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Mortalidade infantil em area amazonica e o triplo da media

FSP, Brasil, p.A9
02 de Mar de 2005

Fome matou 9 em novembro no Vale do Javari, diz líder de ONG
Mortalidade infantil em área amazônica é o triplo da média
Hudson Corrêa
Da agência Folha, em Campo Grande
A fome matou nove crianças em apenas 15 dias em novembro passado na terra indígena Vale do Javari, no Amazonas, afirmou ontem o coordenador-geral do Civaja (Conselho Indígena do Vale do Javari), o índio Jorge Marubo, 27.
"No mês de novembro só em 15 dias morreram nove crianças [da etnia kanamari] menores de cinco anos por causa da desnutrição", disse Marubo. A Funasa afirma que as mortes ocorreram ao longo de 2004, e não em um único mês.
A mortalidade infantil na terra indígena Vale do Javari, no Amazonas, que chegou a 115 por mil nascidos vivos em 2003, caiu para 85 por mil em 2004, segundo a fundação. O índice se aproximou em 2003 dos países mais pobres da África, que superam a marca de 150 por mil nascidos. Atualmente, com 85 por mil, é três vezes maior que a média brasileira, de 24 por mil nascidos vivos.
O situação no Javari supera a de reservas no Mato Grosso do Sul, onde o índice de mortalidade infantil é de 60 por mil nascidos vivos. Neste ano, em Dourados (MS) cinco crianças índias morreram por causa de desnutrição.
Quatro dessas mortes aconteceram em fevereiro. Ainda há suspeita que outra criança, a sexta, também tenha morrido devido à fome. O Estado ainda tem situações mais alarmantes. No município de Amambaí (393 km de Campo Grande), a mortalidade infantil é 96 por mil nascidos.
Plano para região
O Civaja é uma ONG que representa os índios do Vale do Javari e participou com a Funasa do Plano Distrital de Saúde ao qual a Folha teve acesso e que não está, segundo Jorge, funcionando.
No plano que deveria vigorar até abril deste ano ainda consta o índice de mortalidade de 115 por mil nascidos vivos.
"A gente está pedindo socorro mesmo. A saúde está zero. Nós estamos enfrentando a pior situação da história desde 2003. Tem surto de hepatite e vários parentes nossos morreram. Não temos acompanhamento da Funasa", diz Jorge Marubo.
A terra indígena do Vale do Javari tem 85 mil quilômetros quadrados e abriga cerca de 3.000 índios em seis etnias conhecidas, além de grupos isolados que ainda não tiveram contato com povos não-índígenas.
Impasse
Apesar de a presidência da Funasa ter informado que os casos de desnutrição ocorreram ao longo do ano passado, a chefe do DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena) do Vale do Javari, Edilamar Ferreira, sustenta o fato de que houve nove mortes apenas no mês de novembro e atribui os casos à desnutrição.
"Tivemos vários óbitos. E, segundo foi comprovado, era desnutrição, mas já colocamos uma equipe completa lá com médico e enfermeira e nunca mais teve óbito", afirma Ferreira.
"Trabalhar com os kanamaris [as vítimas de desnutrição] é difícil, os pais correm para o mato com o filho e se escondem. Eles não permitem que os enfermeiros dêem soro, pois acham que mata a criança", afirma Ferreira.
Para Jorge Marubo, "o governo não está preocupado com a saúde dos índios, mas com o fortalecimento de sua base política".
O coordenador do Civaja afirma que as indicações para os órgãos da Funasa são políticas e beneficiam petistas.
"Para assumir a chefia do distrito do Vale do Javari, indicaram uma professora que não tem ligação com a causa indígena e nem conhecimento em saúde", afirmou Jorge.

Outro lado
Funasa afirma que mortes ocorreram ao longo de 2004
A Funasa (Fundação Nacional de Saúde) informou ontem, por meio de sua assessoria, que as mortes ocorreram ao longo de 2004 e não em um único mês, e que o trabalho de assistência aos índios nas aldeias do Vale do Javari resultou na queda da mortalidade infantil de 115 para 85 por mil nascidos vivos no ano passado.
O diretor nacional de Saúde Indígena, Alexandre Padilha, não quis dar entrevista. Há duas semanas, ele havia negado que a Funasa tenha adotado critérios políticos para cargos na área, como foi acusado. (HC)

FSP, 02/03/2005, p. A9

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