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Ministério da Justiça não vai à mesa de diálogo com indígenas

Carta Maior-Brasília-DF
Autor: Maurício Hashizume
13 de Fev de 2004

Apesar da ausência da principal pasta ligada às questões indígenas, foi criada nesta quinta-feira (12) mesa permanente de diálogo entre o governo e dirigentes de organizações indígenas, para discutir temas como homologação de terras.

As organizações indígenas ainda esperam o atendimento de grande parte de suas prioridades pelo governo federal - que segue em processo de desgaste político pela permanência de focos de conflito envolvendo a questão -, mas pelo menos têm agora mais um canal institucional para intensificar a relação direta com o Poder Executivo. Nesta quinta-feira (12), a Secretaria-Geral da Presidência e o Ministério da Justiça constituíram oficialmente uma mesa permanente de diálogo com líderanças indígenas.

Logo no encontro de inauguração da nova mesa, no entanto, os representantes indígenas do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiab), Associação dos Povos Indígenas do Nordeste e Norte de Minas Gerais (Apoinme), entre outros, foram surpreendidos pela ausência de autoridades da principal pasta relacionada ao tema. Apesar de ser coordenador titular da iniciativa, o Ministério da Justiça, responsável pela política indígena federal por meio da Fundação Nacional do Índio (Funai), não enviou nenhum representante na primeira reunião da mesa de diálogo. O único membro do governo que compareceu foi o subsecretário-geral da República, César Alvarez.

"Foi mais um episódio que mostra o desrespeito ao povo indígena", lamentou Jacir José de Souza, da etnia macuxi e presidente do CIR, que esteve presente na primeira reunião da mesa de diálogo. A homologação da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol, no Estado de Roraima, onde vivem os povos que fazem parte do CIR, é um dos principais problemas ainda não solucionados pelo governo Lula (leia também Homologação de terra em RR ainda depende de relatório).

De acordo com o subsecretário Alvarez, o tom de decepção manifestado pelo presidente do CIR foi resultado da "expectativa criada a mais" pelas organizações indígenas, que ansiavam por uma participação maciça dos ministérios correlatos para o começo de um aprofundamento de suas reivindicações. Mas o caráter da reunião inicial, sublinhou Alvarez, era apenas de "abertura para a construção de uma pauta comum".

A ausência do secretário-executivo do Ministério da Justiça, Sérgio Sérvulo, sobre quem pesa mais precisamente a condução da mesa de diálogo, foi interpretada pelo subsecretário Alvarez como um "ato involuntário não muito positivo". A assessoria de imprensa da pasta de Sérvulo informou à Agência Carta Maior que houve uma inesperada sobreposição de compromissos e o secretário acabou acompanhando o ministro Márcio Thomaz Bastos na sessão solene em homenagem ao ministro Sydney Sanches, no Salão Branco do Supremo Tribunal Federal (STF).

Para além da ausência de autoridades e das expectativas, foram definidas na reunião inaugural da mesa quatro temas centrais que serão trabalhados a fundo nos próximos encontros: demarcação/homologação de terras indígenas; resolução dos quatro principais conflitos do país - Raposa/Serra do Sol (Roraima), caso dos índios cinta larga (Rondônia), xavante (Mato Grosso) e guarani (Mato Grosso do Sul); interface com o educação superior e a organização de uma campanha pública pelos direitos indígenas.

"Mais que uma reunião de emergência, a nossa idéia é estabelecer uma instância de relação permanente que reforce a responsabilidade comum sem que nós deixemos de ser governo e sem que eles deixem de ser movimento social", explicou Alvarez. Ao fazer o balanço desse primeiro diálogo, ele destacou a possibilidade de se consolidar uma pauta de reivindicações a curto, médio e longo prazo com os representantes indígenas.

Palavra de conselheiro
A mesa de diálogo entre o governo e representantes de organizações indígenas está sendo instalada dois dias depois que o presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes, empossou membros do Conselho Indigenista da entidade.

Eleito pela quarta vez seguida como conselheiro, José Porfírio Fontenele de Carvalho, funcionário da Funai desde 1967, avaliou que "o governo ainda não conseguiu se situar sobre a questão indígena" e "precisa dizer qual postura vai adotar". "Espero que a partir deste ano haja medidas objetivas", disse.

Coordenador dos programas Waimiri/Atroari e Pakaranã, de sua própria autoria, Carvalho disse esperar que o Conselho seja mais atuante no respaldo à presidência da Funai. Além dele, foram indicados por Mércio Pereira Gomes e nomeados por Thomaz Bastos o advogado e cientista social Carlos Moreira Neto, a socióloga Isa Maria Pacheco Rogedo, Noel Villas Boas - filho do sertanista Orlando Villas-Boas -, a professora Carmem Junqueira, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, a líder indígena wapixana Joênia Batista de Carvalho e a antropóloga Bruna Franchetto.

Criado por decreto em junho de 1992, o Conselho Indigenista da Funai tem caráter consultivo e de apoio técnico, científico e cultural. Os novos conselheiros têm mandato de dois anos.

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