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Isolamento cria poupança de peixe

OESP, Especial, H4-H5
31 de Out de 2012

Isolamento cria poupança de peixe
Experiência pioneira isola área dentro de unidade de uso sustentável e promove proliferação de animais

GIOVANA GIRARDI , ENVIADA ESPECIAL , TAMANDARÉ (PE)

Há cerca de 15 anos, os pescadores da região de Tamandaré (PE) estavam aflitos com a diminuição da oferta de pescado, que era farta 40 anos antes. "O peixe fugiu", queixavam-se a Mauro Maida, oceanógrafo do sul do País, que, depois de ter feito doutorado na Austrália, aportava em Pernambuco para estudar a segunda maior barreira de recifes de corais do Atlântico Sul.
A situação que encontrou era igualmente ruim. Embora em algumas áreas a cobertura viva dos recifes fosse abundante, assim como a presença de peixes e crustáceos, em outras a estrutura estava quase despovoada, com cobertura média de menos de 20% - em alguns casos, menos de 10%. "O pessoal coletava para fazer calcário, tirava para vender para turistas. E bastava alguma coisa viva se mexer para ser capturada", conta o pesquisador.
Os pescadores mais experientes sabiam que naqueles recifes se criavam muitos peixes de interesse comercial, mas achavam que era a pesca de arpão que estava afugentando os bichos.
Quando entenderam que na degradação daquele ambiente estava a explicação, foi possível desenvolver uma experiência pioneira no Brasil, que isolou uma área do mar de qualquer tipo de impacto humano, seja de pesca, turismo ou navegação.
Cenários isolados assim existem em outros cantos do País, mas, em geral, são casos em que um local é transformado em unidade de conservação de proteção integral, como ocorre com o Atol das Rocas e Abrolhos. No litoral de Pernambuco, a situação era bem diferente.
Em 1997, um trecho de 135 km de costa entre Tamandaré e Paripueira (AL) havia sido transformado pelo governo federal na Área de Proteção Ambiental (APA) Costa dos Corais, categoria que permite o uso sustentável. Dois anos depois, com base nas pesquisas de Maida e de sua mulher, a bióloga Beatrice Padovani, ambos da Universidade Federal de Pernambuco, e em acordo com a população local, uma pequena área de 400 hectares, que representa 0,1% da APA, foi fechada como reserva marinha.
O ponto, conhecido como Ilha da Barra, passou a ser monitorado diariamente, assim como recifes vizinhos, para checar os efeitos do isolamento na comparação com o uso contínuo. Após 13 anos, a experiência mostra bons resultados. E, se sozinha não foi capaz de aumentar os estoques de peixes a ponto de atender a todos os pescadores, já serve de modelo para ser replicado.
Coral-de-fogo. Segundo Maida, houve uma recuperação de 90% da cobertura viva dos recifes da área fechada, principalmente pelo coral-de-fogo (Millepora alcicornis), que é uma espécie de rápido crescimento. O tempo ainda é curto para a observação de outras espécies que possam estar repovoando o local. Algumas crescem à lenta velocidade de 3 a 4 milímetros por ano - contra 10 centímetros do coral-de-fogo.
Outro sinal de melhora é a diminuição de ouriços do mar, um indicador de estresse ambiental. Quando os corais morrem, eles ocupam os recifes e vão raspando o substrato para se alimentar de algas, o que deixa a estrutura cheia de buracos. "Quando a Ilha da Barra foi fechada, a abundância de ouriços era, em média, de 60 indivíduos por metro quadrado. O recife estava sendo erodido. E, se ele reduz muito de tamanho, perde a função de proteger a costa das ondas", diz Maida.
Com o isolamento, populações de peixes e lagostas voltaram a crescer na área, controlando a população de ouriços, que caiu para 4 m², o que deu espaço para os corais reocuparem os recifes. Também há, em média, seis vezes mais lagosta dentro que fora e quatro vezes mais polvos.
É mesma abundância média verificada entre peixes, sendo que para algumas espécies a vantagem passa de dez vezes dentro da Ilha da Barra, segundo Beatrice. Ela está finalizando também dados sobre aumento da biomassa, em artigo que vai analisar dez anos de monitoramento. "O aumento de indivíduos por metro quadrado foi rápido, progressivo e então se estabilizou, até porque a área é limitada. Mas o aumento da biomassa, que é o peso dos bichos, é contínuo", afirma a pesquisadora.
"Hoje, quando um pescador pega um polvo grande, de 1 kg, 1,5 kg, sabe que ele vem da área fechada. Do lado de fora, já vi um pescador pegar um polvo de 12 gramas", acrescenta Maida.
A tridimensionalidade do ambiente forma uma estrutura ideal para os animais crescerem. Vários peixes passam ao menos uma etapa do seu ciclo de vida abrigados pelos recifes. Se o local fica muito degradado, os peixes não têm onde ficar. Por isso a reserva funciona como um banco de peixes. Se eles têm tranquilidade para ficar no local crescendo, quando saem para povoar outros locais, estão maiores.
Alguns pescadores já perceberam essa melhoria e começaram a se posicionar no entorno da Ilha da Barra, esperando pegar os animais no transbordo, diz Maida. Questionado se os peixes lá sabem qual é a fronteira e a hora certa de sair, ele arremata com uma história de pescador. "A área fechada está cheia de tainha. Os pescadores ficam com as redes do lado de fora, esperando. Pois eles contam que a tainha chega à borda, olha e volta. O peixe sabe!", brinca.

