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História do Brasil Indígena - IV

Dourados Agora - www.douradosagora.com.br
Autor: Wilson Matos da Silva*
18 de Nov de 2008

Por que nossos povos que habitavam as Américas foram chamados de índios pelos colonizadores europeus? Denominação genérica, provocada pela primeira impressão que tiveram imaginando estarem chegado às Índias.

Mesmo depois de descobrir que não estavam na Ásia, e sim em um continente até então desconhecido, os europeus continuaram a chamar os membros de nossos povos de índio, ignorando propositalmente as diferenças lingüístico-culturais (coisa de Português). Era cômodo tornar os antepassados nativos todos iguais, tratá-los de forma homogênea, já que o objetivo era um só: o domínio político, econômico e religioso!

No Período Colonial foi assim, ao longo dos tempos, definir quem era índio ou não constituiu sempre uma questão legal. Desde a independência em relação às metrópoles européias, vários países americanos estabeleceram diferentes legislações em relação aos povos indígenas e foram criadas instituições oficiais para cuidar dos assuntos relacionados aos nossos povos.

Nas últimas décadas, o critério da auto-identificação étnica vem sendo o mais amplamente aceito pelos estudiosos da temática indígena. Na década de 50, o antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro baseou-se na definição elaborada pelos participantes do II Congresso Indigenista Interamericano, no Peru, em 1949, para assim definir, no texto "Culturas e línguas indígenas do Brasil", o indígena como: índio é todo o indivíduo reconhecido como membro por uma comunidade pré-colombiana que se identifica etnicamente diversa da nacional e é considerada indígena pela população brasileira com quem está em contato". Uma definição muito semelhante foi adotada pelo Estatuto do Índio (Lei no. 6.001, de 19.12.1973), que norteou as relações do Estado brasileiro com as populações indígenas até a promulgação da Constituição de 1988.

Em suma, um grupo de pessoas pode ser considerado indígena ou não se estas pessoas se considerarem indígenas, ou se assim forem consideradas pela população que as cerca. Mesmo sendo o critério mais utilizado, ele tem sido colocado em discussão, já que muitas vezes são interesses de ordem política que levam à adoção de tal definição, da mesma forma que acontecia há 500 anos.

Identidade e diversidade

As populações indígenas são vistas pela sociedade brasileira ora de forma preconceituosa, ora de forma idealizada. O preconceito parte, quase sem sempre, daqueles que convivem diretamente com os índios.

A política, ideológica e economicamente dominadas por elites municipais com fortes interesses nos nossos territórios indígenas e em nossos recursos ambientais, tais como madeira e minérios, muitas vezes as populações rurais necessitam disputar as escassas oportunidades de sobrevivência em sua região com membros de nossos povos indígenas que aí vivem. Por isso, utilizam estereótipos, rotulando-nos de "ladrões", "traiçoeiros", "preguiçosos" e "beberrões", enfim, de tudo que possa desqualificá-los. Procuram justificar, desta forma, todo tipo de ação contra os nossos povos e a invasão de nossos territórios.

Já a população urbana, aquelas que vivem mais distanciada das áreas indígenas, tende a ter de nós uma imagem "favorável", embora nos veja como algo muito remoto. Nós, índios, somos considerados a partir de um conjunto de imagens e crenças amplamente disseminadas pelo senso comum: eles são os "donos da terra" e seus primeiros habitantes, aqueles que sabem conviver com a natureza sem depredá-la. Somos também vistos como parte do passado e, portanto, como o que está em processo de desaparecimento, muito embora, como provam os dados, nas três últimas décadas tenha se constatado o crescimento da nossa população indígena. Só recentemente os diferentes segmentos da sociedade brasileira estão se conscientizando de que nós os índios somos seus contemporâneos.

Elaboramos e constituímos um universo completo de conhecimentos integrados, com fortes ligações com o meio em que nós vivemos e se desenvolvemos. Entendendo cultura como o conjunto de respostas que uma determinada sociedade humana dá às nossas experiências por nós vividas e aos desafios que enfrentamos ao longo do tempo, percebe-se o quanto as nossas diferentes culturas são dinâmicas e estão em contínuo processo de transformação.

O Brasil possui uma imensa diversidade étnica e lingüística, estando entre as maiores do mundo. São 215 sociedades indígenas, mais cerca de 55 grupos de índios isolados, sobre os quais ainda não há informações objetivas. 180 línguas, pelo menos, são faladas pelos membros destas sociedades, as quais pertencem a mais de 30 famílias lingüísticas diferentes. (Fonte: FUNAI).

No entanto, é importante frisar que as variadas culturas dos povos indígenas modificam-se constantemente e reelaboram-se com o passar do tempo, como a cultura de qualquer outra sociedade humana. A diversidade cultural pode ser enfocada tanto sob o ponto de vista das diferenças existentes entre os nossos povos indígenas e os não-indígenas, quanto sob o ponto de vista das diferenças entre os muitos povos indígenas que vivem em nosso país.

É necessário reconhecer e valorizar a identidade étnica específica de cada um dos povos indígenas em particular, compreender suas línguas e suas formas tradicionais de organização social, de ocupação da terra e de uso dos recursos naturais. Isto significa o respeito pelos direitos coletivos especiais de cada uma delas e a busca do convívio pacífico, por meio de um intercâmbio cultural, com os diferentes povos.

*Índio residente na Aldeia Jaguapirú, advogado, presidente da CEAI/OABMS (Comissão Especial de Assuntos Indígenas da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de MS); E-mail:wilsonmatos@pop.com.br

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