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Governo mantera ministros no Para, diz Felix

FSP, Brasil, p.A13
03 de Mar de 2005

Operação Pacificação", integrada dos governos federal e estadual, teve primeira ação ontem com barreiras em estradas
Governo manterá ministros no Pará, diz Félix
Maurício Simionato
Da agência Folha, em Altamira
O ministro-chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) da Presidência da República, general Jorge Armando Félix, disse, em Altamira (PA), que o governo manterá ministros despachando no Estado durante a "Operação Pacificação", ação integrada iniciada ontem com barreiras em estradas feitas pelas polícias Federal e Rodoviária Federal.
O general participou de uma reunião no quartel do Exército em Altamira para definir as primeiras ações integradas dos governos federal e estadual no Pará. Em seguida, viajou de helicóptero para Anapu e Medicilândia, no Estado. "A idéia é manter permanentemente um ministro na região despachando aqui para caracterizar a importância da operação", disse.
As ações são coordenadas pelo general com os ministérios da Justiça, do Planejamento, do Meio Ambiente, do Desenvolvimento Agrário, da Integração Nacional, da Defesa e do Trabalho, além de Incra, Ibama e Secretaria de Comunicação do Governo, em parceria com o governo estadual.
"A idéia é desencadear o que está planejado e cumprir uma série de mandatos de reintegração de posse e regularizar áreas", disse.
Félix afirmou que as operações no Estado "não podem" ser interrompidas e que, a partir da semana que vem, o governo federal liberará recursos para o andamento das ações. Ele não informou o valor dos recursos. "O que os governos federal e estadual pretendem é que suas estruturas se instalem na área. A verdade é que, ao longo do tempo, os governos têm ficado ausentes aqui. Agora não pode haver interrupção."
Cerca de 2.000 homens do Exército estão presentes em 18 cidades do oeste do Pará. O Exército também instalou na semana passada um disque-denúncia na região.
Segundo o general, essas ações "já estavam sendo planejadas há dois anos". "Simplesmente algumas [ações] foram aceleradas."
Félix disse que o governo está preparado para possíveis reações de madeireiros e de fazendeiros em razão das ações, que também abrangem a fiscalização da extração e do transporte ilegal de madeira. Segundo ele, a determinação da União é instalar suas estruturas definitivamente na região.
O governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), disse que as ações desenvolvidas pelos governos federal e estadual "constituem um avanço" para enfrentar os bolsões de conflito. Para ele, um dos primeiros desdobramentos da integração será a formação de cadastro único das terras no Pará. "Espero a pronta colaboração do governo federal no sentido da implementação do plano de zoneamento ecológico-econômico."

Presos dizem ter recebido proposta para isentar Tato
Dois dos indiciados pela morte da missionária Dorothy Stang declararam ontem à Polícia Federal em Altamira (PA) que receberam uma proposta de R$ 10 mil cada um, dentro da penitenciária onde estão presos, para retirar as acusações contra Amair Feijoli da Cunha, o Tato, indiciado por co-autoria no assassinato.
Rayfran das Neves Sales, o Fogoió, e Clodoaldo Carlos Batista, o Eduardo, disseram ao delegado Ualame Machado que um outro preso os procurou na cela e ofereceu a eles dinheiro para que os dois "livrassem a cara de Tato" no inquérito que apura o crime.
Culpa
O delegado gravou o depoimento dos dois presos, que será acrescentado nos autos complementares instaurados sobre o caso -o inquérito foi encerrado na última segunda-feira. "O depoimento deles confirma que o Tato tem realmente culpa no crime", disse o delegado.
O advogado Oscar Damasceno, que defende Tato, disse que seu cliente é inocente e que não precisa oferecer dinheiro em troca da retirada das acusações contra ele.
Fogoió, Eduardo e Tato foram transferidos ontem de Altamira para o Centro de Recuperação de Americano (PA), de segurança máxima. (MAURÍCIO SIMIONATO)

Fazendeiro diz que suposto mandante do crime esteve em sua propriedade
O fazendeiro de Altamira (PA) Laudelino Délio Fernandes Neto admitiu ontem em depoimento, segundo a Polícia Civil, que Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida -indiciado como mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang-, esteve em sua fazenda em Anapu após o crime, de onde fez um telefonema.
Délio, como o fazendeiro é conhecido, disse que Bida foi até sua fazenda em sua camionete na madrugada de segunda-feira (o crime ocorreu no sábado, dia 12), fez um telefonema e foi apanhado por outra camionete, às 10h.
Ele responde a processo por fraudes na extinta Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia). Délio foi citado anteontem no depoimento de Rayfran das Neves Sales, 27, o Fogoió, que confessou ter atirado na freira. Segundo Fogoió, Bida teria dito que usaria um avião de Délio para fugir após o crime. Délio nega e diz ser proprietário de dois lotes na gleba Bacajá, a mesma onde Dorothy foi assassinada.
O fazendeiro diz que conhece Bida e que era "amigo" de irmã Dorothy. Também diz ser "católico apostólico romano". "Até apoiei o Chiquinho do PT [amigo da irmã e ex-candidato a prefeito de Anapu] nas últimas eleições. Fiquei horrorizado com a morte."
Délio também disse que as acusações de desvio de verbas na Sudam "são políticas". Ele recebeu R$ 4,6 milhões da extinta Sudam.
Fogoió e Clodoaldo Carlos Batista, o Eduardo -indiciado como co-autor do assassinato- também envolveram anteontem o prefeito de Anapu, Luiz dos Reis Carvalho (PTB), no caso. Segundo eles, Bida procuraria o prefeito com o objetivo de obter ajuda caso um dos envolvidos fosse preso. O prefeito nega, mas admitiu não ter a escritura de uma fazenda de cem hectares que possui em Anapu. (MS)

