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Médicos para salvar o planeta

O Globo, set. Planeta Terra, 2010, p.18-19
30 de Set de 2010

Médicos para salvar o planeta
Pesquisador propõe medicina ecológica para proteger natureza

Antônio Marinho

A degradação do meio ambiente adoece o planeta e os seus habitantes.
As toneladas de substâncias nocivas e poluentes no ar e a contaminação da água e dos alimentos aumentam o número de casos de doenças, como infecções e cânceres.
Com isso, surge um novo conceito: a medicina ecológica. E uma de suas propostas é controlar e reduzir ao máximo a exposição a substâncias que estão destruindo a Terra.
Se ainda é incerto que as alterações causadas pelo homem são irreversíveis, é inquestionável que alteramos profundamente o meio ambiente, e que os hábitos de vida se transformaram de forma radical nos últimos cem anos, diz o médico Alex Botsaris, da equipe do Programa Estadual de Plantas Medicinais da Secretaria estadual de Saúde e autor do livro "Medicina Ecológica - descubra como cuidar da sua saúde sem sacrificar o planeta" (Nova Era). Ele afirma que a incidência de muitas doenças como câncer, infertilidade, demência, depressão, insônia, dores na coluna etc vem aumentando de forma continuada nesse mesmo período, sem que haja uma explicação definitiva para o fenômeno.

- Uma das possibilidades é que isso seja consequência das mudanças no estilo de vida e do ambiente em que vivemos. A deterioração do meio ambiente é um fator que afeta negativamente todas as espécies. Quanto mais degradado e pouco saudável o ambiente, mais chance ele tem de adoecer - diz Botsaris.
Lutar para se conseguir um ambiente sustentável é, sem dúvida, o primeiro passo na busca de saúde, considera o especialista. Ele afirma que seria importante resgatar o trabalho dos sanitaristas e investir em prevenção eliminando os problemas do meio ambiente. Até mesmo o estresse continuado, responsável por várias doenças, tem relação com o ambiente em que vivemos.

- São ações que dependem do Estado, da cobrança da sociedade e que devem ficar mais evidentes com o aumento da crise ambiental do planeta - reforça o pesquisador.
Ele observa que não basta a conscientização ambiental para desenvolver os conceitos da medicina ecológica. Botsaris defende a busca de modelos médicos que sejam coerentes e parecidos com os processos fisiológicos do organismo saudável.
O modelo da medicina alopática convencional, afirma, é todo focado no mapeamento de receptores e o desenvolvimento de moléculas para estimulá-los, mas que pode gerar problemas como os efeitos adversos.
Na opinião do médico, essa alternativa tem sua importância, mas é preciso inovar, incorporando novos conceitos.
Um desses conceitos é o que ele chama de biomimetismo. Além de reciclar, ou seja, em vez de jogar fora, usar para outro fim, a sociedade terá de mimetizar a natureza. Isso significa, segundo Botsaris, que todo produto, em qualquer fase de seu ciclo, deve ser aproveitado em outra função: - Ele deve ser sempre reutilizado, em vez de despejado no meio ambiente.
Isso é biomimetismo.

Outra medida sugerida pelo autor é que os médicos sejam treinados desde a faculdade para dar preferência a fármacos à base de moléculas de menor risco ambiental. Estatísticas de todo o mundo mostram que 90% dos atendimentos médicos são por problemas simples de saúde.
Não é difícil imaginar que o mais correto para esses casos seria aplicar ações de baixo custo e pouco impacto ambiental, como o uso de fitomedicamentos e acupuntura.

- Não é possível tratar todas as doenças com estratégias mais simples e de menos impacto, mas uma boa parte da população poderia se beneficiar.

Essas alternativas não exigem indústrias químicas que poluem o ambiente para sintetizar seus produtos, nem geram substâncias químicas que podem poluir os ecossistemas - diz.
Especialista em medicina chinesa e em doenças infecciosas e parasitárias, ele cita as doenças alérgicas como um ótimo exemplo de problema de saúde que pode estar associado ao aumento da poluição ambiental. Quanto maior a quantidade de moléculas estranhas em contato com o organismo, maior a probabilidade de se desenvolver alergias.
Segundo Botsaris, não há um consenso se o aumento da incidência de alergias e câncer está associado à poluição ambiental, mas muitos pesquisadores estão começando a acreditar nessa possibilidade.

- A tendência ao aumento da expectativa de vida do ser humano, que observamos nos últimos anos, pode parar ou diminuir se as condições dos ecossistemas continuarem piorando.
Hoje, uma quantidade enorme de pessoas toma cronicamente antidepressivos, um problema que eu também relaciono com as mudanças do ambiente.
Já se sabe que indivíduos que consomem antidepressivos têm maior chance de evoluir para casos de depressão irresponsiva, que têm um alto índice de suicídio - alerta.
E a situação parece que não vai mudar, porque, na opinião de Botsaris, no momento a indústria farmacêutica se interessa em investir no seu modelo de negócios atual, que é altamente rentável.
E introduzir a questão do risco ambiental como um novo parâmetro a ser observado para os medicamentos é visto como aumento de custo e risco para essa indústria. Eles alegam que isso vai tornar os remédios mais caros.
Para Botsaris, a medicina do futuro deveria ser focada mais no indivíduo, mas a estratégia aplicada é de desenvolver produtos que possam ser usados por um grande número de pessoas.
Ele já criou um projeto para identificar grupos de pessoas mais susceptíveis a sofrer efeitos colaterais, e que poderiam ter uma contraindicação preventiva às drogas que os estudos demonstrassem maior risco.

Ao apresentá-lo para um representante da indústria, ele ouviu: "por que investir num projeto que vai reduzir meu universo de clientes?".

Por outro lado, muitos médicos ainda não se sentem confortáveis em associar os tratamentos convencionais e alternativos. Na opinião de Botsaris, isso ocorre por falta de informação. Muitos estudos apontam que as medicinas alternativas têm um excelente potencial em saúde pública.
O médico espera que, no futuro próximo, esse preconceito seja reduzido.
Ele lembra que o National Institutes of Health, que é o órgão de saúde americano, criou um grupo de estudos para validar a aplicação das medicinas alternativas no tratamento de muitas doenças: - Daí surgiu o conceito de medicina complementar, justamente porque há uma visão desses pesquisadores de que as duas medicinas se somam, gerando resultados ainda melhores quando combinadas. O link http://nccam.nih.gov/research/camonpubmedno site do NIH traz um grande número de informações sobre este tema, em inglês e espanhol - recomenda o médico.

O Globo, set. Planeta Terra, 2010, p.18-19

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