VOLTAR

Mercúrio ameaça ribeirinhos e povos indígenas da Amazônia

O Liberal-Belém-PA
01 de Set de 2001

Até hoje, os ecossistemas da Amazônia e do pantanal matogrossense conseguiram diluir a maior parte dos efeitos do mercúrio liberado na atmosfera e nos rios da região, mas a expectativa é que com o aumento da emissão do metal haja uma saturação do meio ambiente. Por outro lado, as pesquisas sobre o grau de contaminação da população local estão dispersas. Para reunir todos os estudos sobre o tema, controlar e monitorar o metal de toxicidade comprovada, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) lançou ontem, em Brasília, o Programa Mercúrio (Promer). A emissão descontrolada de mercúrio - uma prática usual em garimpos - pode atingir as comunidades ribeirinhas e as aldeias indígenas da Amazônia. O metal é despejado nos rios e contamina a fauna aquática que é consumida pela população, gerando graves problemas de saúde.
O presidente do Ibama, Hamilton Casara, afirma que os problemas associados à contaminação por metais pesados, como o mercúrio, têm recebido atenção especial em vários países, independentemente do seu grau de desenvolvimento. Isto porque o mercúrio tem alta mobilidade nos reservatórios do planeta, e sua toxicidade pode ficar por até dois anos na atmosfera. Pela sua permanência, o metal está incluído no rol das substâncias tóxicas persistentes e está sob monitoramento pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), observa Casara. Países como os Estados Unidos, Canadá e México estão desenvolvendo programas semelhantes ao Promer, em que os técnicos avaliam o transporte do mercúrio a longa distância e suas implicações na qualidade de vida do planeta.
O diretor de Licenciamento e Qualidade Ambiental do Ibama, Donizetti Aurélio do Carmo, informa que o mercúrio é considerado pelos pesquisadores um contaminante global que apresenta riscos ao meio ambiente e à população, por isso é necessário que suas emissões sejam reguladas.
No Brasil, o controle ambiental está sob a responsabilidade dos governos estaduais, que ainda não contam com um programa nacional de monitoramento de poluentes. Donizetti do Carmo explica que o Promer vai cooperar com o setor responsável ao promover o monitoramento do metal na região amazônica. O governo federal devia isso para a região, diz. Ele afirma que as contaminações por fontes naturais, associadas às provocadas pelos garimpos, mostram que o teor de mercúrio nos peixes da Amazônia já é elevado.
A biomédica Elizabeth Santos, pesquisadora do Instituto Evando Chagas que há 12 anos estuda a emissão de mercúrio, está otimista com o Promer: O projeto vai reunir os conhecimentos, preencher as lacunas e organizar a massa crítica, afirma. Para ela, graças o grande volume dos rios amazônicos a natureza vem conseguindo diluir o mercúrio que é liberado, mas os pesquisadores não se isso vai prosseguir durante muito tempo. Não sabemos até quando essa pujança vai conseguir equilibrar o que desequilibramos todos os dias, adverte.
O Programa Mercúrio vai monitorar o metal em quatro grandes bases: o Pará, o pantanal matogrossense e os rios Negro e Madeira. Serão estudados os indicadores biológicos (peixes e amostras de cabelo de membros das comunidades ribeirinha e indígena). Também serão utilizados as coletas e os estudos feitos por pesquisadores de instituições como o Instituto Evandro Chagas, Universidade Federal do Pará e do próprio Ibama.
O Promer será desenvolvido em laboratórios de Belém e Santarém (PA), Cuiabá (MT), Porto Velho (RO) e Manaus (AM), com o apoio técnico dos laboratórios de referência em mercúrio da Universidade de Brasília, Unicamp (Universidade de Campinas) e Universidade Federal do Rio de Janeiro. Estiveram presentes à solenidade de lançamento do programa representantes do Ministério do Meio Ambiente, Fundo Nacional do Meio Ambiente, Agência Nacional de Água (ANA), Eletrobrás, Eletronorte, Institutos Evandro Chagas e Oswaldo Cruz, Departamento Nacional de Produção Mineral, INPA e de diversas universidades federais. O programa foi elaborado pela Diretoria de Licenciamento e Qualidade Ambiental do Ibama em parceria com o CNPq e pesquisadores brasileiros. Logo após o lançamento do Programa Mercúrio iniciou a primeira reunião do grupo de trabalho.
Consumo de peixes contaminados é maior forma de intoxicação
A principal via de intoxicação de seres humanos com mercúrio se dá mediante o consumo de peixe contaminado pelo metal. A intoxicação maior provém dos garimpos, responsáveis por 80% dos casos e onde se usa o metal para separar o ouro da lama. O restante vem de rejeitos da indústria de equipamentos eletrônicos e elétricos, pesticidas e fungicidas, entre outros. O mais grave da contaminação por mercúrio é sua característica de persistência: mesmo depois que a emissão é interrompida, a ameaça à saúde da população continua. Os mais atingidos costumam ser os ribeirinhos, grandes consumidores de peixes.
Em contato com o ar, com a água e em áreas onde a concentração de matéria orgânica é grande, o mercúrio é oxidado e metilado, incorporando-se à cadeia alimentar. A contaminação dos peixes ocorre pela absorção do metal do meio ambiente através da respiração e da ingestão de outros peixes contaminados. Para agravar o quadro, a velocidade de eliminação do mercúrio e bem menor que a de absorção.
No ser humano que ingere alimento contaminado por mercúrio, a intoxicação danifica células do sistema nervoso central, provocando descontrole dos membros, redução da visão, do olfato, da audição e da fala, além de ocorrência de distúrbios mentais.
No Brasil, as localidades historicamente mais afetadas pelo metal são: o rio Gurupi (MA), o rio Tapajós, Itaituba, Cumaru, Carajás (PA), Poconé (MT), o rio Madeira (Rondônia), os Estados de Roraima e Amapá, o Vale do Paraíba (RJ) e Crixás (GO).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que, nos peixes, os limites de concentração de mercúrio considerados seguros para a saúde humana não deve ultrapassar 300 nanogramas por dia. Quando o pescado está acima de 500ng, não deve ser consumido. A Legislação Brasileira determina que o peixe não carnívoro é considerado impróprio para a comercialização quando apresenta teores acima de 500ng de mercúrio por grama de peixe; para peixes carnívoros o máximo é 1000ng de mercúrio por grama de peixe.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.