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Índios dão ultimato a garimpeiros

http://www.folhabv.com.br/fbv/Noticia_Impressa.php?id=55457
Autor: ANDREZZA TRAJANO
04 de Fev de 2009

Cansados de esperar que autoridades retirem os garimpeiros que exploram ilegalmente os minérios da terra indígena Yanomami, a leste de Roraima, os indígenas que habitam a região ameaçam "expulsá-los com seus métodos e armas tradicionais [arco e flecha]".

As afirmações foram feitas ao site Instituto Sócio Ambiental e reafirmadas ontem em entrevista à Folha. Os índios deram ultimato aos garimpeiros para que saiam da região e pediram providência urgente da Polícia Federal (PF), Fundação Nacional do Índio (Funai), Ministério Público Federal e Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), antes que façam Justiça com as próprias mãos.

A Folha conversou com o índio Anselmo Xiropino Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami (HAY) e o índio yekuana Maurício Tomé Rocha, gestor da HAY e coordenador da Ong Terra e Ambiente.

O homicídio do tuxaua Yekuana, Luiz Vicente Carton, da comunidade São Luiz do Arame, em Alto Alegre, cometido por garimpeiros, no mês passado, foi a "gota d'água" para os índios.
Anselmo Yanomami observou que a garimpagem ilegal na reserva não é nenhuma novidade. Lembrou que o problema existe desde a década de 70 e que foi parcialmente resolvido em 1992, quando a terra indígena foi homologada. Neste mesmo ano, a PF realizou a Operação Selva Livre e acabou com grande parte dos garimpos ilegais.

Dezessete anos depois da demarcação contínua, o índio disse que nenhuma outra ação foi realizada e que os garimpos ressurgiram de maneira exorbitante. Ele não soube dizer quantos estão em atividade, mas disse que se concentram nas regiões de Waicás, Uraricoera, Hakoma, Homoxi, Alto Catrimani e Paapiu. Na estimativa dele, existem dois mil garimpeiros na terra Yanomami.

Em Paapiu, os indígenas encontraram três garimpeiros, no último dia 25, próximo do rio Couto de Magalhães. A liderança indígena falou que em uma comunidade próxima dali, em Remoripi, existe uma pista de pouso conhecida como Caveira, muito utilizada pelos garimpeiros.
Conforme Maurício Rocha, um garimpeiro de aproximadamente 20 anos foi encontrado recentemente em Auaris. Disse aos índios que estava perdido e foi trazido para Boa Vista por funcionários da Funai. Ele não soube informar se o garimpeiro foi entregue à Polícia Federal.
Mesmo diante de todos os problemas enfrentados, os índios dizem que a saída ainda é a paz e pedem que os governos arrumem terras fora da reserva para os garimpeiros trabalharem.
Eles vão esperar uma ação rápida do poder público - o período de espera será definido este mês, em reunião entre as lideranças - ou então vão agir por conta própria. E mesmo utilizando seus recursos para retirar os garimpeiros, afirmam que vão primeiro buscar o diálogo.

"Faremos nossa operação usando a política de força tradicional do povo Yanomami, que é se arrumar como guerreiros. Vamos tentar conversar com eles e, se não houver conversa boa, aí sim vai haver conflito", enfatizou Anselmo.

Maurício foi mais ríspido ao falar como será a maneira de agir dos Yekuana. "Se chegar outro garimpeiro lá, vamos fazer do mesmo jeito que fizeram com meu tio", afirmou, em alusão ao tuxaua Luiz Vicente, tio dele, que foi morto pelos garimpeiros com um tiro na cabeça. O avô dele também foi morto décadas atrás por garimpeiros.

Os acontecimentos chamaram a atenção de organizações internacionais de apoio aos povos indígenas. Em carta endereçada ao ministro da Justiça, Tarso Genro, a Survival Internacional, de Londres, se diz alarmada com o avanço do garimpo e cobra uma atitude firme das autoridades competentes.

Garimpeiros seduzem índios, afirmam lideranças

Além da disseminação de doenças e degradação ao meio ambiente enfrentados pelos índios com a presença de garimpeiros em suas terras, eles convivem com os relacionamentos amorosos entre os garimpeiros e as indígenas, além da exploração da mão-de-obra.
Anselmo Yanomami narrou o caso de um garimpeiro que vive maritalmente com uma índia yanomami, em Surucucu. Ele fala a língua dos índios e o casal tem vários filhos. "Os indígenas dessa comunidade o aceitam, porque ele leva munição e distribui com os índios. Em contrapartida, ele continua com a atividade de garipagem ilegal na região. A PF já tentou retirá-lo da comunidade, porém os indígenas o escondem na mata", afirmou.
O outro problema, segundo Anselmo, é a exploração da mão-de-obra dos índios. "Eles [índios] são seduzidos com dinheiro, espingarda, roupa e até arroz. Em troca devem trabalhar para os garimpeiros. "Mas não é por interesse que fazem isso, é porque o povo Yanomami ainda não entende os verdadeiros interesses dos garimpeiros", observou.
CORPO - Maurício Rocha disse que os índios Yekuana continuam procurando o corpo do tuxaua Luiz Vicente Carton. Eles acreditam que o corpo tenha sido jogado no rio.
Disse que a morte dele foi uma grande perda para o povo. No Brasil, mais especificamente em Roraima, vivem cerca de 450 índios Yekuana, divididos nas comunidades Waicás, Auarias e Pedra Branca. Os demais, cerca de 7 mil, habitam a Venezuela.
Com a prisão dos cinco garimpeiros na semana passada, acusados do homicídio, Maurício disse que os indígenas estão mais tranquilos.

Funai e Polícia Federal afirmam que estão de olho nos garimpeiros

Em resposta à reclamação dos índios Yekuana e Yanomami, o administrador substituto da Funai, Petrônio Laranjeira, disse que a instituição está tomando providências para combater o garimpo ilegal na terra indígena Yanomami.
Segundo ele, técnicos da Funai sobrevoaram a região e localizaram os garimpos. Laranjeira explicou que a ação de retirada só não foi realizada ainda por uma questão orçamentária, já que a operação exigirá grande logística. Mas esclareceu que o órgão já trabalha com um plano de retirada e que possui todos os levantamentos dos garimpos.
Por sua vez, a Polícia Federal se limitou a informar que sempre trabalhou no combate ao garimpo em terras indígenas e que todas as denúncias estão sendo apuradas.

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