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Interior ameaca reduzir envio de agua para SP

OESP, Cidades, p.C1
24 de Mai de 2004

Interior ameaça reduzir envio de água para SP
Cantareira tem hoje reforço da Bacia do Piracicaba, mas outorga termina em 3 meses
Mauro Mug
A situação de escassez de água na Grande São Paulo pode ficar ainda mais crítica a partir do segundo semestre. No dia 5 de agosto, termina uma outorga de 30 anos que permite o desvio de água das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, na região de Campinas, para o Sistema Cantareira, na região metropolitana de São Paulo, responsável pelo abastecimento de 9 milhões de pessoas.
Prejudicados pela menor oferta de água, conseqüência da reversão para São Paulo, os municípios dessas bacias querem renovar a concessão por apenas 10 anos e ainda impor uma redução de 13% na vazão destinada à capital. A perda equivaleria ao fornecimento de água durante um dia para 1 milhão de pessoas.
Embora a decisão final dependa da Agência Nacional de Água (ANA), a polêmica já coloca em pé de guerra os dois principais pólos industriais do Estado – em âmbito nacional, a região das bacias só perde para o Rio. Vai haver uma rebelião, pois a região toda está mobilizada. Não vamos concordar com a manutenção da atual vazão”, afirma o presidente do Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (CHB-PCJ) e prefeito de Rio Claro, Cláudio Antonio de Mauro (PV).
Os municípios reclamam que o fluxo menor de seus rios limita o desenvolvimento econômico da região e ainda encarece o tratamento de água porque os poluentes ficam mais concentrados no menor volume de água. A população da Grande São Paulo precisa ser informada de que, para seu abastecimento, cidades do interior estão tendo de enfrentar sacrifícios”, diz Mauro.
Índices – Na região das três bacias, a disponibilidade hídrica por habitante é de 400 metros cúbicos por ano – a Organização das Nações Unidas recomenda 1.500 metros cúbicos. Graças ao desvio para o Sistema Cantareira, a Grande São Paulo consegue uma média de 500 metros cúbicos por ano para cada habitante.
Atualmente, a outorga permite à Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) retirar 31 metros cúbicos de água por segundo dos rios dessas bacias para o abastecimento de 49% da população da Grande São Paulo. O CHB-PCJ quer condicionar a renovação da outorga a uma redução para 27 m³/s.
Se isso acontecer, não vai haver água para todo mundo e teremos de adotar medidas drásticas para enfrentar o problema, o que inclui adotar ou intensificar o racionamento”, avalia Hélio Luiz Castro, superintendente da Unidade de Negócios de Produção de Água da Sabesp. Segundo ele, as cidades das três bacias também não fazem sua parte ao não construir represas para guardar a água no período chuvoso. Em São Paulo, construímos seis reservatórios com barragens, para armazenar água e enfrentar o período de estiagem”, rebate. Na Bacia, os municípios captam água diretamente dos rios. Como não há reservatórios, há uma diminuição nas vazões quando as chuvas se tornam raras.”
Limite – A empresa já trabalha no limite de sua capacidade em todo o Estado. Os seis sistemas de captação produzem 68 metros cúbicos por segundo, quantidade que empata com o consumo. Só que as decisões sempre dão prioridade ao abastecimento da Grande São Paulo, mantendo inalterado o volume desviado para lá e reduzindo a quantidade que destina as cidades das bacias”, afirma Francisco Carlos Castro Lahóz, coordenador da equipe técnica do Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí, um dos braços executivos do Comitê das Bacias.
Há risco de colapso no abastecimento também nessa região”, reforça o promotor de Meio Ambiente Oriel Queiroz. Não podemos mais aceitar que apenas uma parte dite as regras.” A escassez nas bacias inibe a instalação de indústrias com alto consumo de água, como aconteceu com a Usina Hidrelétrica Carioba 2, que seria construída em Americana, ou com a cervejaria Ambev, que teria desistido de ampliar suas instalações em Jaguariúna.
A Petrobrás teme reduzir sua produção na Refinaria de Paulínia (Replan) por causa da falta de água. A queda no refino dos 57,2 milhões de litros de petróleo poderá ocorrer em agosto, quando a estiagem é mais acentuada na região e poderá reduzir ainda mais o volume de água do Rio Jaguari”, diz Jorge Antonio Mercante, consultor de Meio Ambiente da Petrobrás. Se não tivéssemos um programa de reúso da água, não sei se daria para retirar isso tudo do rio.”
A renovação da outorga vai ser debatida até se chegar a um consenso”, pondera Rui Brasil Assis, coordenador de Recursos Hídricos da Secretaria Estadual de Recursos Hídricos. Ele evita falar em guerra pela água” dentro do Estado e acredita que não se deve estipular valores fixos de vazão para o ano todo, como quer o CHB-PCJ.
A ANA montou um grupo de trabalho para ouvir as partes envolvidas e até lá prefere não se pronunciar sobre o assunto. (Colaborou Bárbara Souza)

Tratamento de esgoto é um dos desafios da região
Os municípios das bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí têm investido pesado em obras de tratamento de esgoto para melhorar a qualidade da água, condição vital para seu desenvolvimento econômico. As prefeituras investiram R$ 500 milhões na construção de emissários e estações de tratamento, mas estima-se que seriam necessários US$ 4 bilhões para despoluição dos rios, reposição de mata ciliar, educação ambiental e construção de barragens.
Uma das metas é ampliar o tratamento de esgoto para 55% até 2005. "O índice de tratamento do esgoto doméstico nas bacias saltou de 3% em 1990 para 18% em 2000, graças ao investimento de R$ 260 milhões", afirma Andréa Peçanha, gerente de desenvolvimento institucional da ONG Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE). "Até junho, a taxa chegará a 36%, com verba de R$ 240 milhões."
Um estudo da Companhia de Tecnologia e de Saneamento Ambiental (Cetesb) coloca as três bacias entre as mais degradas do Estado. Alguns trechos estão tão comprometidos que só servem para navegação. Na química da poluição das bacias entram resíduos produzidos nas casas, comércio, indústrias e hospitais de 58 municípios paulistas e 4 mineiros. A degradação é produzida pelo lançamento de 157 toneladas por dia de esgoto doméstico e 106 toneladas diárias de resíduos industriais, de acordo com o Comitê das Bacias.
Com um investimento de R$ 4 milhões, a prefeitura de Jaguariúna entregou a Estação de Tratamento de Esgoto da Bacia do Camanducaia, com capacidade para tratar 100% dos efluentes domésticos. Estão em construção 18 estações elevatórias e 15 quilômetros de emissários. Em 2005, o esgoto tratado será despejado no Rio Camanducaia com a redução de 95% da matéria orgânica. (M.M.e B.B.)

OESP, 24/05/2004, p. C1

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