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Greve de fome de bispo leva Lula a procurar Frei Betto

O Globo, O Pais, p.11
05 de Out de 2005

Greve de fome de bispo leva Lula a procurar Frei Betto
Letícia Lins*, Cristiane Jungblut e Gerson Camarotti
Enviada especial*
Preocupado com a greve de fome do bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, que é contra o projeto de transposição das águas do Rio São Francisco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ajuda até a seu ex-assessor especial Frei Betto, ligado à Igreja Católica, para conversar com dom Luiz. Lula determinou também o deslocamento de uma ambulância de Petrolina até Cabrobó para dar assistência médica ao bispo.
O receio do Planalto é com o desfecho da greve de fome, uma vez que o bispo disse que está disposto a levar o protesto às últimas conseqüências. A atitude do bispo e as manifestações de apoio a seu protesto foram discutidas ontem na reunião de coordenação. A avaliação é que dom Luiz dá sinais de que está aberto ao diálogo.
Dom Luiz, sem comer há dez dias, ainda encontrou forças ontem para celebrar uma missa de quase três horas para cerca de 3 mil fiéis, muitos deles romeiros de cidades do Nordeste, que foram a Pernambuco para se solidarizar com seu protesto.
— Tenho muito amor à vida. Não quero morrer. Quero viver. Vamos lutar pela vida do São Francisco e por esse pobre servo de Deus — disse o bispo.
Ele estava sereno, com as faces rosadas e sem demonstrar inquietação pela greve de fome. A cerimônia religiosa foi realizada no dia do aniversário de 59 anos do bispo, que recebeu solidariedade até de tribos indígenas.
Ele só bebe água e dorme numa capelinha de chão de cimento batido, com telhas aparentes e apenas duas portas e duas janelas. Ontem ele acordou cedo, fez uma pequena caminhada até o rio onde tem se banhado e depois sentou-se na capela, distribuindo bênçãos aos fiéis por mais de quatro horas. Paciente, abraçava crianças, recebia beijos nas mãos, abraços e carinhos. No pátio externo, índios erguiam seus instrumentos de percussão e dançavam o toré, ritual sagrado para dar força ao espírito dos mais necessitados.
O presidente da Comissão Pastoral da Terra, dom Tomás Balduíno, participou da celebração e disse que o presidente Lula será responsabilizado se dom Luiz morrer. Ele comparou a campanha do religioso brasileiro à de Gandhi, que libertou a Índia da colonização inglesa. Dom Tomás disse que a obra é faraônica, inadequada e destinada a reforçar o caixa dois das campanhas políticas.
Em Brasília, Lula acompanhou da rampa do Palácio do Planalto uma manifestação contra o projeto, e foi evasivo ao tratar da situação do bispo de Barra. Limitou-se a abrir os braços quando perguntado se a carta que mandou era suficiente. O Palácio do Planalto recebeu ontem recado informal de enviados da Nunciatura Apostólica em Brasília, de que a greve de fome de dom Luiz Flávio Cappio não tem o aval do Vaticano.

O Globo, 05/10/2005, p. 11

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