Délio é acusado de desviar R$ 7 mi de verbas da Sudam
Laudelino Délio Fernandes Neto, apontado como facilitador da fuga de Vitalmiro Bastos de Moura (o Bida, suposto mandante do assassinato de Dorothy Stang), é acusado pela Procuradoria da República de ter desviado R$ 7.087.611,33 de verbas da extinta Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia).
Devido à acusação, Délio foi processado em junho de 2002 por estelionato qualificado, falsidade ideológica, uso de documento falso, formação de quadrilha e crime contra o sistema financeiro. Após a denúncia da Procuradoria Geral da República no Pará e em Tocantins, Délio foi preso em Altamira. À época, ele teve os bens seqüestrados pela 2ª Vara Federal da Justiça de Tocantins.
Segundo a Procuradoria, com apoio do então senador e hoje deputado federal Jader Barbalho (PMDB), Délio conseguiu aprovar, em 1998, os projetos das empresas Agropecuária Pedra Roxa S.A. e Agropecuária Vitória Régia S.A., das quais é procurador e proprietário, respectivamente.
Os projetos para produção de cacau e bovinocultura, no entanto, não saíram do papel, segundo a Procuradoria.
Délio tem sido citado por testemunhas do caso Dorothy. Com base nos depoimentos, a polícia localizou o carro de Bida -uma camionete Mitsubishi avaliada em R$ 90 mil- numa fazenda de Délio que fica dentro do lote de terras do PDS (Projeto de Desenvolvimento Sustentável) Esperança -onde a freira foi assassinada.
(KÁTIA BRASIL)

OPINIÃO/NYT
Assassinos da irmã Dorothy
DO NEW YORK TIMES
Leia abaixo a íntegra do editorial publicado ontem no "New York Times" sobre o assassinato da freira Dorothy Stang e a violência no Pará.
No último mês, no Estado amazônico do Pará, no Brasil, pistoleiros abordaram uma freira americana em uma estrada e a mataram. Segundo seus acompanhantes, a freira, Dorothy Stang, leu a Bíblia a seus assassinos antes de ser alvejada.
Irmã Dorothy, nascida em Ohio, mas naturalizada brasileira, advogava em favor de trabalhadores rurais pobres desde o começo de 1970, ajudando camponeses a ganhar a vida cultivando em pequenas propriedades e extraindo produtos da floresta sem devastá-la. Ela também procurava protegê-los de grupos criminosos interessados em suas terras.
O assassinato público de uma freira americana não é apenas um crime horrível - é um recado. Grileiros estão dizendo ao governo que eles comandam o Pará. O governo brasileiro contra-atacou de maneira resoluta, mas ainda resta ver se o governo é forte o suficiente para provar que os grileiros do Pará estão errados.
A violência no Pará não é recente, mas intensificou-se porque um trecho de rodovia está prestes a ser pavimentado para a criação de uma estrada transitável em qualquer condição meteorológica para levar produtos aos mercados. O valor da terra aumentou repentinamente, e grileiros matam camponeses e queimam suas casas para tomarem suas propriedades. Cortam árvores para o setor madeireiro e vendem a terra limpa para pecuaristas ou produtores de soja.
Desde a morte de irmã Dorothy, o governo enviou 2.000 tropas para manter a ordem no Pará, anunciou uma proibição no corte de árvores em 20 milhões de hectares ao longo da nova rodovia e estabeleceu mais duas áreas de proteção federal na floresta. O desafio será fazer com que essas mudanças perdurem. O acréscimo no efetivo militar não deve ser um gesto de curto prazo, mas o início do estabelecimento do poder da lei. Impingir a proteção florestal será difícil porque madeireiros têm, há muito, agido como querem. É também imensamente importante decretar títulos de propriedade rural claros.
Por fim, o governo deve punir os assassinos de líderes rurais como a irmã Dorothy. Sua comunidade eclesiástica afirma que cerca de mil ativistas rurais foram assassinados de 1985 a 1996; sendo que, no ano passado, apenas cinco pessoas estavam presas por essas mortes. Desde a morte da irmã Dorothy Stang, ao menos quatro líderes rurais foram assassinados. O governo esquerdista brasileiro parece ávido para fazer da morte de irmã Dorothy um catalisador para mudanças, mas deve resistir a forças que repetidamente provaram ser mais fortes que a lei.

FSP, 03/03/2005, p. A13

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