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Indígena Awá Guajá é encontrado morto em hotel no Maranhão

Cimi
01 de Nov de 2006

Na última sexta-feira, dia 27 de outubro, um indígena Awá Guajá da aldeia Juriti foi encontrado morto num quarto de hotel em Santa Inês, no Maranhão. Too Awá estava acompanhado de pessoas da Fundação Nacional do Índio (Funai) com quem deveria fazer uma viagem no dia seguinte. Na noite da quinta-feira, dia 26, foi dormir e não acordou mais.

A causa da morte é desconhecida, mas segundo informações da Funai, tudo indica que ele foi vítima de um ataque cardíaco. Se confirmada esta hipótese, será necessário esclarecer o que causou um ataque repentino em um indígena de pouco contato.

Diante do triste acontecimento algumas perguntas nos vêm imediatamente à cabeça. O que um Awá Guajá da aldeia Juriti estava fazendo num hotel de Santa Inês? Que viagem era essa que ele faria no dia seguinte?

O caso da morte de Too traz à tona outra situação extremamente preocupante vivida pelos indígenas Awá Guajá no Maranhão. Segundo relatos de indígenas Awá Guajá e Guajajara, a Funai estaria preparando uma operação para contatar um grupo de aproximadamente 60 pessoas, divididos em três sub grupos, de Awá Guajá que ainda vivem livres, sem contato com a sociedade envolvente, na Terra Indígena Araribóia, no centro-oeste do Maranhão. Os indígenas também informaram que Too estaria em Santa Inês para acompanhar a equipe da Funai que se deslocaria para a T.I. Araribóia, objetivando fazer esse contato.

A incapacidade dos órgãos federais de controlar a ação desenfreada dos madeireiros, que todos os dias retiram ilegalmente dezenas de caminhões carregados de madeira da T.I. Araribóia, seria o motivo alegado para a realização do contato.

A ação dos madeireiros e a omissão da Funai diante dessa situação colocam em risco a vida do Povo Awá Guajá. São grupos familiares que vivem livres na mata, ou seja, sem contato com a sociedade que os cerca. Estes são um dos poucos povos livres do Brasil e do mundo e estão ameaçados pelos madeireiros que exploram a T.I. Araribóia.

Madeireiros ameaçam índios sem contato

A T.I. Araribóia, juntamente com as T.I.s Caru e Alto Turiaçu, representa o que sobrou de floresta no Maranhão e é habitat natural dos Awá Guajá. Cobiçada por madeireiros, fazendeiros e caçadores, está sofrendo, desde a década de 80, um processo acelerado de pilhagem. Muitas pessoas não acreditavam na existência de povos livres naquela região. Porém, vez por outra, relatos de indígenas e moradores dos povoados vizinhos da terra confirmavam as suspeitas. Nos últimos três anos, a ação dos madeireiros tem se intensificado, o cerco de destruição foi se fechando cada vez mais e os relatos da presença dos Awa Guaja foram ficando mais freqüentes.

Em 2004, um Awá Guajá foi encontrado morto na mata da T. I. Araribóia. Pelas circunstâncias da morte, tudo leva a crer que ele estava procurando uma lagoa, mas morreu de sede antes de chegar ao seu destino. Isto porque, as lagoas que eram perenes agora, por conseqüências do desmatamento, começam a secar durante o período em que não chove e a busca por água torna-se cada dia mais difícil.

Em 2005, vários relatos de encontros de indígenas Guajajara com os Awá Guajá foram registrados. O mais expressivo deles se deu em meados de maio, quando os Guajajara avistaram na mata um grupo com cerca de 15 Awá Guajá,
entre elas crianças e idosos. Assustados, os Awa fugiram e deixaram para trás arcos, flechas, cabaças, tipóias, redes, etc. Os Guajajara recolheram esse material e levaram para aldeia como prova da existência dos Awá Guajá naquela região. Imagina-se que eles estão encurralados pela ação dos madeireiros e se aproximam cada vez mais, devido à diminuição da mata e à necessidade de água.

Outro fator que confirma a presença dos Awá Guajá naquela região e sua opção "consciente" pelo isolamento é o fato de que, nas aldeias Guajajara da T.I. Araribóia, em especial no Zutiwa, vez por outra, alguns objetos, como facão e machado, esquecidos nos quintais e na roça somem, ficando apenas as marcas dos pés dos Awá Guajá. Também existe um grupo que vai escondido buscar água no reservatório da roça da aldeia Zutiwa, sem que nenhum gesto de aproximação com os Guajajara seja esboçado.

