguatemi. Ela pesava apenas 6,5 kg, mas deveria ter, segundo Ribeiro, ao menos 9,5 kg.
O pai, o índio guarani Bonifácio Ramires, 66, disse que a criança teve diarréia e vômito há uma semana. "Ela não quer comer de jeito nenhum", disse Ramires. Em uma semana, a criança perdeu 500 gramas. Foi o segundo caso grave encaminhado para internação durante o mutirão.
Ramires nega que a criança passe fome. "Eu tenho minha aposentadoria. Graças a Deus, tem o que comer", afirmou o índio.
"Na minha opinião, a desnutrição é a falta de atenção do governo com o índio", afirma o capitão (líder máximo) da aldeia Porto Lindo, o guarani Vanderlei Pedro Gonçalves, 30.
Segundo ele, o principal problema na aldeia é a falta de terra para plantar. São cerca de 4.300 índios "das etnias guaranis e caiuás", como define o capitão, em apenas 1.700 hectares
Em dois anos, a população quase dobrou na aldeia. Vieram índios do Paraguai, afirmou Gonçalves. Segundo o agente de saúde da Funasa, o guarani Agripino Lopes, 32, os índios paraguaios não têm assistência médica e atravessam a fronteira.
"A gente não tem como cobrar do nosso povo plantação, se não tem terra", disse Lopes.
"É preciso estrutura nos órgãos [públicos]. Esse Fome Zero [Indígena] disse que vinham pintinhos em outubro. Chegaram no dia 27 passado. Mandaram 150 para 3.400 índios, mas a metade morreu", afirmou Gonçalves.
Gonçalves e Lopes afirmam ainda que as sementes do Fome Zero para agricultura chegam atrasadas, fora da época de plantio, à aldeia. O governo de Mato Grosso do Sul, responsável pelo programa com uma verba de R$ 5 milhões do MDS (Ministério de Desenvolvimento Social), diz que as licitações atrasam a compra e entrega de sementes

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