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Macumba malfeita

O Globo, Rio, p. 13
25 de Out de 2017

Macumba malfeita

Natália Boere

RIO - O meio ambiente grita, mas parece que o poder público não está ouvindo. E, mais uma vez, são os cariocas que sentem os efeitos da fúria da natureza. Na madrugada desta terça-feira, a Praia da Macumba voltou a sofrer com os efeitos de uma forte ressaca, que engoliu os dois metros de pista que restavam no local e derrubou parte da parede de uma das casas em frente à orla, deixando exposto o vaso sanitário de um banheiro do imóvel. Há dez dias, a água já havia levado o calçadão e derrubado até um quiosque, mas, apesar de os moradores da região terem ficado muito assustados, a prefeitura havia informado que a estrutura das residências não corria riscos. Devido às condições climáticas, um trecho da ciclovia Tim Maia, entre São Conrado e Barra da Tijuca, foi interditado nesta terça-feira pelo município. Na região, as ondas chegaram a 2,5 metros de altura. No Arpoador, a faixa de areia foi encoberta pelo mar, que chegou à calçada.
Na Macumba, as principais vítimas da ressaca desta terça-feira foram os moradores do condomínio Sobre as Ondas, que fica no número 6.700 da Estrada do Pontal. O mar derrubou dois dos quatro metros de pista que ainda restavam em frente à entrada do edifício. Um pedaço de calçada agora é o que separa as águas do portão do imóvel. O médico Carlos Alberto do Val, síndico do prédio, conta que passou a noite em claro, assustado com o barulho. Segundo ele, quando as ondas estouravam, faziam os vidros das suas janelas tremer.
- Foi uma noite de terror. Por volta das 17h de ontem (segunda-feira), o mar começou a subir rapidamente, e o som das ondas foi ficando cada vez mais forte e próximo, a gente sentia o estouro em casa - relata Carlos Alberto, alarmado com a previsão do tempo, que continua apontando para a ocorrência de uma nova forte ressaca. - Moro aqui há seis anos, e não vai ser isso que vai me fazer sair.
A advogada Cristiane Fernandes, que tem um apartamento no prédio, decidiu não desafiar a natureza. Ela levou a mãe, que mora no condomínio, para dormir na casa dela, no Recreio.
- Não quero pagar para ver. Comprei esse apartamento em 2011, como se fosse um sonho dourado de morar em frente à praia. E ele acabou virando um pesadelo. É preciso que a prefeitura zele pela proteção das famílias que moram aqui e evite que o mar atinja e comprometa a estrutura do prédio - cobrava Cristiane, que logo cedo havia ligado para a Defesa Civil pedindo socorro.
No fim da manhã, agentes da Defesa Civil isolaram a área, e operários da prefeitura fizeram uma obra de contenção da encosta. A atitude, no entanto, não evitou críticas por parte dos moradores.
- Essa obra deveria ter sido feita desde sexta-feira, quando o prefeito Marcelo Crivella veio aqui e prometeu a recuperação emergencial da região - destacou o aposentado Joselau Ribeiro.
Na Pedra Dona Maria, conhecida como Pedra da Macumba, frequentadores olhavam o cenário de destruição e lamentavam.
- É um absurdo acabarem com uma praia maravilhosa como essa. Sou surfista de longboard, e esse local era perfeito para pegar onda, para curtir o verão em família. Agora não tem nem mais areia, foi tudo destruído - desabafou a advogada Cristiana Pires, que criticou a gestão municipal: - Moro no Recreio há muitos anos e sei que a revitalização da nossa orla, que começou em janeiro de 2005, foi mal projetada.
Secretário municipal de Conservação e Meio Ambiente, Jorge Felippe Neto afirmou a Defesa Civil emitiu laudo garantindo que a estrutura de fundação do Sobre as Ondas suporta as intempéries, e que o cinturão da orla, em frente ao condomínio, "é uma deficiência histórica":
- O projeto não foi da nossa responsabilidade, mas temos que matar no peito para que os moradores tenham mais segurança e não entrem em pânico.
Segundo o secretário, nesta terça-feira foi concluída a colocação de estacas de ferro envoltas em concreto, margeando o que restou da pista na orla da Macumba. Ele disse que, no projeto de recuperação emergencial da região, para o qual a prefeitura disponibilizou R$ 14,5 milhões, está prevista a construção de um entroncamento sintético: bolsas plásticas concretadas que serão instaladas na frente e atrás do muro do calçadão, numa extensão de cerca de 650 metros.
- Elas vão funcionar como uma espécie de quebra-mar, para dissipar a força, aguentar o impacto das ondas e impedir que as estruturas sejam comprometidas. Vamos aterrar a área do calçadão para permitir que ele seja recomposto e as concessionárias de água, luz e esgoto voltem a trabalhar - explicou o secretário.
Jorge Felippe Neto disse que será realizada uma audiência pública nesta quinta-feira, às 10h, na Câmara de Vereadores, para discutir a elaboração de um projeto definitivo para a recuperação da área:
- Vamos juntar esforços para tentar chegar a uma proposta viável, num momento em que a prefeitura enfrenta escassez de recursos.
Na sexta-feira, Crivella foi à Praia da Macumba verificar os estragos na orla e garantiu que o local receberá obras definitivas. Na ocasião, o prefeito destacou a imprevisibilidade do fenômeno marítimo e criticou obras feitas no passado.
- A respeito da Praia da Macumba, é bom a gente lembrar que essa obra feita no passado acabou não cumprindo o seu objetivo. As correntes marítimas levaram a uma grande erosão, a uma folga de solo, que será reforçado - disse Crivella.
O prefeito explicou como serão realizados os trabalhos na orla:
- Agora, os nossos engenheiros da Geo-Rio fizeram o projeto e vamos realizar um entroncamento e um estaqueamento. Tenho certeza de que a obra será definitiva. Vai dar segurança aos moradores e a quem visitar a Praia da Macumba. A prefeitura está tomando todas as providências necessárias. A obra será de R$ 14 milhões, talvez um pouquinho mais, num momento de crise, dificuldades. Mas estamos encontrando os recursos para resolver o problema. São, como disse, acidentes imprevisíveis, a força do mar, as correntes. Mas vamos vencê-las com a engenharia.
Crivella também disse que tentará, na medida do possível, ajudar comerciantes que tiveram quiosques danificados:
- Isso é uma ação que nós vamos ver ainda na Justiça. São coisas que acontecem, imprevisíveis, e todos os cariocas sabem disso. Vamos estudar, vamos ver o que a prefeitura pode fazer.

O Globo, 25/10/2017, Rio, p. 13

https://oglobo.globo.com/rio/novo-desabamento-na-praia-da-macumba-revel…

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