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MP e mananciais

OESP, Fórum dos Leitores, p. A2-A3
Autor: FINK, Daniel R.; FEDELI, Claudia Cecilia
07 de Dez de 2004

MP e mananciais

Instados a prestar esclarecimentos e demonstrar a atuação do Ministério Público (MP) em área de proteção aos mananciais hídricos da Região Metropolitana de São Paulo, conforme resposta à nossa carta publicada em 1o./11, gostaríamos de esclarecer, em primeiro lugar, que o MP não dispõe de fiscais capazes de fazer cumprir a legislação de proteção de mananciais. O Poder Público, sim. Isso significa que a responsabilidade imediata na vigilância dessas áreas é dos governos estadual e municipais. A tarefa desses governos é cumprir as Leis Estaduais n. 898/75 e n. 1.172/76 e, em especial, o Decreto n. 33.135/91.0 MP tem pleiteado junto ao Poder Judiciário o cumprimento dessa legislação, por meio de inquéritos civis e ações civis públicas. Nos últimos sete anos, somente na Comarca da Capital, foram instaurados pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente 53 inquéritos civis e procedimentos, e propostas 16 ações judiciais em defesa dos mananciais. Na Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo, que cuida de loteamentos clandestinos, estão em andamento 63 inquéritos e procedimentos e foram propostas 121 ações judiciais. Não estão incluídos nesses números, dentre outras, as Comarcas de São Bernardo do Campo, Diadema, Mauá, Embu e Itapecerica da Serra. Somente os números da capital significam que 143 atos de irregularidade - construções diversas, invasões e loteamentos clandestinos - chegaram ao conhecimento do MP e são objeto de sua atenção. Os números são, convenhamos, alarmantes. No passado, conforme noticiado pelo Estado - na reportagem Promotoria acusa secretaria de omissão na Billings (24/4/98, C8) e no editorial As represas e a omissão (27/4/98, A3) -, ficou evidenciado que a ausência de ação, de fato, é do Poder Público, que reiteradamente se omite de cumprir as decisões judiciais favoráveis à desocupação dessas áreas, em ações propostas pelo MP. Em adição, convém lembrar que a estrutura pública para proteção dos mananciais denominada SOS Mananciais, que era vinculada à Secretaria de Estado do Meio Ambiente, foi extinta sem que outra fosse criada em seu lugar. A fiscalização de mananciais perdeu sua única estrutura específica de apoio. De lá para cá, o que se viu foi um forte incremento da ocupação nessas áreas. Ligado a esse problema, agora se associa o Rodoanel Viário Metropolitano, cuja capacidade de indução de novas ocupações é inegável. Mas novas ocupações significarão, num futuro breve, o comprometimento do abastecimento da já escassa água à população. O Estado põe com muita clareza e concretude o dilema do problema. Livrar a região metropolitana de um caótico tráfego de veículos e sacrificar o abastecimento de água, ou o contrário. Essa angústia faz parte dos trabalhos da Promotoria de Justiça, que, antes de promover a defesa intransigente e exclusiva do meio ambiente, quer ter a certeza de que os passos dados são seguros e contemplam os interesses em conflito. Os empreendedores do Rodoanel são os mesmos que há décadas se têm omitido na defesa dos mananciais. Devemos confiar neles incondicionalmente? Os fatores em conflito devem ser esquecidos em nome de uma solução única e oficial? O emprego da melhor tecnologia disponível na construção da obra, defendido pelo Estado, nos parece no momento o princípio da discussão de um conjunto de medidas capazes de na prática realizar o empreendimento com proteção do meio ambiente. Do contrário, é preciso anotar os nomes das pessoas responsáveis pela decisão, pois as futuras gerações - e talvez até mesmo a presente - vão querer saber quem acabou com a água de São Paulo.

Daniel R. Fink, procurador de Justiça e Coordenador do CAO de Urbanismo e Meio Ambiente, e Cláudia Cecília Fedeli, promotora de Justiça do Meio Ambiente da Capital São Paulo

OESP, 07/12/2004, Fórum dos Leitores, p. A2-A3

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