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Garimpeiros denunciam maus tratos

Folha de Boa Vista-Boa Vista-RR
Autor: LEANDRO FREITAS
22 de Jul de 2003

Maria do Socorro mostra balas eidentificação de soldado venezuelano

Duas pessoas procuraram a Polícia Federal, no final da tarde de ontem, para denunciar maus tratos que os familiares estão sofrendo na região de Catrimani, na reserva yanomami, ao norte do Estado, por agentes da Guarda Nacional da Venezuela, onde um grupo de aproximadamente 30 homens está explorando minérios ilegalmente.

A invasão à reserva indígena e a garimpagem ilegal vêm se arrastando por mais de três anos e não há nenhuma medida das autoridades para evitar a prática, mesmo tendo conhecimento. Com esta denúncia, surge ainda um outro fator: a suposta invasão da fronteira pelas autoridades venezuelanas.

A iniciativa surgiu depois de um telefonema, via satélite, de uma das pessoas que estaria sob tortura na reserva indígena, sábado passado. O denunciante alega estar em cativeiro desde quinta-feira da semana passada.

Domiciano Pimentel foi um dos integrantes do grupo que sofrera os maus tratos e conseguiu escapar. Chegando em Boa Vista, ele procurou imediatamente a PF para prestar depoimento e denunciar a ação da polícia do país vizinho. "Fui apenas uma vez e passei por isso. Fiquei só 20 dias no local sob tortura. Muitas vezes as pessoas são afogadas, passam fome, entre outras coisas. É um local onde não há acesso, só chega de avião", disse.

Indagado sobre a suspeita de haver um dono do garimpo, o qual somente contratara o serviço dos garimpeiros, pois é onerosa a ida para a região por causa do frete de avião, Pimentel disse que não tem conhecimento e tão pouco sabe de quem é o avião que faz o transporte dos homens para a região.

Conforme ele, nos poucos dias que ficou na reserva, não chegou a trabalhar de fato, por isso não sobe esclarecer o esquema da exploração de minério. Afirmou que, apesar de ser uma área indígena, os índios ficam mais próximos da Venezuela do que do local onde os garimpeiros estão acampados.

Embora ele tenha passado poucos dias, o prejuízo foi considerável. Todos os documentos pessoais foram rasgados e alguns até queimados. Apesar de saber que o garimpo em área indígena é uma prática ilegal, Pimentel disse que resolveu procurar a Polícia Federal para tentar resgatar os demais que estão no local. "Queremos chamar a atenção das autoridades locais para mudar esse quadro, mesmo sabendo que corremos o risco de sermos presos", afirmou.

A outra pessoa que procurou a Polícia Federal, foi a mulher de um dos garimpeiros mantidos presos por guardas venezuelanos na reserva, Laurilene Andrade de Souza. Ela afirmou saber que o garimpo é ilegal, mas retrucou com a invasão dos guardas venezuelanos na reserva para torturar os brasileiros e levar todo o ouro que eles extraíram durante o mês.

Com o trabalho de extração de ouro, alguns homens conseguem arrecadar até meio quilo do minério, que é vendido e o dinheiro enviado para a família que vive em Boa Vista. O minério é retirado por meio de dois motores.

"Já sumiram dois garimpeiros. Esses homens não têm opção de trabalho na cidade e por isso têm que ir para a mata tirar ouro, mesmo sabendo que estão correndo risco", disse Laurilene, ao afirmar que dentre várias torturas, um dos integrantes do grupo conseguiu retirar a identificação do soldado venezuelano, chamado Villegas.

Sabendo que o marido pode ser preso por estar agindo contra a lei, Laurilene disse que prefere que ele volte para Boa Vista e fique preso na Penitenciária Agrícola, a ter que ficar sob tortura para garantir o sustento dos dois filhos pequenos que eles têm.

Cecília Fernandes Camelo disse indignada ter vergonha de ser brasileira. Isso porque o marido dela, Antônio Loro, de 64 anos, está sendo torturado por policiais da guarda do país vizinho. Ela disse que Antônio já foi espancado e teve as roupas quase todas queimadas no próprio corpo. "Que Brasil é esse que a lei não ampara o trabalhador?", indagou.

Sobre o piloto que transporta esses garimpeiros, mais uma vez ninguém soube informar a origem dele e valor do frete, uma vez que os denunciantes alegam que apenas contratam o serviço. "Trabalhamos por conta. Não tem ninguém que é dono do local onde tiramos o ouro", afirmou Maria do Socorro, que já ficou até oito meses no local trabalhando como cozinheira.

Ela disse que quando acontecem essas "fiscalizações venezuelanas", os garimpeiros são obrigados a trabalharem para os guardas da polícia do outro país. Afirmou que, além de buscar mais minério no local, o garimpeiro tem que entregar tudo o que está guardado, ou então passa por torturas mais ousadas.
POLÍCIA FEDERAL - Procurado pela Folha, o delegado federal e chefe de Comunicação Social do órgão, Thiago Giavarotti, se negou a passar informações sobre o caso para que não atrapalhe o andamento das investigações.

A única informação extra-oficial passada pelos denunciantes que prestaram depoimento na tarde de ontem no órgão, é de que a Polícia Federal pediu reforço do Exército e da Funai (Fundação Nacional do Índio) para tentar solucionar o caso. O pedido se deu por causa da distância e difícil acesso ao local, podendo chegar apenas por via aérea, além de se tratar de uma reserva indígena e depender de autorização oficial da Funai para chegar na região.

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