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Índia e petista, prefeita declara 'guerra' à União

Estado de S. Paulo-São Paulo-SP
18 de Jan de 2004

Flora Mota quer que demarcação exclua a sede, as vilas e as estradas de Uiramutã

Filiada ao PT e fluente na língua macuxi, que aprendeu com uma avó índia, a prefeita de Uiramutã, Flora Mota, de 31 anos, declarou guerra contra a proposta do governo federal de destinar 1,7 milhão de hectares para a reserva Raposa Serra do Sol. Para evitar que a reserva acabe engolindo o município, ela propõe que fiquem de fora da área homologada a sede, vilas, estradas e um trecho para expansão da cidade.

Uiramutã tem duas escolas, um banco postal e um posto de saúde. O Exército mantém um batalhão na sede, localizada a 3 quilômetros da fronteira com a República da Guiana (ex-Guiana Inglesa). "Eu não sou Heloísa Helena. Só não aceito que o Uiramutã acabe", diz Flora.

A prefeita encara com naturalidade a divergência com o governo. "As pessoas pensam como querem. Se o ministro da Justiça acha que tem de ser assim, porque recebe pressões internacionais, quem sou eu para mudar? O que eu quero é que a gente possa trabalhar", diz.

Ela defende um plebiscito para resolver a questão. As duas facções garantem ter maioria. A Funai diz que só 20% dos índios não querem a reserva. Os que se opõem à proposta do governo dizem o contrário. Vivem na área da Raposa Serra do Sol 15 mil índios e 700 brancos.

Mais pobre prefeitura do Estado, Uiramutã sobrevive com R$ 80 mil por mês, repassados pelo governo federal por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O número de funcionários chega a 130. O fim dos garimpos mecanizados, nos anos 90, tirou a principal fonte de renda dos moradores.

Flora reclama ter envelhecido dez anos desde que venceu a eleição em 2000, numa disputa com o agricultor João Tropeiro. Ela recebe R$ 1.640 mensais da prefeitura. Cada um dos nove vereadores ganha R$ 640. A prefeita reclama que o conflito dificulta a implantação de projetos e obras sociais. Precisa recorrer à Justiça para fazer qualquer trabalho. "A Constituição estabelece que um município é indissolúvel, mas há anos vivemos com essa dúvida. Isso deve ser decidido pelos índios."

Ex-capoeirista, compositora e jornalista formada pela Universidade Federal de Roraima, Flora diz que a riqueza mineral da região é a causa de tanto conflito. Acusa os padres de inviabilizar o funcionamento do município.

"Tudo começou nos anos 70, quando eles chegaram aqui. Contaram com o melhor cavalo na casa da gente e receberam aulas de macuxi", diz. "Ninguém é contra a homologação, mas é preciso ter integração. Um filho de branco e macuxi vai ter direito à terra?" (L.N.)

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