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Gasoduto de 5 mil Km sai do papel em janeiro

OESP, Economia, p.B4
28 de Dez de 2003

Gasoduto de 5 mil km sai do papel em janeiro Orçada em R$ 2,48 bilhões, obra vai ligar o gasoduto Brasil-Bolívia ao Nordeste
GUSTAVO PAUL
BRASÍLIA - A partir de janeiro, começa a sair do papel a construção de um gasoduto gigantesco que pretende ligar o duto Brasil-Bolívia ao Nordeste e assim unificar a rede de distribuição de gás natural no País.
Dividido em três etapas, somando 5,1 mil quilômetros de extensão, que atravessará as Regiões Centro-Oeste e Nordeste, o Gasoduto da Unificação (Gasun) está orçado em US$ 2,48 bilhões. No início de dezembro, a ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, determinou que o projeto receba um "certificado de enquadramento", que fará com que ele possa absorver parte dos recursos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), cobrada de cada concessionária do setor elétrico. Esse certificado deverá estar pronto nas próximas semanas.
O grupo de empresas que bancou o projeto do Gasun conta com esse dinheiro para dar início às licitações da obra, cuja primeira etapa deve ficar concluída em 2007. A lei que criou o programa de apoio emergencial às companhias de energia, sancionada em novembro, reservou entre 2004 e 2008 cerca de R$ 2 bilhões para a construção.
O dinheiro, diz a lei, é carimbado e só pode ser usado onde ainda não existe fornecimento de gás natural. Com isso, foram beneficiados Piauí, Maranhão, Goiás, Distrito Federal, Tocantins e Pará. A CDE foi criada em abril de 2002, na esteira das medidas contra racionamento, para financiar a competitividade da energia produzida por fontes alternativas, como a energia eólica, gás natural e as pequenas centrais hidrelétricas, além da levar luz para todas as localidades do País que ainda estão às escuras.
De olho na possibilidade de o gás chegar a seus Estados e para justificar sua própria existência, assinam o projeto do Gasun as distribuidoras estaduais de gás natural do Piauí (Gaspisa), do Maranhão (Gasmar), do Distrito Federal (Cebgás) e de Goiás (Goiasgás). Também beneficiados pelo projeto do Gasun, o Pará e o Tocantins ainda não criaram suas empresas estaduais de distribuição de gás, o que deve ocorrer ao longo do processo de construção.
Ainda bancam o projeto a Petrobrás, por meio de sua subsidiária Gaspetro, e a Termogás, empresa da holding CS Participações, do empresário baiano Carlos Suarez. Essas últimas são ainda sócias minoritárias de todas essas distribuidoras estaduais envolvidas no projeto. Para as distribuidoras estaduais e os empresários, o Gasun é considerado fundamental: só se o gás chegar aos Estados, elas terão o que vender e assim começarão a faturar.
Pressão - A garantia dos recursos para o gasoduto foi motivo de uma intensa pressão política dentro do Congresso no segundo semestre deste ano. Preocupados com os sinais dados pela ministra Dilma de que o governo queria boa parte dos recursos da CDE canalizados para as obras de universalização de energia, as bancadas do Maranhão e do Piauí - de um lado, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) e do outro o governador petista, Welington Dias - negociaram para manter o quinhão destinado ao gás.
Na queda-de-braço, a ministra conseguiu garantir que, pelo menos nos próximos anos, mais recursos da CDE sejam destinados ao programa Luz para Todos, que pretende levar energia elétrica a 12 milhões de brasileiros que vivem na escuridão.
O Gasun, que teria até 30% dos recursos desta conta logo em 2004, teve seu porcentual reduzido para 15%. O volume de recursos vai ser aumentado a cada ano. Em 2004, do R$ 1,630 bilhão da CDE, R$ 244,5 milhões irão para o Gasun.
Ao longo dos anos, o porcentual anual destinado ao duto deverá aumentar, chegando a R$ 489 milhões em 2008. Mesmo contando com um volume relativamente pequeno de recursos por ano, diante do custo total do empreendimento, o diretor da Termogás, José Garcez, acredita que ao longo dos anos será possível custear a obra. "A CDE não terminará em 2008", argumenta Garcez. Ele espera que outras fontes de recursos, inclusive privadas, surjam à medida em que ela for se concretizando.
Logo depois da aprovação da lei, começaram as negociações com o Banco do Nordeste (BNB), para a antecipação de parte dos recursos para a obra. Como pagamento desse financiamento no futuro, o banco receberá as respectivas cotas da CDE. Essa possibilidade já contaria, segundo fontes do setor, com o aval do ministro da Integração Nacional, o cearense Ciro Gomes. As conversas com o Ibama, para discutir o licenciamento ambiental também já foram iniciadas.
Assim, pelo menos um dos trechos do duto, o Meio Norte, que liga Fortaleza, até Açailândia, no Maranhão, teria recursos assegurados. A capital do Ceará é uma das pontas do gasoduto Nordestão, que começa em Salvador e passa por todas as capitais da região. Essa etapa do Gasun demandaria investimentos totais de US$ 748 milhões e poderia criar 3,1 mil empregos diretos. Depois de pronta, dizem seus idealizadores, o potencial de geração de trabalho passaria a 20,5 mil.
"A expectativa de chegada do gás é muito grande no Estado", afirma o secretário de Indústria e Comércio do Piauí, Jorge Lopes. Segundo ele, o desenvolvimento do Estado, um dos mais pobres do País, depende da disponibilidade de mais recursos energéticos no futuro, via gás natural.
Algumas fabricantes de cerâmica, disse, estão dispostas a se instalar no Piauí, depois de receberem a garantia de que terão o gás, considerado ideal para essa indústria. "Se não chegar o insumo vamos ter dificuldades", diz Lopes.
No Maranhão, a chegada do gás natural também é bastante esperada, para projetos estratégicos, como um nova planta da Companhia Vale do Rio Doce e para alimentar o Consórcio de Alumínio do Maranhão (Alumar) formado pelas multinacionais Alcoa, Alcan e BHP Billiton, um dos maiores complexos de produção de alumínio e alumina do mundo.
Para Goiás e o Distrito Federal, que integram o Eixo Centro-Oeste, o projeto do Gasun poderá tornar viável a construção de usinas termoelétricas para geração de energia, além de outros projetos industriais. Em toda a região atendida pelo gasoduto, as distribuidoras locais querem também criar e estimular a demanda pelo gás automotivo.
O projeto prevê que o Gasun seja iniciado em Mimoso, no Mato Grosso do Sul, onde se juntaria ao gasoduto Brasil-Bolívia. De lá, ele segue até Brasília, passando por Goiânia. Essa etapa custaria US$ 634 milhões e levaria a criação de 1,3 mil empregos diretos e teria potencial de criação de outros 31 mil, depois de concluída a obra.
A mais cara e maior parte do projeto é a Centro-Norte, que liga Goiás ao Maranhão com 2.260 quilômetros de tubos. Essa etapa deverá custar US$ 1,1 bilhão, e passará por Palmas e Belém. Deve ser a última a ficar concluída, possivelmente na próxima década.
O Gasun ganhou um importante aliado em 2003: a descoberta de reservas de gás no litoral brasileiro, disponíveis em meados de 2007. Com esse aumento da oferta e a proximidade dos principais mercados consumidores, no Sudeste, o gasoduto Brasil-Bolívia deve perder parte de seu mercado futuro. O Gasun passou a ser encarado como uma forma de tornar o projeto binacional viável economicamente nos próximos anos.

OESP, 28/12/2003, p. B4

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