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Índios começam a desocupar terreno da Vale em Carajás

O Globo, O País, p. 17
20 de Out de 2006

Índios começam a desocupar terreno da Vale em Carajás

Ismael Machado

Os 200 índios xikrin das etnias Cateté e Djudjêkô que ocupavam, desde a terça-feira, o núcleo urbano da Companhia Vale do Rio Doce em Caraj ás, no Pará, iniciaram a desocupação da empresa no fim da tarde de ontem. A saída foi resultado de uma intervenção da Fundação Nacional do índio (Funai). A Vale alega que a mina de Carajás não está localizada em território indígena.

Segundo representantes da Funai, os índios fizeram a parte deles liberando a empresa, mas querem ser ouvidos pela Vale. A Funai tentará marcar uma reunião com a companhia em Brasília.

- A Vale não está levando a sério a situação, está brincando com os índios - acusou o administrador da Funai em Marabá, Raulien Oliveira.

Por causa da invasão, a Vale do Rio Doce ameaçou cancelar todos os contratos mantidos até agora com as duas aldeias xikrin. A invasão resultou na paralisação de toda a atividade de mineração da empresa.

- Podemos cancelar o acordo com os índios. Não podemos dar assistência financeira a uma comunidade que nos agride. Não vamos negociar sob chantagem - reagiu o diretor de Operações de Ferrosos Norte, José Carlos Gomes Soares.

Empresas entram com queixa-crime contra índios
Apesar de ser a segunda invasão do núcleo pelos xikrin em dois anos, a companhia informou que não vai aumentar a segurança no local. Mas pretende responsabilizar os líderes indígenas por agressão, constrangimento e roubo. Pelo menos 15 empresas que prestam serviço à Vale ià teriam entrado com queixa-crime contra os índios.

Empresa retoma atividade apesar de impasse
Índios querem reajuste; Vale diz que não cederá a 'chantagem'

A Companhia Vale do Rio Doce divulgou nota ontem, após a desocupação de suas instalações por índios da Terra Indígena Xikrin, das aldeias Cateté e Djudjêkô. De acordo com a nota, os índios acataram parcialmente a decisão da Justiça Federal, que determinou a imediata reintegração de posse, já que alguns líderes das comunidades permanecem no local. As atividades seriam retomadas ainda ontem. Cerca de 500 mil toneladas de minério de ferro deixaram de ser exportadas.

"A Vale reafirma que não aceita negociar com comunidades que utilizem meios ilegais para forçar a companhia a aceitar suas exigências, e que vem cumprindo integralmente o acordo assinado com as comunidades indígenas daquela região e sempre estará aberta ao diálogo sob orientação da Funai", diz a nota, na qual a direção reitera que "não compactua com tais métodos ilegais e continuará não cedendo a chantagens de qualquer espécie".

O dia ontem foi tenso. Um grupo ficou na entrada da mina, impedindo a entrada de funcionários, e outro no núcleo urbano em Carajás. O comércio foi fechado e as aulas, suspensas.

- A sensação era de risco.

Os índios estavam armados e pintados para a guerra - disse o diretor da Vale José Carlos Gomes Soares.

Os xikrin reivindicam aumento do repasse financeiro, que hoje é de R$ 9 milhões anuais, mais a construção de 60 casas para as comunidades Cateté e DjudjekôBekuare, além de reforma e manutenção de estradas de acesso às comunidades. Outra reivindicação é para que a Vale assuma dívidas contraídas pelos próprios índios, como consumo de combustíveis, cuja despesa bateria em R$ 1 milhão.

- A gente não quer briga, só quer o reajuste -disse o cacique Karangré.

A Vale contabiliza prejuízos de U$ 21 milhões pelos três dias de paralisação. Até o fim da tarde de ontem, sete navios estavam ancorados em São Luís esperando o carregamento de minério que iria para outros países. A Vale produz 250 mil toneladas de minério de ferro por dia; 500 mil toneladas deixaram de ser exportadas.

- O maior prejuízo é não cumprir contratos e o Brasil não faturar com as exportações. Estamos trabalhando no limite de capacidade e não tem como repor essa perda ainda esse ano - avaliá Soares.

Empresa e aldeias têm convênio desde 1982
Os xikrin vivem em duas aldeias, a Cateté e Djudjêkô, na margem esquerda do Rio Cateté, numa área de 439.150 hectares, próximo às florestas de Carajás, Tapirapé-Aquiri e do ltacaiúnas.

São cerca de 550 na Cateté e 260 no Djudjêkô. A Vale tem unidades operacionais na Floresta Nacional de Carajás, mas a companhia informa que a mina não está localizada em terra indígena.

A relação entre a Vale e os índios xikrin foi formalizada em 1982, com um convênio firmado entre a companhia e a Funai para a prestação de assistência às comunidades indígenas localizadas numa faixa de cem quilômetros de cada lado da Estrada de Ferro Carajás. Seria uma medida compensatória pelos impactos do projeto às comunidades, uma condição imposta pelo Banco Mundial para participar do financiamento do projeto.

O Globo, 20/10/2006, O País, p. 17

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