VOLTAR

Hutukara contesta declarações do governo sobre Censo Escolar

Folha de Boa Vista - http://www.folhabv.com.br/
18 de Jul de 2010

Hutukara contesta declarações do governo sobre Censo Escolar

A Hutukara Associação Yanomami (HAY) e o Instituto Socioambiental (ISA) contestam declarações da Secretaria Estadual de Educação (SECD) sobre a exclusão das escolas Yanomami no Censo Escolar 2009, o que acarretou a falta de merenda e material escolar nas referidas instituições.

Segundo declarações da gerente de Avaliação e Estatística da SECD, Selma Mariot, em matéria publicada na Folha, no dia 16, até 2006 a metodologia do censo era feita por declaração, mas a partir de 2007 foram acrescentados os dados individualizados de alunos e de docentes. Por conta disso, até 2006 o censo tinha 28 escolas e em 2009 apenas oito delas foram declaradas no censo escolar.

Ainda na matéria, Mariot explicou que "não havia coerência e comparabilidade nos dados dos alunos informados e em algumas escolas constava apenas o primeiro nome do aluno, em outras, a idade não batia". A gerente afirmou ainda que, em relação às escolas Yanomami, somente foram verificadas as que têm acesso terrestre.

A coordenadora do Programa de Educação Yanomani, atuando há 12 anos na função, Lídia Montanha, esclareceu que as escolas Yanomami estão cadastradas no Censo Escolar do Inep/MEC desde 2003. Desde então os professores Yanomami, junto com as organizações de apoio, vêm colaborando com a coleta de dados para o Departamento de Estatística da SECD/RR. Ao contrário do que afirma a gerente, os professores Yanomami informaram à Divisão de Educação Indígena e a Gerência de Estatística da SEDC o movimento final de 2008 e a matrícula inicial de 2009.

A coordenadora afirmou que, em 2009, o ISA enviou para a Gerência de Estatística da SEDC informações georreferenciadas e o mapeamento de sete regiões da terra Yanomami em que as escolas assessoradas pedagogicamente pelo ISA estão localizadas (Demini, Kayanau, Alto Catrimani, Paapiu, Parawau, Toototopi e Awaris), além de tabelas com tempo de voo para as novas escolas criadas pelo Estado de Roraima.

"Estas informações visavam subsidiar a Gerência de Estatística da SECD na realização do Censo Escolar in loco nas comunidades Yanomami. Ação esta que não foi realizada pela secretaria. Além da não realização do censo nas escolas, a gerência de estatística utilizou-se dos dados georreferenciados para justificar a extinção de dez escolas Yanomami no Estado do Amazonas, sem levar em consideração o vínculo que estas mantinham com a SEDC/RR desde 2003, quando foram cadastradas no Censo Escolar INEP/MEC", enfatizou Lídia.

O tesoureiro da Hutukara, Dário Vitório Xiriana, esclareceu que a Secretaria Estadual de Educação vem recebendo recursos do Fundeb destinados às escolas Yanomami desde 2004. "O que nos dá a entender que cabe a esta secretaria a responsabilidade legal por estas escolas e seus mais de 700 alunos Yanomami, que não podem depender de fronteiras estaduais para serem adequadamente atendidas", disse.

Dário frisou ainda que, apesar da revogação do decreto n 10.236, de 30 de julho de 2009, pelo próprio governo do estado, o que deveria garantir a continuidade do atendimento, a SECD não reconduziu as escolas outrora extintas ao Censo do Inep/MEC 2009, acarretando em falta de recursos para a gestão destas dez escolas.

Ele ressaltou que, segundo o memorando-circular 01/2009 da SEDC, é atribuição da gerência de avaliação e informações educacionais da secretaria coordenar o Censo Escolar e elaborar um plano de trabalho, além de realizar o Censo Escolar de Educação Básica 2009 nas escolas da rede estadual de ensino sem acesso à internet, através de verificação in loco, e fazer a crítica, digitar, verificar a consistência das informações coletadas, promovendo as correções necessárias junto às escolas responsáveis pelas informações.

Dário ressaltou que, no caso das escolas Yanomami, o preenchimento do sistema Educa Censo não foi realizado por conta da falta de acesso à internet nas escolas. Entretanto, cientes da importância destes dados, os formulários do Censo Escolar de 2009 foram preenchidos manualmente, como apresenta o ofício ISA 29/2009 e seus respectivos anexos. Em seguida o setor de Estatística da SEDC/RR solicitou complementação referente a sobrenomes e datas de nascimento dos alunos.

"Cabe esclarecer que, no sistema cultural Yanomami, assim como de outros grupos indígenas da Amazônia brasileira, não é comum e nem parte de suas tradições denominarem indivíduos com sobrenomes. Apesar disto, os professores promoveram discussões com suas comunidades e chegaram a um consenso de utilizar a terminologia de filiação linguística (Yanomae, Sanuma, Yanomama, Yanomami, Xirixana, Xiriana) como sobrenome para os alunos", disse Dário.

Além disso, a Hutukara e o ISA buscaram junto ao censo populacional da Funasa dados relativos à data de nascimento dos alunos. "Isso culminou com uma sólida base de dados reenviados ao setor de estatística da SECD através do ofício ISA 054/2009. Este ofício foi entregue no dia 21 de outubro de 2009 para a Divisão de Educação Indígena com cópias para a Divisão de Estatística e Departamento de Desenvolvimento de Políticas Educacionais da SEDC/RR, dentro do prazo estabelecido pela portaria n 919, de 22 de setembro de 2009, publicada no DOU", afirmou.

Apesar de todo esforço e empenho investido por parte dos professores Yanomami e suas respectivas comunidades na produção do Censo Escolar de 2009, Dário afirmou que 17 escolas foram paralisadas no Censo Escolar de 2009 e os alunos Yanomami foram excluídos do sistema nacional de ensino, uma vez que não constam mais nos bancos de dados do Inep.

"Com estes dados, fica evidente o esforço dos Yanomami e das organizações de apoio em buscar meios de diálogo com o sistema estadual e nacional de ensino. Entendemos que o Estado de Roraima não tem cumprido com suas obrigações legais de garantir o acesso e a universalização da educação ao povo Yanomami", enfatizou Dário.

Ele disse ainda que a SECD/RR deve levar em consideração que a educação escolar entre os Yanomami fundamenta-se dentro de um arcabouço legal que garante aos povos indígenas do Brasil uma educação diferenciada, específica, comunitária, multilíngue. "Todas as questões acima citadas convergem no fato de que o Estado de Roraima e sua Secretaria de Educação não reconhecem estes direitos dos povos indígenas", frisou o tesoureiro da Hutukara.

SECD - A Folha tentou entrar em contanto por telefone no final de semana com a secretária estadual de Educação, Hilma Xaud, e sua assessoria, mas não obteve sucesso.

Folha de Boa Vista, 18/07/2010

http://www.folhabv.com.br/noticia.php?id=90726

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.