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Índio senador teme as 'cobras do Congresso'

Jornal da Tarde-São Paulo-SP
Autor: André Amaral
21 de Jan de 2003

É provável que Apurinã, segundo suplente de senador, assuma seu 'mandato' durante a Semana do Índio, em abril

Encontrar cobras no meio da selva era rotina na vida de Antônio Apurinã quando ele era garoto e vivia na aldeia na divisa do Acre com o Amazonas. Em abril, quando ele virar o primeiro senador índio da história da República, acha que terá uma aventura bem mais perigosa. "Na selva encontrei algumas cobrinhas, sem nenhum problema. As do Congresso são bem mais venenosas", diz.

Filiado ao PC do B do Acre, ele deve passar pelo menos alguns dias como senador por conta de um acordo entre os suplentes de Marina Silva, que virou ministra do Meio Ambiente. Ele é segundo suplente, e fica no cargo durante uma licença do primeiro, Sibá Machado. Não está definido o tempo do 'mandato' de Apurinã, nem mesmo quando ele vai assumir. Provavelmente será durante a Semana do Índio, em abril.

Atualmente porém, a maior preocupação de Antônio é completar o primeiro grau. Ele estuda pelo Telecurso 2000, da Rede Globo e faz aulas de reforço em uma escola para adultos em Rio Branco, mas vem tendo dificuldades para conseguir passar em espanhol. "Quando eu era garoto, estudei em uma escola de um seringueiro que vivia do lado da aldeia. Mas eu estudava à noite e não deu para continuar", conta.

Caçando pacas e porcos selvagens

A vida de garoto índio era sobreviver com o que a selva tinha para oferecer: pesca nos rios e igarapés da região, colheita de raízes como a macaxeira e caça de pacas, cotias e porcos selvagens. Antônio falava português e apurinã. Na língua da tribo, homem branco é kariwa, mau é maereka e fazer é txa. Não existe palavra para definir político ou senador.

Em 1980, Antônio foi morar em Rio Branco, onde fez bicos como vigia e servente de pedreiro. Anos mais tarde, teve contato com a política por meio de seu envolvimento com entidades de ajuda aos índios da região. Conheceu o comunismo e se identificou. "É uma filosofia que tem muito a ver com a dos índios, principalmente nos direitos individuais", conta ele, que já participou de alguns seminários sobre marxismo ministrados pelo partido.

O apurinã será o segundo índio no Congresso, o primeiro desde que o cacique Mário Juruna ganhou uma vaga de deputado federal em 1982, concorrendo pelo PDT do Rio de Janeiro. Mas Antônio acha que não terá muito o que fazer pelos 700 mil índios que vivem no Brasil.

"O Juruna foi mal-assessorado e mal-entendido. Não dá condições para eu fazer muita coisa, mas quero deixar a minha marca, meu exemplo, no Senado", diz ele, que planeja uma entrada no Senado Federal em grande estilo, com cocar, roupas e pinturas indígenas. "Sou um índio apurinã. Em qualquer lugar onde eu estiver, não posso deixar de lado as tradições do meu povo', diz.

Antônio que acha que terá dificuldade com a burocracia. Está mais acostumado com a simplicidade da vida indígena, como quando quis casar com uma índia da aldeia. "Gostava dela, casei e pronto. Não teve nada dessas coisas de cartório..."

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