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Lula usa bone do MST e quer 'perfeicao' no campo

OESP, Nacional, p.A10
21 de Dez de 2003

Lula usa boné do MST e quer perfeição no campo
Ao entregar posse de área a sem-terra, presidente diz que vive "o melhor momento da vida"
Leonencio Nossa
Enviado especial
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que vive "o melhor momento da vida" num discurso improvisado durante a entrega da posse da área da Fazenda Maísa de 19,7 mil hectares para mil famílias sem-terra, em Mossoró, no sertão do Rio Grande do Norte. Lula afirmou também que pretende "atingir a perfeição" no processo de reforma agrária. "Pretendemos atingir a perfeição neste assentamento para mostrar ao mundo que a reforma agrária que vamos fazer não é apenas dar um pedacinho de terra e uma caatinga. Esta vai ser uma fazenda-modelo", declarou Lula.
Diante de cerca de 2 mil pessoas, ele chegou a usar, ao mesmo tempo, os bonés do Movimento dos Sem-Terra (MST) e da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Rio Grande do Norte (Fetarn).
Lula pediu a todos que fiscalizem e cobrem com "cordialidade" do governo avanços na reforma agrária. "Quanto mais organizados vocês estiverem, mais vamos fazer por essa parcela sofrida do povo brasileiro." Nas contas do presidente, 80% dos assentamentos feitos anteriormente não tinham nem mesmo licença ambiental. Ele prometeu voltar em de dezembro de 2005 a Mossoró para conferir a situação da área entregue ontem às famílias.
Juros - Lula disse que vai completar o primeiro ano de governo com a "menor taxa real de juros dos últimos nove anos". "Eu até brinquei com o Palocci: ninguém falou mais de juros nesta semana", disse. "Sabem por quê? Porque nossos críticos sabem que, quando nós pegamos este país, nem eles acreditavam que era possível este país dar certo", ressaltou, ao lado dos ministros da Fazenda, Antônio Palocci, da Casa Civil, José Dirceu, do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e da Segurança Alimentar, José Graziano. "Eu só ganhei (as eleições) porque as coisas não estavam boas."
Durante o discurso Lula também prometeu fazer a transposição do Rio São Francisco e construir a Ferrovia Transnordestina - iniciada em 1990 e paralisada em 1992. "Nós vamos fazer a transposição do Rio São Francisco. Temos de revitalizar o rio primeiro, para depois ver a questão da água", explicou. "Eu não tinha nem cabelo branco e já ouvia falar que era preciso fazer a Transnordestina, que ela estava parada. Pois bem, nós vamos fazer."
Modelo - Ao falar da reforma agrária, o presidente acusou os governos anteriores de dar prioridade para o número de assentados e não para a qualidade.
"A gente quer a terra, o financiamento, a assistência técnica e vender o produto produzido. O governo tem de ajudar até que as pessoas atinjam uma capacidade de andar sozinhas."
Lula disse que a Fazenda Maísa vai ser modelo para a reforma agrária. A área da antiga Fazenda Mossoró Agroindustrial S.A. foi até os anos 90 a maior produtora e exportadora de frutas do País. Com a falência da empresa, os trabalhadores perderam o emprego e ainda não receberam seus direitos. Destes, 600 moram em casas da antiga propriedade e foram beneficiados pelo projeto agrário do governo na área, orçado em R$ 9 milhões. No próximo ano, as mil famílias atendidas vão receber R$ 20 milhões em crédito agrícola.

Longos discursos e pedidos deixam presidente irritado
Usando um colete preto do tipo fotógrafo e protegido do forte sol graças à cobertura do palanque montado na Fazenda Maísa, em Mossoró, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se desculpou com a multidão pelo desconforto de participar da solenidade de entrega da posse da área. "Eu não poderia deixar de pedir desculpas a vocês. Sei que vocês estão aqui desde as oito e meia da manhã, com fome, tomando na cabeça um sol desgramado, um sol muito forte, eu vi até uma menina desmaiar", disse. "Vai chegar o dia em que a gente vai aprender e colocar o povo na sombra e ficar no sol. Aí a gente vai fazer as coisas acontecerem com maior rapidez."
Momentos antes de chegar à cerimônia, o presidente e os quatro ministros que o acompanhavam tiveram de trocar de helicóptero para se dirigir do centro de Mossoró até o assentamento. O piloto do primeiro helicóptero detectou uma falha na hélice e cancelou o vôo. Acostumado a se atrasar em mais de uma hora para encontros com chefes de Estado, Lula chegou ao assentamento às 11h40 (horário local), apenas dez minutos depois do previsto.
Lula demonstrou irritação com a série de longos discursos feitos por lideres dos sem-terra e autoridades locais. A governadora Wilma Faria (PSB) fez uma série de pedidos ao presidente em seu discurso.
Ele decidiu encerrar a cerimônia com a oração do Pai Nosso. Foi o único momento da solenidade em que os militantes sem-terra e os fãs de Lula deixaram de gritar palavras de ordem e elogios ao presidente. No palanque, o ministro da Casa Civil, José Dirceu, pouco falou ou gesticulou. Não tirou os óculos escuros nem mesmo quando Lula pediu ao bispo de Caicó, d. Jaime Rocha, que puxasse a oração.
Mesmo resistindo até o fim ao microfone, o ministro da Fazenda, Antônio Palocci, não economizou acenos de mão. Durante os longos discursos, Palocci se agachava para pegar bilhetinhos do público ao presidente. Enquanto Lula olhava para quem discursava, seu ministro da Fazenda ia enchendo os bolsos do chefe com as mensagens e pedidos da população. No discurso de cerca de 40 minutos, Lula criticou a extinção da Sudene durante o governo anterior, ressaltando ter recriado o órgão. O ex-senador Fernando Bezerra (PTB), ministro da Integração Nacional durante a extinção da Sudene, estava no mesmo palanque. Minutos antes tinha sido cumprimentado pelo presidente. (L.N.)

OESP, 21/12/2003, p. A10

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