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Ibama demite diretor que recusou superfaturamento

JB, Pais, p.A6
24 de Abr de 2004

Ibama demite diretor que recusou superfaturamento
Exonerado apontou que governo economizaria fortuna em projeto florestal

Luiz Queiroz
BRASÍLIA - Por ter se recusado a aprovar um projeto de manejo florestal superfaturado na Região Amazônica, o diretor de Gestão Estratégica do Ibama, Leonardo Bezerra de Melo Tinoco, está sendo exonerado do cargo pelo presidente do instituto, Marcus Luiz Barroso Barros.
O diretor diz que foi comunicado de sua demissão na última segunda-feira e o ato ainda não foi publicado no Diário Oficial da União. Segundo ele, o presidente do órgão não explicou os motivos. Marcus Barros apenas alegou que o governo precisava do cargo e agradeceu o seu trabalho.
Funcionários do Ibama afirmam, entretanto, que Leonardo está sendo posto para fora do órgão porque contrariou os interesses do Conselho Nacional de Seringueiros (CNS). A organização formulou um projeto denominado Programa de Desenvolvimento Comunitário das Reservas Extrativistas, ao custo de R$ 32 milhões, a serem pagos pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A organização teve o apoio de engenheiros florestais, consultores do Centro Nacional de Populações Tradicionais (CNPT) do Ibama e da Secretaria de Coordenação da Amazônia, do Ministério do Meio Ambiente, para elaborar o projeto.
Por acharem que o custo do programa estava muito alto para a execução em 30 reservas extrativistas, os funcionários do Ibama decidiram elaborar uma planilha alternativa. Nunca o Ibama fez levantamento de preços, segundo explicou Leonardo. Este trabalho sempre esteve a cargo das organizações não-governamentais e de órgãos municipais de meio ambiente. Tinoco alega que essa era a primeira vez em que os funcionários do Ibama tentavam estabelecer um parâmetro de custos e acabaram esbarrando na proposta dos seringueiros.
O Jornal do Brasil teve acesso às duas planilhas que têm valores bem diferentes. Na que foi elaborada pelos seringueiros, consta, por exemplo, um custo de R$ 819 mil para a realização do manejo florestal na reserva extrativista de Cazumbá/Iracema, localizada no Acre.
Na planilha que o diretor Leonardo Tinoco apresentou, o valor do projeto nesta área cai para R$ 111 mil. Tinoco explicou que, mesmo que por ventura fossem computados custos adicionais não verificados preliminarmente na planilha dos funcionários do Ibama, o preço final projeto a ser pago pelo BNDES não chegaria a R$ 200 mil. Curiosamente, consta que o próprio banco atuou na elaboração da planilha dos seringueiros, porém não identificou os responsáveis pelas contas denunciadas como superfaturadas.
Leonardo Tinoco conta que foi obrigado pelo presidente do Ibama, Marcus Barros, a demitir por telefone dois funcionários que o ajudaram a elaborar a planilha paralela à que foi feita pelos seringueiros.
- Esse pessoal trabalhou comigo desde o primeiro dia em que entrei aqui. Não tinha sentido demiti-los. E eu ainda tive que fazer isso pelo telefone. Quer dizer, fui obrigado a fazer isso, não é do meu feitio - disse o diretor, que agora também está sendo exonerado.
O presidente do Ibama não foi localizado para comentar a denúncia do diretor de Gestão Estratégica, Leonardo Tinoco.
Obras superfaturadas

BRASÍLIA - A demissão do diretor de Gestão Estratégica do Ibama, Leonardo Tinoco, permitirá que o Conselho Nacional de Seringueiros (CNS) continue a superfaturar junto ao BNDES o valor dos projetos de manejo ambiental. Como até agora só o projeto Cazumbá/Iracema, no Acre, foi executado, os seringueiros poderão apresentar novas planilhas de custos ao banco com valores acima dos previstos que não serão contestados pelos funcionários, já exonerados.
Segundo informações obtidas pelo JB, os seringueiros estão sendo orientados pelo Centro Nacional de Populações Tradicionais, do Ibama, para conseguir recursos junto ao BNDES destinados ao programa ambiental. Quem comanda a operação é o diretor do CNPT, Atanagildo de Deus Matos, que, segundo funcionários do Ibama, é pessoa de confiança de Fábio Vaz de Lima, marido da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
Nem só os valores cobrados pelo manejo florestal foram contestados por funcionários do Ibama. O superfaturamento se torna mais evidente quando se verifica o preço cobrado pela construção dos Centros de Difusão de Conhecimento e Tecnologia. São pequenas casas de 90 m² que servirão para formação, capacitação e difusão tecnológica nas comunidades das áreas extrativistas. O custo orçado pelos seringueiros para cada centro, padronizado nos 30 projetos, varia de R$ 305 mil a R$ 908 mil, ou seja, trata-se do metro quadrado mais caro do país. Por esses valores daria para o Ibama comprar apartamentos de quatro quartos na área central de Brasília.

JB, 24/04/2004, p. A6

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