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À luz da ciência

O Globo, Sociedade, p. 28
11 de Dez de 2015

À luz da ciência

Vivian Oswald e Renato Grandelle

LE BOURGET e RIO - Resultados de uma investigação conduzida pelo Greenpeace revelados durante a Conferência do Clima (COP-21) jogam uma enorme sombra sobre relatórios assinados por nomes importantes da comunidade científica internacional usados para pôr em dúvida as mudanças climáticas (os chamados "climatocéticos") e promover os interesses comerciais de grandes produtoras de combustíveis fósseis.
Integrantes da ONG no Reino Unido se fizeram passar por representantes de uma companhia de petróleo fictícia no Oriente Médio, supostamente preocupados com os desdobramentos da COP-21 - que poderiam levar à redução de investimentos em energias fósseis - e encomendaram ao cientista William Happer, professor de Física da universidade americana Princeton e ex-funcionário da Secretaria de Energia dos EUA, um relatório técnico sobre os benefícios do petróleo e do gás. As conversas por e-mail, divulgadas pela ONG, indicam que rapidamente o professor teria dado um preço: US$ 250 a hora de trabalho (quase R$ 950), que deveriam ser pagos à organização CO2 Coalition.
A troca de mensagens revela que o profissional teria concordado em não revelar que o estudo teria sido financiado pela empresa de petróleo. E teria explicado que isso já havia sido feito para contradizer estudos da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre o mesmo tema.
- Nosso investigador disse que o investidor preferia ficar anônimo. Queríamos saber se cientistas estariam suscetíveis ao assédio das grandes empresas. Foi muito mais fácil do que imaginávamos - disse ao GLOBO o responsável pela comunicação do Greenpeace em Londres, Ben Stewart.
Na mesma linha, a ONG inventou uma importante companhia de carvão na Indonésia que precisava de um relatório semelhante sobre o setor ao especialista Frank Clemente, da universidade americana Penn State. O preço combinado teria sido de US$ 275 a hora. Citando documentos patrocinados pela indústria, como depoimentos em audiências públicas e artigos para jornais, o professor declarou ao Greenpeace que "em nenhum desses casos o financiador é identificado. Todos os meus trabalhos são publicados na condição de acadêmico independente".
TRANSPARÊNCIA PARA EVITAR MANIPULAÇÃO
Stewart reconhece que os resultados da investigação não provam qualquer envolvimento dos cientistas em casos anteriores. Mas deixa clara a necessidade de garantir transparência a todos os estudos produzidos para as discussões sobre o clima. Segundo ele, é preciso saber exatamente em que circunstâncias são feitos e quem está pagando por eles. A ONG alerta que estes documentos podem ser facilmente comprados para manipular negociações e endossar as posições de grupos dos climatocéticos e lobistas.
A ideia da investigação surgiu em julho deste ano. A ONG abriu uma companhia de relações públicas que falaria em nome da petroleira. Stewart lembrou que levou alguns meses até que a suposta empresa, com sede em Beirute, viesse a ganhar credibilidade no mercado para poder atuar.
Procurado pela reportagem, Happer disse que o Greenpeace está disposto a difamar todos que contestam suas convicções.
- O ataque furioso do Greenpeace direcionado a mim e a outros é para desviar a atenção de uma mensagem: mais CO2 é bom para o planeta - assegurou. - Esta é uma ameaça existencial ao Greenpeace, e é a razão pela qual eles estão dispostos a recorrer a mentiras.
O professor concordou que o clima do planeta está mudando, mas não atribuiu este fenômeno ao homem:
- É claro que acredito em mudanças climáticas. O clima tem mudado desde que o mundo começou, e as mudanças atuais são modestas se comparadas àquelas vividas por nossos antepassados - destacou. - O clima não vai parar de mudar, mesmo que o ser humano seja eliminado. E você terá que eliminar a maioria dos seres humanos se quiser parar de queimar combustíveis fósseis em breve.
Happer participou na última terça-feira de uma audiência no Senado americano promovida pelo pré-candidato republicano à presidência dos EUA Ted Cruz. A audiência tinha como tema "Dados ou dogma? Promovendo debate sobre a magnitude do impacto humano no clima da Terra".

O Globo, 11/12/2015, Sociedade, p. 28

http://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/greenpeace-revela-ba…

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