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Governo nao quer perder controle do Orcamento

OESP, Nacional, p.A6
04 de Jan de 2004

Governo não quer perder controle do Orçamento Projeto que obriga Executivo a gastar o que Congresso aprovar será torpedeado
SÉRGIO GOBETTI e EUGÊNIA LOPES
BRASÍLIA - O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai fazer de tudo para evitar a aprovação do projeto que torna o Orçamento da União uma lei "impositiva", obrigando o Executivo a realizar as despesas aprovadas pelo Congresso. A execução orçamentária do primeiro ano de mandato é uma prova de que os petistas querem liberdade: foram liquidados 72,3% dos investimentos e gastos de custeio autorizados, ante 84% do último ano do governo FHC.
Os líderes governistas passaram o ano tentando justificar por antecipação esse resultado, alegando que herdaram um Orçamento feito pelo antecessor.
Mas até mesmo o Ministério da Segurança Alimentar, carro-chefe da política social do presidente Lula e poupado dos cortes do ajuste fiscal, acabou o ano tendo executado apenas 52,8% de seu Orçamento de R$ 1,7 bilhão.
O tipo de gasto mais sacrificado em 2003 foram os investimentos, reduzidos a um terço do programado devido ao aperto fiscal. Para 2004, o governo promete que o Orçamento deixará de ser uma "peça de ficção" e "à prova de cortes".
Entretanto, as medidas propostas pelo Congresso para tentar impor uma execução mais próxima da realidade têm sido sistematicamente combatidas pelo Planalto.
"O governo quer manter o Orçamento do jeito que está porque ele lhe dá uma margem de manobra muito grande", afirma o senador Jefferson Perez (PDT-AM).
"É a principal arma do Executivo para conseguir adesões e convencer os parlamentares a votar a seu favor."
Atualmente, o Orçamento da União, assim como o dos Estados e municípios, é meramente "autorizativo". Prevê, por exemplo, despesas para cobrir emendas de parlamentares, mas estas não precisam ser obrigatoriamente executadas. Um dos argumentos utilizados é que a execução dos investimentos previstos dependem da confirmação das receitas e do comportamento de outras despesas obrigatórias, como gastos com pessoal e benefícios do INSS.
Nos últimos anos, o Congresso tem acertado nas suas previsões de receitas, mas não nas despesas obrigatórias, o que leva o governo a realizar o chamado "contingenciamento". Na prática, porém, a equipe econômica usa esse mecanismo para represar além do necessário e acentuar o peso do ajuste.
Paliativo - Para contornar o problema, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara chegou a apreciar em dezembro uma emenda constitucional obrigando o governo a pelo menos informar previamente ao Congresso sobre os contingenciamentos. Nem esse paliativo foi aceito pelo governo, que mobilizou a bancada do PT contra a proposta."Fiquei meio espantado com a articulação aberta da Casa Civil contra a emenda", afirma o deputado Sérgio Miranda (PC do B-MG), da base governista. Segundo ele, a emenda em discussão na CCJ ficou "bastante light", mas o governo não está disposto a aceitar "qualquer medida que limite a ação do Poder Executivo".
No Senado, os governistas também atuaram mas não impediram que a CCJ aprovasse em dezembro uma emenda do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA), tornando obrigatória a execução das despesas previstas na lei orçamentária. "O governo fez manobras protelatórias e tentou impedir a aprovação do Orçamento impositivo, mas o ACM reagiu duramente e a proposta acabou sendo aprovada", conta Perez.
Apesar de ter sido aprovado na CCJ do Senado, o texto ainda precisa ser votado no plenário e seguir para a Câmara, onde tem poucas chances de prosperar. De acordo com o deputado Paulo Bernardo (PT-PR), vice-líder do PT, a tese do Orçamento impositivo é correta, mas necessita de tempo para ser implementada, o que não poderia ocorrer antes de 2008.
"Qualquer que seja o próximo governo, a medida só pode valer para o segundo ano de mandato. O que não é viável é aprovar o Orçamento impositivo neste ano e implantá-lo no ano que vem", afirma o petista. Segundo ele, a mudança deveria alcançar também Estados e municípios e ser acompanhada de novas regras para as emendas de parlamentares.
Na oposição, o senador Sérgio Guerra (PSDB-PE) concorda que a discussão é mais ampla do que a criação de regras "impositivas" para o Orçamento, mas defende que o Congresso inicie já o processo. "O governo não vai concordar com o Orçamento impositivo porque reduz seu arbítrio e poder. O Orçamento impositivo tem de ser uma conquista do Congresso."

Pasta de Ciro só gastou 8,7% da verba prevista Ajuste fiscal manteve 90% do orçamento da Integração Nacional bloqueado até dezembro
O Ministério da Integração Nacional, comandado por Ciro Gomes, terminou 2003 com o menor nível de execução orçamentária da Esplanada: 8,7%. Dos R$ 2 bilhões das chamadas "despesas discricionárias" aprovadas pelo Congresso para a pasta do cearense, apenas R$ 177 milhões foram liquidados até o dia 31 de dezembro, conforme relatório do Ministério do Planejamento.
O baixo desempenho do ministério se deve ao ajuste fiscal, que manteve 90% do Orçamento de Ciro bloqueado até dezembro. Nas últimas duas semanas do ano, por pressão dos parlamentares que exigiam o atendimento de suas emendas, a equipe econômica chegou a liberar mais R$ 250 milhões para a Integração, mas as despesas só foram empenhadas, não liquidadas.
O Ministério das Cidades, do gaúcho Olívio Dutra, é outro que estava sob forte contingenciamento e recebeu uma liberação extra de R$ 338 milhões no fim do ano, mas só teve tempo de empenhar os recursos. Acabou 2003 com o segundo menor nível de execução orçamentária (14,4%) e com mais de R$ 400 milhões de restos a pagar - despesas empenhadas e não liquidadas nem pagas.
A pasta dos Transportes também acabou o ano executando apenas 28% de seu Orçamento e com mais de R$ 900 milhões de despesas empenhadas e não liquidadas. Do conjunto, os dados indicam que o Executivo estourou em R$ 2,2 bilhões o limite de restos a pagar que ele havia fixado no dia 26 de novembro.
Pelo decreto 4.900, os ministérios poderiam deixar no máximo R$ 3,2 bilhões para serem pagos em 2004, mas acabaram acumulando R$ 5,5 bilhões. (Sérgio Gobetti e Eugênia Lopes)

OESP, 04/01/2004, p. A6

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