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Luís Figueiredo é detido por índios no rio Moa

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Leandro Altheman
02 de Abr de 2002

Secretário e sua família ficaram duas horas na aldeia República

O que era para ser uma viagem tranqüila acabou se tornando uma aventura de verdade para o secretário de Indústria Comércio e Turismo, Luís Figueiredo, sua família e a comitiva que o acompanhava. Com o objetivo de conhecer o que talvez seja o maior potencial turístico do Estado, Figueiredo organizou uma viagem ao Parque Nacional da Serra do Divisor. Já de volta, foram surpreendidos ao chegar ao seringal República, sede da aldeia dos Nukinis, por uma barreira dos índios, que bloquearam a passagem do rio Moa com arame farpado, placas e canoas. Pintados para a guerra e usando suas armas tradicionais (arcos, flechas e lanças), os índios Nukinis, juntamente com os Náuas, obrigaram o desembarque dos passageiros das três voadeiras e acabaram apreendendo um bote com motor pertencente à Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Alvo é a SOS Amazônia e o Ibama

O motivo da guerra está no tratamento dispensado pela SOS Amazônia e o Ibama às populações da área do parque e do entorno. Os Nukinis querem a ampliação de sua área e os Náuas lutam pelo reconhecimento de sua etnia e a demarcação de suas terras. O incidente ocorreu principalmente pela presença do gerente do parque (Ibama), Eduardo Gomes, que acompanhava o secretário em sua visita à Serra do Moa. Os índios, na verdade, não sabiam da presença do secretário. Paulo Dene, que também visitava a Serra do Moa e fora retido alguns minutos antes pelos índios, já havia iniciado as negociações e ouvido as reivindicações deles. Passado o clima tenso dos primeiros minutos, houve uma pequena reunião com o cacique Paulo, dos Nukini, o secretário Luís Figueiredo, Paulo Dene e os repórteres da TV Ituxi, Dejalcimar Rogério (Mazinho) e do jornal Voz do Norte, Leandro Altheman.

O cacique disse que os índios estão revoltados com a ação da SOS Amazônia e do Ibama e sentem que estão sendo passados para trás, no processo de criação do parque. "Nós conhecemos cada trilha desse parque, descobrimos as cachoeiras e as belezas primeiro. Posso mostrar os cemitérios e os restos de potes de cerâmica deixados pelos meus ancestrais, mas fazem de conta que a gente não existe. Eles têm que pensar primeiro em quem já estava aqui para depois pensar nos estrangeiros", disse o cacique.

O secretário conversou com os índios, deixando clara a intenção do governo do Estado de aproveitar o potencial representado pela cultura dos Nukini e Náuas no processo de implantação do turismo na região.

Produtores de um bonito artesanato e conhecedores de cada palmo do parque, os índios representam o elemento humano integrado à natureza da Serra do Moa, sem o qual o turismo seria vazio.

"Governos dos índios"

O cacique elogiou a atuação do governo estadual. "O governo estadual é como se fosse um governo dos índios", disse, referindo-se ao respeito com que são tratados pelos diversos escalões do governo. "Tenho muito o que gabar neste governo."

As queixas dos índios são semelhantes à dos moradores brancos do parque, que se sentem lesados no processo de criação do parque nacional, com a diferença de que os índios estão mais organizados que os brancos.

Durante a viagem, os ribeirinhos procuraram o secretário para se queixar do processo de desocupação do parque, que vem sendo conduzido pelo Ibama em parceria com a SOS Amazônia. Os moradores se queixam principalmente da falta de alternativas deixadas pelos condutores do processo. "Ir para a cidade, não vou! Para quê? Para meu filho virar traficante e ir parar na penal, para eu passar fome com a minha família? É isso que eles querem. Não se preocupam de verdade com a gente", conta, revoltado, Ademir da Silva Pinheiro, morador do parque. Ademir pretende ficar no parque, se lhe for dada essa possibilidade, e quer se tornar um guia de turismo. A principal alternativa deixada aos moradores é o delocamento para o projeto de assentamento Havaí, de Mâncio Lima, mas quem visitou o local descarta essa possibilidade. Chico Campos, também morador, diz que o local não oferece condições de transporte para as mercadorias e a experiência de outros projetos de assentamento. Alguns moradores estão defendendo a aquisição do seringal Belo Monte, no mesmo rio Moa, mas fora da área do parque. Haveria muitas vantagens em relação ao projeto de assentamento, pois os moradores poderiam manter as características de seu atual modo de vida, preservando as relações de vizinhança.

O impacto ambiental também seria menor, pois boa parte do Belo Monte já está transformada em pasto. Assim, a mudança seria menos traumática tanto para moradores quanto para a natureza. "Agora, se fosse para o Belo Monte, a gente iria", concordam Ademir e Chico Campos.

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