VOLTAR

Índios fecham sede da Funai

A Crítica-Manaus-AM
Autor: Loredana Kotinski
30 de Mai de 2003

Os Ticunas fazem um protesto pacífico contra a nomeação de Nino Fernandes para administrador regional da Funai

Há uma semana o escritório da fundação Nacional do Índio (Funai) em Tabatinga (a 1.105 quilômetros de Manaus) está tomado por índios ticunas. Liderados pelo cacique Pedro Inácio Pinheiro, eles fecharam as portas do órgão em protesto à nomeação do também ticuna Nino Fernandes para o cargo de administrador regional da Funai. "A gente só sai daqui com a presença do presidente da Funai", avisou o cacique. Na sexta-feira passada cerca de cem ticunas tomaram o prédio que fica na sede do município e não deixam ninguém entrar.

A informação foi dada ontem, por telefone, pelo próprio cacique Pedro Inácio. De acordo com ele, "o presidente da Funai desrespeitou o povo ticuna quando nomeou Nino para ser administrador sem consultar os índios". Ele disse que,no momento, ele e mais três índios guardam a sede da Funai em Tabatinga e só pretendem sair de lá depois que conseguirem rever a nomeação de Nino fernandes.

O cacique garantiu que o protesto é pacífico e que eles não estão armados, mas sinaliza para um clima de possível tensão caso Nino Fernandes resolva assumir seu posto na sede sem que o impasse esteja resolvido. "Eles nem fizeram uma assembléia para saber se a gente queria o Nino ou o Walmir", disse, se referindo ao ex-administrador da Funai, Walmir Barros.

Para Pedro Inácio, a nomeação de Nino é uma imposição da Funai. Em duas cartas enviadas no dia 23 ao presidente da Funai, Eduardo Aguiar de Almeida, e ao ministro da Justiça, Márcio Tomáz Bastos, o cacique reúne 20 assinaturas para reforçar as críticas de "desrespeito". À Eduardo Almeida ele diz no documento que "cada cacique manifesta sua revolta contra a forma como Nino Fernandes foi nomeado". E afirma que não há nenhum documento onde os caciques peçam a nomeação de Nino como administrador.

Ele pede, ainda, a permanência do ex-administrador, Walmir Barros. E denuncia que "atrás de Nino tem o João Pacheco, pessoa que mais sabe criar atrito entre os índios, criando divisões". Pedro Inácio confirma ter estado no dia 19 de maio na sede da Funai e relata ter "quase havido uma tragédia com Paulo Roberto, assessor de Nino".

Ao ministro da Justiça, o cacique avisa da ocupação da sede da Funai, explica os motivos e avisa: "a Funai tem que ser um órgão de defesa dos índios, então tem que ser neutro e imparcial. Também não pode ser um órgão político."

Longa espera

Nino Fernandes, que está no município de Benjamin Constant (a 1.116 quilômetros de Manaus), disse que irá aguardar até o dia 16 de junho para retomar os trabalhos como administrador da Funai. Antes, disse, está disposto a se submeter uma assembléia geral - marcada para esse dia, na comunidade Belém do Solimões - com a presença de ticunas, Cambeba, e outras etinias do Alto Solimões - para saber se deve ou não ser administrador na região.

Ele, que é também é coordenador geral da Coordenação Geral da Tribo Ticuna (CGTT), nega ter sido nomeado administrador da Funai sem o apoio de seu povo. "Fizemos uma reunião no dia 14 de fevereiro e houve uma votação. Tive 23 votos e venci. Meu povo me apóia e isso é coisa do Walmir que está manipulando o Pedro Inácio para criar conflito entre os ticunas", alertou. Nino foi nomeado pelo Decreto no 377, no dia 9 de maio, pelo presidente da Funai.

Presidente da Coiab suspeita de armação

O presidente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Jecinaldo Sateré-maué, 26, disse suspeitar que a ocupação do escritório da Funai em Tabatinga pode ser fruto da manipulação de índios por funcionários da Funai no município. Ele entende que o cacique Pedro Inácio tem o direito de manifestar seu protesto contra a nomeação de Nino Fernandes como administrador, mas avalia que esse impasse entre os ticunas enfraquece o movimento indígena.

Para ele, o Brasil inteiro vive a expectativa de reestruturação da Funai, com revisão no quadro de pessoal, principalmente. E, que todo esse processo e as mudanças consequentes dele, devem passar por uma consulta dos povos indígenas. "Também concordo que as comunidades indígenas é que devem decidir quem querem trabalhando com eles e de que forma."

Jecinaldo disse que o papel de órgão de tutela a que a Funai ficou vinculado ao longo desses anos já não faz mais sentido. E, por isso, mesmo, antigos funcionários que ainda trabalham com esse pensamento precisam ser reciclados ou substituídos. Ele disse lamentar o impasse entre os ticuna e avisa que no dia 4 de junho estará em Tabatinga, se reunindo com os ticunas para tentar articular uma solução pacífica e de consenso.

A reportagem de A CRÍTICA tentou contato com o presidente da Funai, por meio dos telefones (61) 313-35XX e 35XX e a ligação foi transferida para a Assessoria de Imprensa, onde ninguém atendeu à chamada. Em Manaus, o sub-administrador, José Roberto, confirmou a ocupação do escritório em Tabatinga, mas informou que o assunto deveria ser tratado com a presidência da Funai.

Ticunas

Estima-se que a população dos ticunas seja de 35 mil índios. Eles habitam a região do Alto Solimões, distribuídos pelos municípios de Tabatinga, Benjamin Constant, Santo Antônio do Içá e São Paulo de Olivença entre outras localidades. Essa etnia tem rico artesanato e uma cultura de cantos e lendas igualmente forte.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.