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Livros lançados em línguas indígenas

O Globo, O País, p. 23
20 de Ago de 2006

Livros lançados em línguas indígenas
Alunos de escolas-modelo publicam edições e impedem que idiomas se percam

Em todo o município, já existem 33 escolas diferenciadas indígenas, que ensinam em línguas tão diferentes quanto tariana, wanano, tuyuka e ianômani. Elas ganharam força na atual administração (do prefeito Juscelino Otero, do PSL).
- Esse era um grande desejo das comunidades - diz a secretária de Educação, irmã Edilúcia de Freitas. - É bom porque fortalece a identidade. Os índios se perderam, estão confusos, não sabem mais o que são, que costumes têm. O projeto mudou toda a região. No Alto Tiquié, eles não falavam mais sua língua.

O projeto começou com quatro escolas-modelo. Na Pamáali, os alunos vão publicar um livro, com duas mil cópias, financiado pelo Ministério da Educação (MEC), chamado "Kophenai nako", sobre os peixes da região. São 200 páginas, escritas em baniwa, com desenhos, resumos das espécies, armadilhas para pesca, calendários, morfologia dos peixes e até um capítulo sobre culinária, com receitas. A pesquisa durou dois anos.

Na Pamáali, alunos conciliam baniwa e Eça

- Os índios mostram que é possível fazer uma escola que conversa com o hoje - diz a pedagoga Laise Lopes Diniz, de 31 anos, do ISA, que forma professores para a escola. - A Pamáali, com alunos de 32 comunidades, provou que ensinar na língua deles faz com que reúnam conhecimentos que vão ajudálos a enfrentar o mundo atual. Ao mesmo tempo, aprendem o português com tanta qualidade que lêem Eça de Queiroz.

Na escola, eles preparam estudos topográficos para implantar viveiros de peixes, experimentam plantações, fazem artesanato, elaboram mapas com escalas, estudam biodiversidade e mudanças climáticas.
- A idéia é fazer uma grande biblioteca baniwa, para que a língua não se perca - diz ela.

Outra escola, a Tuyuka Utapinopona, já publicou quatro livros em língua indígena.
- A gente não está se isolando, ao contrário - diz André Baniwa, de 35 anos, que interrompe o trabalho no computador para atender ao repórter. - Estamos preparando para lançar uma página na internet em setembro, mostrando nossa arte.
O computador pode ser um instrumento para fazer a sociedade entender nossa maneira de vida e desconstruir a imagem negativa que se tem dos índios.

Diretor-presidente da Foirn, ele diz que o preconceito tem diminuído bastante.
- Antes, se fôssemos falar em baniwa, íamos estar cochichando para não dizerem: "Vocês não prestam."

André diz que ouviu depoimentos "muito fortes" sobre as mudanças que as escolas diferenciadas têm produzido na população indígena. Um menino tukano, que estudava na cidade, contou: "Estou feliz agora aqui. Estudo, vou na roça, pesco, faço festa, escrevo sobre isso. Antes, estudava até as 11h30m, depois não tinha nada para fazer, acabava roubando, e no dia seguinte não tinha vontade de estudar."
- Aqui é um dos poucos exemplos no país onde a atuação da sociedade civil tem conseguido modificar políticas públicas, já que o Estado abraçou um modelo de educação desenvolvido pela Foim com assessoria do ISA (www.socioambiental.org) - diz Gustavo Pinheiro, de 27 anos, administrador do ISA em São Gabriel.

Estuda-se a criação de uma universidade indígena em São Gabriel, com disciplinas como gestão de território. Antes de começar, ela já produz efeitos:
- A gente quer resgatar mais nossas origens. Tenho vontade de falar minha língua, mas há discriminação. Meu próprio pai não me ensinou, mas agora ele quer que a gente aprenda - diz Vanilce Carneiro Borges, de 16 anos, da etnia tukano.

MAURO VENTURA e MÁRCIA FOLETTO viajaram a convite do Instituto Telemar

O Globo, 20/08/2006, O País, p. 23

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