JB, Pais, p.A5
03 de Mai de 2004
Ibama dá outra versão para demissão de funcionário
Barros diz que não exonerou diretor por causa de veto a projeto superfaturado
Luiz Queiroz
BRASÍLIA - O presidente do Ibama, Marcus Luiz Barroso Barros, procurou o Jornal do Brasil e negou que tenha exonerado o diretor de Gestão Estratégica, Leonardo Bezerra de Melo Tinoco, por ele ter se recusado a aprovar um projeto de manejo florestal superfaturado. Em carta encaminhada ao jornal, Barros deu sua versão para a demissão de Tinoco, já efetivada no último dia 27. Porém colocou a conduta da instituição ainda mais sob suspeita, pela imprecisão de alguns fatos narrados em sua correspondência.
Nos dia 25 de abril, o JB publicou matéria na qual funcionários do Ibama denunciavam a exoneração de Tinoco pelo fato de ele ter questionado valores orçados para um projeto de manejo florestal de reservas extratistas, elaborado pelo Conselho Nacional de Seringueiros (CNS). O diretor de Gestão e Estratégia e outros dois funcionários demitidos anteriormente levantaram dúvidas sobre os preços estimados pela entidade para execução dos projetos, alegando que estavam superfaturados. O projeto, ainda em execução, teve um valor global de R$ 32 milhões estimado pelo CNS, e está sendo financiado pelo BNDES.
Em carta encaminhada ao JB , o presidente do Ibama alega que o projeto de manejo florestal está sendo auditado pelo Ibama desde 2002. Barros disse, entretanto, que exonerou Leonardo Tinoco porque ele contratou uma empresa de consultoria do concunhado para modernizar a administração do órgão. O valor deste contrato, que é financiado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), é de R$ 1,9 milhão e vem sendo pago em parcelas.
''Na verdade, a decisão administrativa de exonerar o diretor foi tomada em conseqüência da apuração de denúncia trazida à direção do Ibama no segundo semestre de 2003. A partir dessa denúncia, foi iniciado um processo de apuração, que concluiu pela existência de vínculos familiares entre esse diretor e a empresa contratada por programa de cooperação internacional dirigido por ele, fato reconhecido pelo próprio diretor na edição do dia 26 do JB'', disse o presidente do Ibama.
O diretor Leonardo Tinoco realmente confirmou que assinou, sem licitação, um contrato com a Stratégia Consultores, que teria o objetivo de elaborar um programa de reformulação administrativa do Ibama. A empresa tem sede no Rio Grande do Norte e pertence ao seu concunhado, Aristogiton Luiz Ludovice Moura. Mas Tinoco alegou que avisou ao Conselho de Gestão do Ibama, formado pela presidência e diretorias do órgão, sobre o vínculo familiar.
O presidente do Ibama, Marcus Barros, nega em sua carta que tivesse conhecimento do teor do contrato ou do vínculo familiar de Leonardo com Aristogiton:
''Ao contrário de declaração do diretor, o Conselho Gestor e a direção do Ibama jamais foram informados de detalhes que o envolviam com a empresa contratada. Tampouco existiu parecer jurídico favorável à referida contratação''.
O caso poderá ser investigado pela Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara dos Deputados, se for aprovado na próxima semana um requerimento de convocação de Tinoco e de Marcus Barros para uma audiência pública. O requerimento foi apresentado pelo deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB/PR).
Explicação revela contradições
BRASÍLIA - Ao questionar o conteúdo das matérias publicadas pelo JB nos dias 25 e 26, o presidente do Ibama, Marcus Luiz Barroso Barros, caiu em contradições entre o que afirma ser a verdade e os fatos denunciados pelo seu ex-diretor de Gestão Estratégica, Leonardo Tinoco.
Na carta que enviou ao jornal, Barros alega que o projeto florestal, elaborado pelo Conselho Nacional de Seringueiros (CNS), está sendo auditado desde 2002 pelo órgão. No entanto, funcionários do Ibama contestam a informação e afirmam que na realidade o que está em andamento é uma auditoria para investigar um desvio de R$ 1,5 milhão em recursos do Banco Mundial e da Comunidade Européia para ser aplicado em quatro reservas extrativistas do Acre, Amapá e Rondônia.
O desvio teria sido feito pelo chefe do Centro Nacional de Populações Tradicionais (CNPT), Atanagildo de Deus Matos, que já responde a processo administrativo. O referido funcionário, segundo servidores do órgão, ajudou o Conselho dos Seringueiros a elaborar o projeto superfaturado, que Barros afirma estar sob investigação.
Outra contradição do presidente do Ibama é com relação a sua participação no processo de contratação da consultoria do concunhado do diretor Leonardo Tinoco. Marcus Luiz Barroso Barros afirma que a direção do Ibama não tinha conhecimento do vínculo familiar e que a Procuradoria Geral do órgão não elaborou parecer jurídico favorável à contratação. No entanto, os atos regimentais do Ibama determinam que as decisões administrativas passem pelo Conselho Gestor, que é formado justamente pelo presidente e os demais diretores. Neste caso, Leonardo Tinoco não tinha como aprovar sozinho a contratação da Stratégia Consultores, do seu concunhado Aristogiton Luiz Ludovice de Moura.
Outro fato que pesa contra o presidente do Ibama é quanto as datas que ele diz que o órgão começou a investigar a fraude na contratação da consultoria. Se a investigação começou a ocorrer ''a partir do segundo semestre de 2003'', e depois desse período a empresa começou a ser malvista pela cúpula do Ibama, Barros deveria explicar o porquê de ele e outros diretores terem se hospedado num hotel fazenda próximo a Brasília com a direção da Stratégia Consultores.
O JB teve acesso à cópia de uma lista de presença para o seminário ''Oficina sobre Planejamento Estratégico Situacional Dirigido ao Conselho Gestor do Ibama'', que foi realizado entre os dias 11 e 12 de dezembro do ano passado, no Hotel Fazenda Retiro das Pedras. Nela constam as presenças do presidente do Ibama, bem como a dos diretores de Licenciamento, Nilvo Luiz Alves da Silva; de Florestas, Antonio Carlos Hummel e até mesmo do diretor de Gestão e Qualidade, Leonardo Tinoco, aquele que já deveria estar sendo investigado pela auditoria interna do órgão. Pelo lado da empresa estava presente o concunhado de Tinoco: Aristogiton Moura. (L.Q.)
JB, 03/05/2004, p. A5
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