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Geradora pode ficar fora de leilao de energia

FSP, Dinheiro, p.B6
12 de Dez de 2005

Empresas interessadas em novas hidrelétricas dizem que preço máximo de R$ 116 por MWh não remunera o investimento
Geradora pode ficar fora de leilão de energia
Fernando Canzian
Claudia Trevisan
As maiores empresas privadas de geração de energia hidrelétrica do país ameaçam ficar de fora do primeiro leilão federal de compra de energia nova, marcado para sexta-feira, que tem o objetivo de atender ao crescimento da demanda a partir de 2008.
Se a ameaça se concretizar, o Brasil corre o risco de ter uma energia mais cara ou ver o aumento do peso das estatais no setor, na contramão da gestão Fernando Henrique Cardoso.
As empresas alegam que o preço máximo para a compra da energia que gerariam em novos empreendimentos, de R$ 116 o MWh (megawatt/hora), não paga os investimentos necessários para a construção das usinas.
O eventual fracasso no leilão das hidrelétricas poderá encarecer o custo da energia no triênio 2008-10, já que a carência deverá ser suprida pelas termoelétricas a gás ou diesel, que têm hoje custos mais altos que a fonte hídrica.
Ao contrário da energia hidrelétrica, não foi fixado nenhum teto para a termoelétrica.
As empresas privadas afirmam que novos projetos de hidrelétricas que forem assumidos por estatais acabarão por representar a geração de energia subsidiada.
O diretor da CNEC Engenharia (grupo Camargo Corrêa), José Ayres, afirma que os R$ 116 oferecidos como teto para a energia das novas hidrelétricas é "irreal" no caso dos projetos em discussão, que podem acabar tendo custos ambientais bem mais elevados que os previstos.
Ayres diz que as estatais acabarão comprometendo sua capacidade de investimento futura se aceitarem o teto de R$ 116 como remuneração pelo MWh gerado.
No setor privado, o leilão está sendo chamado de "chapa-branca", pela possibilidade de as empresas públicas assumirem responsabilidade significativa na construção de novas hidrelétricas.
A Energias do Brasil, que pretendia investir US$ 1 bilhão em geração, afirma que o preço de R$ 116 não garante o retorno mínimo de 15% do investimento. Oficialmente, a empresa diz que ainda analisa se entrará ou não no leilão.
Claudio Sales, presidente da CBIEE (Câmara Brasileira de Investidores em Energia Elétrica), diz que o Brasil precisará de 4.000 MW adicionais a partir de 2009 para suprir a demanda decorrente da expansão da economia.
A previsão original era que 2.831 MW fossem ofertados no leilão de sexta-feira, mas o número ficará abaixo disso em razão das dificuldades para a obtenção das licenças ambientais que permitem o início das obras. Dos 17 projetos de usinas hidrelétricas escolhidos pelo governo, só 6 conseguiram as licenças até agora. Esses empreendimentos têm capacidade para gerar 822,8 MW.
"A Energias do Brasil levantou recursos, quer fazer as hidrelétricas, mas considera o preço economicamente inviável. A CPFL, que também tem interesse, não vai entrar no leilão", observa Sales, que dirige a entidade que reúne as grandes empresas do setor.
Analistas da área afirmam que o país nunca teve um período tão longo como agora -três anos- sem novos investimentos em hidrelétricas. Por isso, o governo se empenha para que empresas privadas estejam no leilão.
Em novembro, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) anunciou uma linha de financiamento que poderá cobrir até 80% do investimento, com exceção da compra do terreno e de bens importados, no caso das hidrelétricas. O prazo de amortização do empréstimo é de 14 anos, com seis meses de carência após o início da operação do empreendimento.
Mas nem mesmo as condições vantajosas do financiamento foram capazes de aumentar o apetite das empresas. Segundo Sales, a linha do BNDES viabilizou alguns projetos, de pequeno porte.
No caso das usinas termoelétricas, o banco oficial anunciou na semana passada que também financiará a compra de produtos importados sem similar nacional.
Sem teto
O teto de R$ 116,00 só será aplicado à primeira das três fases do leilão, na qual serão ofertados os projetos de novas hidrelétricas. Nas duas etapas seguintes entrarão novas e antigas termoelétricas e usinas hidrelétricas já concedidas, mas que não venderam sua energia, chamadas de "botox".
Isso significa que o preço final poderá ser superior aos R$ 116 fixados como teto para novas hidrelétricas, o que é um "paradoxo", na opinião de Sales. Segundo ele, poderá ocorrer um cenário no qual uma empresa deixe de entrar no leilão por discordar do teto de R$ 116 e veja, no fim da disputa, uma usina "botox" vender sua energia a, por exemplo, R$ 130, valor que poderia viabilizar seu investimento para a construção de uma nova hidrelétrica.
Representantes de empresas e analistas do setor contestam o teto máximo de preço e afirmam que o valor do MW deveria ser fixado por meio da concorrência.
Já o consultor da área de energia e ex-diretor da Eletronuclear Joaquim de Carvalho considera que o valor de R$ 116 é até alto demais. No entanto, ele afirma que os leilões introduziram uma série de "atravessadores" no mercado de energia, elevando os custos e não garantindo, no final, a realização dos empreendimentos.

OUTRO LADO
Governo diz que há interesse e que empresas "blefam"
Maurício Tolmasquim, presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), responsável pela montagem do leilão de energia nova, diz que há muitas "ameaças e blefes" por trás das reclamações das empresas privadas. "Isso é natural. Só poderemos avaliar tudo isso melhor depois do leilão."
Tolmasquim diz que o número de empresas habilitadas para o leilão marcado para a próxima sexta-feira é um "indicativo" de que há "grande interesse" no negócio, mesmo com o preço da energia nova hidrelétrica fixado em, no máximo, R$ 116 o megawatt/hora.
Até a noite de sexta-feira, 128 empresas haviam se habilitado para participar do leilão, das quais 33 irão disputar novas concessões de usinas hidrelétricas.
Mas isso não significa que todas apresentarão lances. Para poderem participar do leilão, as empresas habilitadas terão de depositar garantias até o dia 14, dois dias antes da disputa.
O leilão será realizado no Rio de Janeiro e será o primeiro para a compra de energia nova do governo Lula. No caso das novas hidrelétricas, a disputa começará com o preço máximo de R$ 116 por MWh. O empreendimento ficará com quem oferecer o menor preço abaixo desse teto. (FCz)

FSP, 12/12/2005, p. B6

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