A situação de retirada de madeira é crítica. Há informações de pelo menos dois pontos de saída utilizados pelos madeireiros: um deles é pelo município de Bom Jesus das Selvas, por onde saem diariamente cerca de 30 caminhões carregados de madeira; o outro ponto de saída é pelo município de Buriticupu, por onde saem diariamente cerca de 20 caminhões madeireiros.

Estamos falando da vida de cerca de 60 pessoas, divididas em três grupos que perambulavam livremente pelas matas da T.I. Araribóia e que agora estão cercados pelos madeireiros e correndo sérios risco de morte. O que fazer para salvar a vida dos Awá Guajá? Vamos assistir mais uma vez ao massacre de mais um grupo indígena sem esboçarmos nenhuma reação? Como garantir a sobrevivência física e cultural deste povo? Eles têm direito a viver e a viver livremente na mata, sem contato com a sociedade envolvente.

Contato forçado com índios pode dizimá-los. Enquanto isso, temos percebido uma movimentação da Funai sobre a questão dos Awá Guajá da T. I. Araribóia. Segundo relato de Awá Guajá contatados na década de 80 e que vivem hoje na aldeia Awá, na T.I. Caru, e segundo algumas lideranças indígenas da aldeia Januária, da T.I. Pindaré, um posto
de atração foi montado na aldeia Juriti e uma equipe que está sendo treinada pela Funai se dirigirá para a T.I. Araribóia para fazer contato com os Awá Guajá. Ainda segundo essas lideranças, os Awá Guajá, depois do contato, serão divididos e transferidos para as aldeias indígenas Awa, Tiracambu e Juriti, na T.I. Caru, no noroeste do estado.

A esse propósito temos o dever de alertar os riscos de um contato forçado com povos indígenas livres. A história nos mostra que ele implica na morte de cerca de 40% de sua população num curto espaço de tempo. Os próprios Awá Guajá já foram vítimas desse processo. Com a intenção de salvar a existência física desse povo, a Funai realizou o primeiro contato com os Awá Guajá em 1973. De 56 pessoas contatadas, restaram somente 26 em fevereiro de 1980. Os motivos das mortes foram gripes, pneumonias e surtos de malária. O segundo grupo, 28 pessoas, também foi contatado no mesmo
ano. Logo depois do contato morreram seis pessoas. No ano seguinte, morreram mais quatro pessoas quando esses indígenas foram transferidos para a atual aldeia Awá. Dessa transferência participou o atual Presidente da Funai, Mércio Pereira Gomes. O terceiro grupo foi contatado em 1989: de 22 pessoas contatadas logo morreram seis, ficando apenas 15 (GOMES, Mércio. Relatório de Pesquisa, fevereiro de 1996). Em suma, de 106 pessoas contatadas, 43 morreram, ficando apenas 63 pessoas.

Acreditamos que os Awá Guajá da T.I. Araribóia optaram por viver livremente na mata, sem contato com a sociedade nacional. É preciso respeitar essa condição de vida e agir de forma a garantir sua presença na terra que eles ocupam há muito tempo, retirando os madeireiros e criando um plano de vigilância para essa área. Contatá-los e transferi-los para a
T.I. Caru é assumir o risco de cometer um genocídio. Quem pagará pela vida dos Awá Guajá que certamente morrerão no contato e durante a transferência? A vida deles está ameaçada não só pelos madeireiros, mas, agora, sobretudo por quem deveria defendê-la. Não se pode, pela inoperância dos órgãos federais em impedir o desmatamento desenfreado das matas da T. I. Araribóia, penalizar os Awá Guajá por quererem continuar a viver livres.

Pelo respeito à vida e a integridade física do povo Awá Guajá;

Pelo respeito à Constituição Federal;

Pelo respeito à Convenção 169 da OIT;

Pelo respeito ao meio ambiente;

Assinam esta nota:

Conselho Indigenista Missionário - CIMI

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB Regional N5

Comissão Pastoral da Terra – CPT

CARITAS

Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos

Associação de Saúde na Periferia – ASP

Pastorais Sociais

Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Maranhão

Mestrado em Saúde e Ambiente da Universidade Federal do Maranhão

Deputada Estadual Helena Barros Heluy

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