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MT tem 590 pedidos para exploração mineral em áreas indígenas

Diário de Cuiabá-Cuiabá-MT
Autor: Aline Cubas
05 de Ago de 2002

Com seis anos de tramitação no Congresso Nacional, projeto de lei desagrada índios e a Funai

Mato Grosso possui hoje pelo menos 590 pedidos de autorização de pesquisas geológicas em terras indígenas aguardando a aprovação de uma lei que regulamente a exploração de minérios nessas áreas. Os pedidos estão registrados no Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) e alguns datam de meados da década de 70.

Mas o projeto de lei que está prestes a ser aprovado no Congresso Nacional, depois de tramitar por seis anos, desagrada índios, indigenistas e pesquisadores ao não prever Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), principal instrumento técnico utilizado atualmente para prever impactos de empreendimentos e sugerir soluções para minimizá-los.

A retirada de minérios em terras indígenas é prevista na Constituição Federal, que determina ainda limites de proteção aos índios e ao meio ambiente. No entanto, o projeto de regulamentação, de autoria do senador por Roraima, Romero Jucá (PSDB), atual líder do governo no Senado, além de abrir mão do EIA/Rima, é omisso quanto aos limites máximos de área a ser explorada. Não está previsto, por exemplo, o que acontecerá caso um povo indígena tenha todo o seu território registrado para fins de mineração.

Ao contrário do senso comum, os índios e a Funai são favoráveis à mineração em área indígena. "Nós somos a favor da regulamentação tanto da mineração quanto da retirada da madeira mas com todos os cuidados para gerar economia e ao mesmo tempo beneficiar os índios, a natureza e a própria sociedade", explica o administrador regional da Funai em Cuiabá, Ariovaldo José dos Santos.

Com relação a exploração de minério, ele destaca também a necessidade de capacitar os índios e contratar para o quadro da Funai pessoal especializado em geologia com o objetivo de negociar em pé de igualdade com as mineradoras. "Como saber se o minério que está sendo retirado é A ou B, calcular o valor e os lucros sem conhecimento específico? Sem isto, vamos assistir e ficar a reboque do processo", enfatiza Ariovaldo dos Santos.

Mas a maior preocupação dos indigenistas é quanto ao perigo da mineração repetir o caos instalado com a exploração da madeira, na qual alguns poucos índios obtêm momentaneamente grandes somas de dinheiro mas que não revertem para o povo indígena. Citando o exemplo dos cinta-largas, Ariovaldo diz que é inadmissível deixar os povos indígenas mais pobres e dependente de bens que não produzem.

A primeira regra pretendida então para a mineração em território dos índios é que seja sustentável e não permita que a etnia se torne dependente. O administrador da Funai lembra que é contraditório e desonesto um governo que prega a educação para a cidadania deixar permitir que isto aconteça. "É um duplo crime, tirá-los de sua autonomia e torná-los um peso para a sociedade jogando-os para um assistencialismo que o governo não tem condições de atender", finaliza.

Registros tentam garantir direito em áreas

O grande número de pedidos de pesquisa em terra indígena não significa que sob os pés dos índios há mais minérios para serem retirados que de qualquer outra região. O crescimento de registros nessas áreas deve-se à necessidade de "reservar" o subsolo antes que outro o faça para o momento em que a exploração for legalizada e ao fato desse registro não gerar nenhum tipo de custo para o requerente, explica o professor Álvaro Pizzato Quadros, chefe do Departamento de Geologia da Universidade Federal de Mato Grosso.

Ele foi o responsável por coordenar o Diagnóstico do Setor Mineral de Mato Grosso, trabalho inédito que a partir do cruzamento de informações do DNPM, Metamat e UFMT elaborou a Carta de Potencial Mineral do Estado. Este documento possibilita saber onde e qual o tipo de atividade mineral é desenvolvida em todo o território mato-grossense e que tipo de minério é possível encontrar e em que local.

Segundo Álvaro Quadros, todo o território nacional está aberto para o registro de seu subsolo e a obtenção do alvará, que tem validade de no máximo três anos. Se neste período não forem feitas pesquisas ou exploração na área perde-se o direito sobre ela. Durante o tempo em que o registro for mantido, é preciso arcar com uma taxa paga para a União. No caso da Amazônia Legal, a taxa é de uma UFIR por hectare ao ano. É possível requerer de 50 hectares a 10 mil hectares.

No entanto, as terras indígenas ficam fora dessas regras justamente porque não há legislação que permita a exploração, o que deverá ocorrer caso o projeto de lei do senador Romero Jucá seja aprovado no Congresso. Desta forma, um processo de pedido de pesquisa fica oficialmente suspenso quando verifica-se que ele recai sobre reserva dos índios. Como não é expedido alvará para trabalhos na área, não gera taxas mas se garante a preferência quando isto for possível.

Presidente da Funai diz que lutará contra a mineração

O projeto de lei regulamentando a retirada de minérios de terras indígenas está pronto para ser votado na Câmara dos Deputados, mas apesar de ter sido apresentado pelo líder do governo no Senado e de ter sido aprovado em três comissões enfrentará resistência.

O novo presidente da Funai, Artur Nobre Mendes, fez questão de afirmar em seu discurso de posse no dia 24 passado que seu compromisso é o de impedir a mineração nas áreas indígenas. "Enquanto eu estiver na Funai as picaretas dos mineradores estarão fora da área indígena", disse.

Índios de diversas nações, entre elas Xavante, Terena e Kaiapó, estiveram em meados de julho no Congresso Nacional demonstrando seu descontentamento com a proposta prevista no projeto de lei 1.610/96. Eles querem que o assunto seja incluído no Estatuto das Sociedades Indígenas, em análise no Congresso desde 1994.

O projeto de lei já passou nas comissões de Minas e Energia e da Amazônia e de Desenvolvimento Regional. Na semana passada teve parecer favorável na Comissão de Defesa do Meio Ambiente e Minorias. O relator, deputado José Borba (PMDB/PR), escreveu que com a regulamentação "será possível tirar a exploração mineral da clandestinidade para torná-la uma atividade viável, fiscalizada e rendendo divisas para a União e todos os segmentos envolvidos".

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