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Lula rebate críticas ao etanol

CB, Economia, p. 16
10 de Jul de 2007

Lula rebate críticas ao etanol
Jogo em torno dos biocombustíveis se torna pesado, mostrando a formação de grupos a favor e contra os interesses do Brasil. Críticas nos jornais europeus levam presidente a defender produção nacional

Luciano Pires
Da equipe do Correio

Principal garoto propaganda dos biocombustíveis, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu ontem às críticas dos países europeus contra o etanol e o biodiesel brasileiros. Em seu programa semanal de rádio Café com o Presidente, disse que continuará defendendo a "revolucionária" matriz energética nacional e que é preciso estar preparado para tudo.
"O que não vamos aceitar, outra vez, é o cartel dos poderosos do mundo tentando impedir que o Brasil se desenvolva, tentando impedir que o país se transforme em uma grande nação", afirmou.
A frase de efeito foi uma resposta aos ataques veiculados por jornais espanhóis e italianos na semana passada, quando líderes políticos lançaram dúvidas sobre a sustentabilidade ambiental e social dos programas desenvolvidos no Brasil. Os europeus disseram não querer o biodiesel obtido à base de desmatamento nem o etanol "sujo" produzido às custas de mão-de-obra degradante e das queimadas. No início do mês, Lula passou por Portugal e Bélgica, onde explicou as vantagens do álcool e do biodiesel na Conferência Internacional sobre Biocombustíveis.
De acordo com o presidente, a busca por fontes alternativas de energia não pode ser tratada apenas sob o ponto de vista de produção de novos combustíveis. "É a geração de empregos, é a distribuição de renda, sobretudo nos países mais pobres. Esse é o desafio que está colocado para a União Européia, para os Estados Unidos e para o Japão", completou. Ressaltando que mais de 100 países têm condições de se tornar fornecedores, Lula reforçou que os adversários vão levantar "todo e qualquer tipo de calúnia". "É engraçado porque eles cobram impostos do nosso álcool, cobram do nosso biodiesel, mas não cobram do petróleo", disse ao ironizar as barreiras tarifárias impostas pelas nações desenvolvidas.
Definição de forças
Com a ação européia e a reação brasileira, analistas apostam que grupos favoráveis e contrários aos biocombustíveis começam a tomar forma. "Os rompantes dos países que produzem ou dependem do petróleo não devem ser levados a sério. O Brasil não precisa ter medo de barata. O que vai derrotá-los é a necessidade, que vai derrubar todo esse lobby contrário", avalia Rogério César de Cerqueira Leite, professor da Universidade de Campinas (Unicamp). Nas palavras do especialista, o Brasil precisa tirar proveito dos investimentos estrangeiros canalizados para a construção de usinas ou fechamento de parcerias com grupos nacionais.
O avanço internacional sobre a produção de biocombustíveis é crescente. Fundos de investimento e grandes companhias decidiram aplicar cerca de US$ 10 bilhões nos próximos cinco anos em usinas de etanol e biodiesel, sobretudo, nas regiões Centro-Oeste e Sudeste do país. "A vantagem desses investimentos estratégicos é que eles ajudarão a vencer a resistência dos países que se opõem", completou Leite. Experiências de mercado bem-sucedidas devem esvaziar, por exemplo, o discurso catastrófico encabeçado por França e Espanha.
A Alemanha também está preocupada. Representantes de governo, empresários, entidades de agricultores e ambientalistas colocam em dúvida o sucesso dos biocombustíveis. O mesmo ocorre em Portugal e no Reino Unido com menor intensidade. Nos Estados Unidos, uma parte da classe política e do agronegócio critica o avanço das plantas usadas na geração de energia. A potência econômica acredita que a alimentação humana e de animais pode ficar comprometida.
Parte da indisposição internacional vem sendo vencida. Apontados como potenciais aliados do Brasil na formação de um mercado global de biocombustíveis, Japão, África do Sul, China e Índia despontam como fronteiras promissoras para a produção. Nesses países, as ações ainda engatinham, mas as presenças da Petrobras e da iniciativa privada testam possibilidades que, no futuro, poderão vingar.
Gargalo
O Brasil precisa eliminar obstáculos que travam o mercado interno e levam desconfiança ao comprador internacional. Mais grave no caso do etanol, a logística de escoamento da produção é muito ruim. Os altos custos para o embarque impedem que o produto brasileiro deixe o país em níveis mais competitivos.
Marcelo Andrade, diretor da Ecoflex Trading, disse que com mais investimentos em ferrovias e portos seria possível ampliar os parceiros comerciais. Hoje, a maior parte do álcool brasileiro vai para os Estados Unidos.