Modelo será replicado em 10 pontos da APA
Ideia, que deve estar contemplada no plano de manejo prometido para o final do ano, pode criar uma rede de proteção

Giovana Girardi

TAMANDARÉ (PE) - Apesar de ter acabado de completar 15 anos de sua criação, a APA Costa dos Corais não tem plano de manejo. Mas se sair até o final do ano, como espera o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que gere a unidade, ele deve vir com a meta de replicar a experiência da Ilha da Barra em outros dez municípios que compõem a APA entre Pernambuco e Alagoas. Não há prazo definido.
Segundo Paulo Correa, gestor da APA, a decisão e a escolha dos locais será feita com as populações locais. "A gente acredita que o processo vai ser mais fácil, porque o pessoal já está sabendo das vantagens."
Com poucos funcionários para cuidar da APA - só quatro - e sem o plano de manejo, apesar de ter sido possível estabelecer algumas regras, como a proibição da coleta de coral, da pesca industrial e de bichos ornamentais, houve e há muito uso indevido.
Um exemplo é o de Maragogi (AL), uma das áreas mais ricas, com recifes que chegam a uma cobertura de 100%, onde o turismo ficou descontrolado. Visitantes pisavam nos corais como se fosse grama e alimentavam os peixes. A degradação foi tomando pé, o que levou o ICMBio a regular quatro áreas, com limite diário de visitação. Mas, fora desses locais, os problemas persistem.
Há um ano, a APA foi "adotada" pela SOS Mata Atlântica e a Fundação Toyota, que se comprometeu a doar R$ 1 milhão por ano, em dez anos. O fundo é gerido pela ONG, que apoia o ICMBio e ações de conservação locais do Instituto Recife de Corais, de Mauro Maida, da Cooperativa Náutica Ambiental, que ajuda a fiscalizar a Ilha da Barra, e do Instituto BiomaBrasil e da Associação Peixe-Boi, que trabalham com manguezais em Porto de Pedras (AL). A ideia é fortalecer a gestão, ajudando com equipamentos para a fiscalização e a fazer o plano de manejo.

Mero está protegido apenas até 2015
Ambientalista defende que o veto à caça da espécie seja prorrogado por mais dez anos

Bruno Deiro

Publicada no Diário Oficial há duas semanas, a prorrogação do veto à caça do mero garantiu a proteção da espécie até 2015. Mesmo com a captura proibida desde 2002, o animal, cujo peso pode chegar a meia tonelada, ainda deve levar mais que três anos para deixar a posição de "criticamente ameaçado" na lista vermelha da União Internacional pela Conservação da Natureza (UICN, da sigla em inglês).
Coordenador do projeto Meros do Brasil durante dez anos, Maurício Hostim afirma que o pedido inicial dos pesquisadores é de que a proibição fosse prorrogada por mais dez anos.
"Não há justificativa técnica para ter prorrogado por apenas três anos. O mero não atinge a maturidade sexual antes de cinco anos", afirma Hostim, lembrando que cada indivíduo pode viver por até 50 anos. "É preciso avaliar por um período mais longo e certamente o prazo será prorrogado novamente."
De acordo com o pesquisador, não haveria grande impacto caso a proibição fosse estendida até 2022. "Não é um peixe do qual existam comunidades dependentes", afirma.
Além das questões referentes ao ciclo reprodutivo do mero, a preocupação de Hostim se sustenta pela quantidade insuficiente de pontos de monitoramento - são apenas dez deles no País, segundo ele. "A portaria (que proíbe a caça) estaria garantida se houvesse esta vigilância. Onde não há monitoramento, não há fiscalização", alerta.
A instrução normativa dos Ministérios do Meio Ambiente e da Pesca determina que os pescadores que descumprirem a proibição terão os animais apreendidos e pagarão multa que varia entre R$ 700 e R$ 100 mil, acrescida de R$ 20 por quilo do pescado e outros R$ 40, no caso de venda ilegal. O infrator ainda pode receber pena de um a três anos de detenção, além de ter cadastros e licenças de atividade pesqueira cancelados.
Caso o mero seja capturado de maneira acidental, durante a pesca de outras espécies, terá de ser devolvido imediatamente à água - a normativa vale também para os indivíduos que forem capturados mortos. Além disso, o pescado deve registrar o fato nos mapas de bordo das embarcações.
Hábitat
Hostim, que hoje coordena o projeto Meros do Brasil apenas no Espírito Santo, afirma que o peixe era abundante no País até o século passado. "Ele possui uma carne saborosa, parecida com a garoupa", explica.
A semelhança com a garoupa, por sinal, não fica apenas no sabor. As características naturais semelhantes têm sido exploradas pelo Instituto de Pesca de São Paulo, que desenvolveu um método de reprodução em cativeiro para garoupas e agora tenta repeti-los com os meros.
"Outro problema é que no País há pouca proteção aos manguezais, que é onde o mero se reproduz. Se não forem garantidas as boas condições desses locais, a proibição da caça terá pouco efeito", afirma Hostim.
Ele diz, porém, que já há sinais de avanço. Em locais de Santa Catarina onde não havia indicações de ocorrência da espécie, recentemente foram avistados grupos de até 40 indivíduos reunidos em época de reprodução.

OESP, 31/10/2012, Especial, H4-H5

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