VOLTAR

Garimpo arrasa mata nativa na Amazônia Legal

Gazeta de Cuiabá-Cuiabá-MT
Autor: Najla Passos
17 de Fev de 2003

A atividade de exploração está comprometendo a preservação de uma parcela significativa da floresta

A descoberta de ouro e diamante nas terras do projeto de assentamento Vale do Amanhecer, em Juruena, a 960 quilômetros de Cuiabá, pode colocar em risco um pedaço significativo de mata nativa da Amazônia Legal.

Desde o início das chuvas, que provocou o afloramento do ouro, garimpeiros da região invadem sistematicamente os 7,2 mil hectares de reserva legal do assentamento, munidos de maquinário pesado, dragas e mercúrio.

"Pelos nossos cálculos, já existem mais de duas mil pessoas na área, vivendo direta ou indiretamente da mineração ilegal. E, nesta altura, será impossível retirá-las através de força policial, porque causaríamos um enorme problema social", lamenta o prefeito de Juruena, Vivaldo Marcori.

Conforme ele, o assentamento, considerado modelo no país, foi criado pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) há quatro anos. Abriga 250 famílias de trabalhadores rurais, em 14,4 mil hectares.

"Com o apoio de projetos ambientais, as famílias vinham desenvolvendo atividades sustentáveis. Juruena, por exemplo, foi o município mato-grossense que mais conseguiu reduzir seus índices de queimada e desmatamento em 2002. O garimpo coloca tudo o que conquistamos em risco", denuncia.

O prefeito alerta que, cooptados pelos garimpeiros, alguns assentados já estão se rendendo ao lucro fácil da mineração. "Nosso temor é que eles entrem em conflito aberto com os trabalhadores que queiram priorizar a questão ambiental e sustentável".

Incra se cala diante da ameaça

Apesar do projeto de assentamento Vale do Amanhecer estar ameaçado pelo garimpo irregular recém aberto na região, o Incra ainda não tomou nenhuma providência para resguardar o direito dos assentados ao usufruto da terra.

A denúncia parte do advogado Justino Carvalho Neto, assessor jurídico do Instituto Pró-Natura, uma organização não governamental que elabora diversos projetos de desenvolvimento sustentável na região amazônica.

"Apesar das famílias já estarem assentadas na área, o Incra é quem deveria responder, pelo menos, pela área de reserva legal comunitária", explica. Segundo ele, não há proposta de ação jurídica de defesa da região nem mesmo por parte do Ministério Público Federal (MPF).

O assessor explica que no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) constam duas autorizações para pesquisas na área. A primeira, de 09 de agosto do ano passado, em nome de Aurelino Tavares Júnior e na outra, de 18 de dezembro, o titular é Francismar Ricas.

"Nenhum deles procurou a Prefeitura para se apresentar. Por isso, não sabemos dizer se eles estão na área pesquisando ou mesmo se têm vínculos com as mineradoras que também extraem ouro clandestinamente na região", esclarece o prefeito Vivaldo Marcori.

A reportagem não conseguiu agendar uma entrevista com o superintendente em exercício do Incra, Joari Arantes, na última sexta-feira. Conforme informações da assessoria, ele passou o dia reunido com trabalhadores rurais sem-terra que ocupam o pátio da sede do órgão.

Turismo ficará sem os atrativos

A secretária de Turismo Juliany Nunes de Queirós teme que a exploração indiscriminada de garimpo possa causar impactos irreversíveis nos dois principais trunfos turísticos do município: os rios Arinos e Juruena.

"Todo o mercúrio usado no garimpo do Vale do Amanhecer cai diretamente no Rio Juruena, que corta a reserva legal do assentamento. Se nada for feito, a poluição será inevitável".

O prefeito do município, Vivaldo Marcori, teme também que a migração excessiva altere a rotina de Juruena, uma cidade pacata, com 9 mil habitantes, que tem como atividades econômicas principais a exploração madeireira e a agropecuária.

"No comércio, já é possível notar que os preços de tudo quanto é produto estão aumentando. Mas na rede de saúde e na de educação, ainda não sentimos mudanças", esclarece.

Para o gerente de projetos do Instituto Pró-Natura, Antônio Cláudio Barbosa, há também a preocupação de que o garimpo ultrapasse as fronteiras do assentamento.

"Prefeitos de municípios vizinhos, como Castanheira, estão com medo que esta corrida do ouro chegue as suas cidades e cause uma devastação sem precedentes na região", confessa.

A histórica da região da amazônia mato-grossense demonstra que os garimpos na região têm vida curta, ao mesmo tempo que a mineração tem se mostrado uma atividade altamente predatória, em função da desorganização do setor.

"Nossa preocupação é que o ouro venha a desestabilizar todo o processo de organização social que atingimos no assentamento, em função de uma atividade comercial efêmera e que causa grande degradação ambiental", analisa o gerente de projetos da Pró-Natura.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.