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Governo quer vender peixes em extincao

FSP, Ciencia, p.A15
28 de Mai de 2004

AMBIENTEPara especialistas, projeto de R$ 2 mi da Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca pode estimular pesca predatóriaGoverno quer vender peixes em extinção
TIAGO ORNAGHIJAIRO MARQUESDA AGÊNCIA FOLHA
O governo federal, por meio da Seap (Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca), está lançando uma campanha para estimular a exportação de peixes nativos, alguns deles ameaçados de extinção, para os mercados europeu e norte-americano. O projeto tem orçamento de R$ 2 milhões e, de acordo com especialistas, pode estimular a pesca predatória.Com ele, o governo espera gerar 3.500 empregos e incrementar as exportações em US$ 50 milhões até o final de 2005.O ministro José Fritsch visitou países da Europa onde promoveu sessões de degustação de peixes, entre eles alguns listados pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) como ameaçados de extinção. A Seap não considera que os peixes, que devem ser exportados, estejam sob ameaça, uma vez que podem ser criados em laboratório.Entre os peixes, estão o pirarucu, que chega a 3 m e pesa mais de 150 kg, o tambaqui e o pacu. "Para o pirarucu não existe uma tecnologia totalmente dominada [para criação em cativeiro]", diz Laerte Batista de Oliveira Alves, coordenador do Cepta (Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros Continentais) do Ibama.O mesmo é expresso pelo professor Francisco Manoel de Souza Braga, do Instituto de Biociência da Unesp de Rio Claro."Temos tecnologia para desenvolver pacu e tambaqui em cativeiro. Mas desconheço uma piscicultura que domine a técnica de produção para o pirarucu. Para conseguir a criação em cativeiro, o peixe sairia a preço de ouro, mais caro que caviar. A extração dele é realmente na natureza. Estimular isso é muito delicado."ONGs ligadas à preservação ambiental e especialistas apontam que, sem uma rígida fiscalização, poderá haver aumento de risco para as espécies."O governo precisa tomar muito cuidado com isso [o estímulo à exportação], ou vai acontecer o que aconteceu com os jacarés do Pantanal: para poder comercializar o couro, abriam-se criadouros de fachada e comercializavam-se, na verdade, animais que estavam na natureza", disse Braga, que teme que a fiscalização não seja eficiente. "Hoje, não vejo como os fiscais dariam conta da demanda. Falar que criações serão fiscalizadas é uma coisa, botar em prática é outra bem diferente."Para Celso Russo, técnico da Ecoa-Ecologia em Ação, ONG socioambiental, o perigo do projeto "é estimular a captura das espécies, principalmente o pirarucu".O consultor André Macedo Brugger, da Fishtec Consultores Associados, alertou para a necessidade do controle de origem dos peixes que serão comercializados."Não há problema, desde que haja rigor na certificação da origem do peixe. Senão isso pode estimular a captura predatória pelos ribeirinhos, algo desastroso."Variabilidade genética Considerar que é possível garantir que uma espécie não corre risco de extinção porque existem criações em cativeiro é temerário, segundo o Ibama. "Algo que não ocorre na criação em cativeiro é a variação genética. Uma espécie cultivada acaba sem ter estudos de variabilidade genética. Os animais podem ter origem em apenas um produtor", afirma Alves.

OUTRO LADO Seap nega que espécies estejam ameaçadas
DA AGÊNCIA FOLHA Por meio do coordenador-geral de Aqüicultura Continental, Marcelo Barbosa, a Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca defendeu o estímulo às exportações de peixes nativos, refutou a possibilidade de degradação do ambiente e negou que haja processo de extinção de algumas espécies que serão comercializadas.De acordo com Barbosa, apenas o peixe criado em cativeiro será exportado, com, segundo diz, "rígido controle de certificação de origem"."É preciso ficar claro que esse projeto visa estimular a aqüicultura e não a pesca predatória. Os países importadores solicitam a rastreabilidade do produto. Não é possível botar o peixe lá fora sem a certificação de origem. A atividade será fiscalizada pelo Ibama, que tem a atribuição para isso", afirmou Barbosa. "Queremos fazer o desenvolvimento da pesca no país calcado na sustentabilidade ambiental, social e econômica", disse.Para o coordenador-geral, o tambaqui, o pacu e o pirarucu não estão ameaçados de extinção."Nenhum dos peixes que estamos querendo vender lá fora está ameaçado de extinção. É um contra-senso dizer isso. O tambaqui, o pirarucu e o pacu são largamente produzidos no país", disse Barbosa."Se nós temos laboratórios que conseguem produzir alevinos ["filhotes" de peixe] dessas espécies, como se pode dizer que eles estão em extinção?", declarou.

FSP, 28/05/2004, p. A15

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