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A infância indígena abandonada

Jornal do Brasil on line - http://jbonline.terra.com.br/pextra/2009/03/31/e310329129.asp
Autor: Luciana Abade
31 de Mar de 2009

BRASÍLIA - No Brasil, uma em cada quatro crianças indígenas da etnia Kaingáng apresenta déficit de altura para a idade. Nas aldeias localizadas na Terra Indígena de Mangueirinha, no Paraná, 18% delas nascem com menos de 2,5 kg. Um percentual elevado se comparado à prevalência de baixo peso na população de crianças não-indígenas, que não chega a 8%. Já na comunidade de Rio das Cobras-PR, 95% das crianças apresentam algum tipo de parasita, principalmente a lombriga. Todos esses problemas poderiam ser evitados se houvesse uma atenção primária à saúde adequada, segundo denuncia estudo divulgado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

De acordo com os pesquisadores, a situação das crianças está ligada a uma realidade precária no qual o estado nutricional dos índios reflete condições ambientais e socioeconômicas amplamente desfavoráveis para o crescimento infantil. A prevalência de baixa estatura foi de 23,2% quando as paredes das casas eram construídas com material durável, enquanto as médias nacionais e regional eram equivalentes a 10,5% e 5,1% respectivamente. Além do reaproveitamento de materias inadequados para a construção das moradias, a falta de energia elétrica e a ausência de saneamento básico são citados como exemplo dessa falta de estrutura.

Já o baixo-peso de muitos recém nascidos poderia ser evitado, segundo os pesquisadores, se as mães tivessem um acompanhamento de pré-natal adequado. O peso ao nascer afeta o crescimento físico.

Outro problema apontado pelos autores diz respeito a escassez de informações epidemiológicas e demográficas, que acabam por restringir o desenvolvimento de intervenções sociais e de saúde.

Peculiaridades
- A cultura indígena tem mudado e não é oferecido aos indígenas uma infraestrutura adequada para essa nova realidade - denuncia uma das autoras do estudo, Adriana Masiero. - Outro grande problema é que os programas sociais nacionais são feitos de cima, sem conhecimento das peculiaridades dos povos indígenas.
Um exemplo citado pela pesquisadora é o programa Leite da Criança, do governo do Paraná, que alcança as tribos indígenas.
- O leite é distribuído - afirma Adriana. - Mas muitas famílias não têm energia elétrica e o produto estraga. Mesmo assim, muitas mães ainda dão para as crianças.

Apesar de ser menos frequente, o sobrepeso na infância foi outro problema identificado na população indígenas estudada. O que, na opinião dos pesquisadores, ganha relevância diante das evidências de mudanças no novo estilo de vida dos povos indígenas que tem sido ignoradas.

Em relação às características maternas, a baixa escolaridade predominou: 71,6% possuiam quatro anos de estudo ou menos. E cerca de 14% das mães tem menos de 20 anos.

Relatório divulgado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em 2007, mostrou que a mortalidade infantil entre os indígenas é o dobro da nacional. E os estados do Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Tocantins foram os que apresentaram o maior número de mortes por subnutrição e desidratação infantil. As causas apontadas pelo relatório vão desde a saúde precária das mães à falta de transporte para os postos médicos.

O crescente número de mortes dessas crianças, principalmente no Mato Grosso do Sul, onde nos últimos cinco anos a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) registrou 80 mortes de menores com até cinco anos, levou a Câmara dos Deputados a instalar, no ano passado, a CPI da Subnutrição Indígena.

A Funasa, responsável pela saúde dos índios no Brasil, foi bombardeada no ano passado por acusações de corrupção, feitas inclusive pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão. O ministro disse que o órgão apresenta uma baixa qualidade de serviços e que as contínuas denúncias de desvio de dinheiro não podiam continuar. A briga entre Temporão e o presidente da Funasa, Danilo Forte, começou, na verdade, quando o governo enviou ao Congresso projeto de lei que tira da Funasa a responsabilidade de cuidar da saúde dos índios.

Assinada pelos ministros Temporão e Paulo Bernardo, do Planejamento, a proposta prevê a criação de uma nova secretaria, ligada ao Ministério da Saúde, que cuidaria da saúde primária dos índios. Se aprovada, a Funasa perderia os R$ 304 milhões que recebe anualmente para investir na assistência primária da população indígena.

Procurada pelo JB, a Funasa preferiu não se manifestar sobre o estudo da Fiocruz. A assessoria do órgão se limitou a enviar um documento que explica o funcionamento do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional.

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