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Juiz proíbe ocupação de reserva indígena em Novo Progresso (PA)

Gazeta de Santarém-Santarém-PA
07 de Mai de 2002

O juiz Nélson Loureiro dos Santos, da Vara Federal de Santarém, concedeu liminar de interdito proibitório - defesa preventiva da posse - em favor do Ministério Público Federal (MPF) para evitar a ocupação de área pertencente aos índios mundurucus, em Novo Progresso, no sudoeste do Pará. De acordo com o procurador da República, Felício Pontes Júnior, a invasão de garimpeiros no local tornou o clima tenso na região, havendo a possibilidade de um conflito armado entre índios e invasores.
A decisão do juiz não interfere num termo de ajuste de conduta firmado em junho do ano passado entre o Ministério Público Federal, a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e garimpeiros que há vários anos trabalham no garimpo Nova Vida, localizado dentro da reserva indígena.
O problema é que, mesmo depois de firmado esse ajuste de conduta, com o compromisso do MPF de não ajuizar ação para retirar os garimpeiros que atuam na área, ocorreu nova invasão, desta vez patrocinada por pessoas que se dizem proprietárias de terras dentro da reserva.
Posse - Os líderes dos novos invasores, segundo o pedido de liminar impetrado por Felício Pontes Júnior, são o comerciante Josimar da Rocha Pereira, os advogados Hélio Antonio Machado e Semir Félix Albertoni, o garimpeiro José Ribamar Elisiário, além de Alcides Alves da Silva, conhecido por "Soneca". Informações da Fundação Nacional do Índio (Funai) e da Associação Indígena Pusuru revelam que "Soneca" estaria a serviço dos outros quatro líderes da invasão.
A Portaria 823, de 1998, do Ministério da Justiça, afirma que o local hoje ocupado pelos invasores é "posse tradicional e permanente dos índios Mundurucus". A interferência do MPF para evitar conflito entre índios e garimpeiros que já se encontravam na área antes da nova invasão assegurou a eles a ocupação mansa e pacífica da área, a avaliação das benfeitorias realizadas para fins de indenização, além do remanejamento das famílias para um assentamento do Incra em Santarém.
Mas, argumenta o juiz, embora o termo de ajuste de conduta induza ao entendimento de que a posse direta da área que se pretende proteger com o interdito proibitório esteja nas mãos dos garimpeiros que lá vivem, ao menos a posse indireta "pertence realmente aos índios". Estranhos - Os cerca de 300 garimpeiros do Nova Vida, assim como seus familiares, alegam que ali se fixaram há cerca de duas décadas, havendo por parte deles boa-fé, reconhecida pela própria Funai, embora ela só tenha detectado a presença deles no interior da reserva indígena no ano passado.
O processo de remanejamento dos garimpeiros para um assentamento do Incra em Santarém está em andamento, o que vinha acalmando os índios que desejavam se rebelar. Nos últimos dias, porém, a presença de novos invasores tirou de vez a tranqüilidade dos mundurucus. Hoje, tanto os índios quanto os garimpeiros não aceitam a permanência dos estranhos na área.
Os invasores já entraram em choque com os garimpeiros, inclusive derrubando marcos da Funai que delimitam a reserva dos índios. Plantações de garimpeiros também foram destruídas. Um dos acusados de comandar os atos de vandalismo é Alcides Alves da Silva.
Direitos - A Constituição de 1988, em seu artigo 231, afirma que são reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União proteger e fazer respeitar todos os seus bens. Em que pese o domínio seja da União sobre as terras indígenas, há restrição de natureza constitucional ao conceder a posse e o usufruto.
As terras indígenas são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio, e a posse das áreas indígenas. Isto não gera nulidade e a extinção, direito a indenização ou ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
Para o procurador, já existindo portaria do Ministério da Justiça que reconhece a área em que se localiza o garimpo Nova Vida como posse tradicional e permanente dos índios mundurucus, a situação política e jurídica da área "não gera qualquer direito real para terceiros".
Absurdo - Não é esse o entendimento dos invasores e de seus advogados. Eles se dizem legítimos donos da terra e chegaram a apresentar um instrumento particular de contrato societário. "Trata-se de completo absurdo", define Felício Pontes Júnior.
O ex-juiz do extinto Tribunal Federal de Recursos, José Celso de Melo, citado na ação do MPF, observa que terras habitadas por índios, integrando o patrimônio da União,"não podem figurar no registro imobiliário, em nome de particulares. Se isto efetivamente ocorrer, torna-se juridicamente irrelevante e absolutamente ineficaz a existência de título de domínio registrado em nome de terceiros".

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