Postura desafiadora

Não fechar os olhos para a realidade. É assim que o Brasil deve se posicionar perante o mundo toda vez que for confrontado por acusações de que utiliza trabalho degradante para colher cana-de-açúcar ou que planta soja em áreas desmatadas. Para Eduardo Viola, professor titular do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), ao reconhecer os problemas e ressaltar que seu êxito comercial não depende deles, o país "desarma" seus principais opositores.
Segundo Viola, cada dia mais os usineiros produzem em condições favoráveis, mas há segmentos atrasados, que acabam comprometendo a imagem da maioria. "O Brasil precisa avançar propondo uma legislação trabalhista mais moderna", recomenda. O mesmo vale para o biodiesel, explica. "É preciso dizer ao planeta qual é o programa para o combate ao desmatamento e como ele é sério", reforça.
Associada a essa estratégia de assumir deficiências e dar soluções, o professor da UnB diz que o país poderia tirar proveito da divisão da União Européia e dos Estados Unidos. "Quem é protecionista vai usar todo tipo de argumento. O Brasil precisa buscar forçasnos segmentos mais modernos da sociedade americana e das demais", resume. (LP)

FAO pesquisará efeitos do produto

Mariana Mainenti
Da equipe do Correio

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) fará um estudo sobre as condições de cada país para absorver os impactos da ampliação do mercado de biocombustíveis. A elaboração da pesquisa foi acordada ontem pelo diretor-geral da FAO, Jacques Diouf, com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em encontro no Palácio do Planalto. Segundo informou Diouf em entrevista ao Correio, durante a conversa o presidente Lula manifestou preocupação de que o tema seja abordado apenas de maneira técnica.
"O presidente Lula disse que deveríamos fazer uma análise muito objetiva, desenvolvida por especialistas em políticas públicas, que seja internacional mas levando em conta questões específicas de cada país", relatou Diouf. Segundo ele, o estudo que será elaborado pela FAO levará em conta as dimensões técnica, social, ambiental, política, fiscal e comercial. A FAO pretende ainda realizar um encontro de alto nível em junho do próximo ano, em que apresentará as primeiras conclusões do trabalho.
A organização divulgou recentemente um estudo que mostra que a perspectiva de desenvolvimento da produção e comercialização de biocombustíveis já está tendo impacto no preço dos alimentos. A pesquisa deu mais argumentos aos que são contrários à ampliação deste mercado, como o presidente venezuelano Hugo Chávez e o líder cubano Fidel Castro. Ambos afirmam que o projeto apresenta risco para a segurança alimentar e é prejudicial ao meio-ambiente.
Questionado sobre se acredita que pontos de vista como o de Chávez e Castro devem ser levados em conta nesta discussão, Diouf afirmou que "depende de a que país você está se referindo e a que tipo de políticas".
"É por esse motivo que queremos fazer um estudo observando situações específicas de cada país, porque não há apenas políticas nacionais como também internacionais", declarou Diouf, acrescentando que isto é necessário para se evitar a repetição no mercado de biocombustíveis da situação que enfrentam hoje outras commodities agrícolas, com "negociações difíceis na Rodada de Doha". "Eu não acho que algum líder responsável possa dizer que isto (a ampliação do mercado de biocombustíveis) é totalmente bom ou ruim. Nós temos de avaliar a situação sob condições específicas", concluiu.

Sobe o preço do petróleo

O preço do barril de petróleo do tipo brent, extraído no Mar do Norte, atingiu US$ 76,34 em Londres. O valor de ontem é o mais alto desde 10 de agosto de 2006. A cotação não está distante do seu nível máximo, US$ 78,64.Em Nova York,o barril de óleo leve fechou o dia em US$ 72,19.O custo histórico máximo desse produto é US$ 78,40. Não há, no momento, expectativa de queda no preço. "Houve algumas interrupções de produção nas refinarias norte-americanas anunciadas hoje (ontem) e isso pode reduzir a oferta nas próximas semanas", afirmou Eric Wittenauer, analista da AG Edwards. Nos últimos 15 dias, os preços do petróleo foram sustentados pelos riscos de escassez de gasolina nos Estados Unidos. Na realidade, os estoques de gasolina estão 4,2% abaixo de seu patamar do ano passado, nesta mesma época do ano, quando a demanda de combustível é alta pelas viagens de carros nas férias de verão.

Bagaço tem potencial

O país poderá produzir em 2012 quase 24 mil megawatts (MW ) de energia elétrica a partir do bagaço da cana-de-açúcar, aproveitando o que restar da produção de 730 milhões de toneladas de cana que se prevê para a futura safra. Esse potencial corresponde a quase o dobro do geração da hidrelétrica de Itaipu - a maior usina do mundo -, segundo o diretor de Energia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Luiz Gonzaga Bertelli.
Ele está preocupado com o que pode ocorrer em 2012, principalmente após analisar o que aconteceu em 2001, com a falta de planejamento governamental e a ausência de chuvas que provocaram a crise do setor elétrico que atrasou o desenvolvimento brasileiro. "O ritmo de crescimento do PIB de 4% em 2000 caiu para 1% em 2001", afirmou.
Segundo especialistas, salientou Bertelli, hoje não se tem o risco de um apagão por causa do "excepcional volume de chuvas neste ano". Mas, diante das dificuldades encontradas com o licenciamento ambiental, dificilmente os próximos grandes complexos hídricos do Rio Madeira e de Belo Monte serão concluídos no período estimado. Para ele, por causa disso, " haverá necessidade da construção da terceira usina nuclear em Angra".
Uma solução viável para evitar um apagão no início da próxima década, disse Bertelli, seria o aproveitamento da energia de biomassa, principalmente o bagaço da cana-de-açúcar. Em 2007/08, o país terá a maior safra de cana-de-açúcar da história, com produção de 528 milhões de toneladas, 11% maior do que a safra anterior, segundo o empresário.

CB, 10/07/2007, Economia, p. 16

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