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Fundo Amazônia recebeu apenas 2,9% das novas doações

Valor Econômico - https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/11/04/
04 de Nov de 2023

Fundo Amazônia recebeu apenas 2,9% das novas doações
O BNDES recebeu, até sexta-feira (3), apenas 2,9% dos cerca de R$ 3,4 bilhões prometidos por Estados Unidos e países da Europa com a reativação do Fundo pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva

Por Paula Martini, Valor - Rio 04/11/2023

As novas doações para o Fundo Amazônia, anunciadas desde o começo do ano, chegam a conta gotas aos cofres do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), gestor dos recursos. O banco recebeu, até sexta-feira (3), apenas 2,9% dos cerca de R$ 3,4 bilhões prometidos por Estados Unidos e países da Europa com a reativação do Fundo pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Ambientalistas e ex-ministros do Meio Ambiente ouvidos pelo Valor afirmam que o governo precisa acelerar a destinação do saldo disponível para agilizar os novos depósitos. Dizem ainda que as operações podem demorar devido à complexidade da documentação. O fato é que as internalizações de dinheiro novo no fundo se dão à medida que projetos vão surgindo e os desembolsos para realizá-los ocorrem.
Fontes do setor admitem, em caráter reservado, "incômodo" com a demora do governo em aplicar os recursos em caixa, e também com a lentidão dos novos repasses, diante do agravamento da crise ambiental na Amazônia. A região enfrenta incêndios florestais e uma das piores secas da história recente.
O Fundo Amazônia tem, hoje, um saldo em caixa de R$ 4,1 bilhões. Esse valor considera depósitos feitos até 2019 pelos principais doadores do primeiro ciclo, incluindo Noruega, Alemanha e Petrobras, o rendimento financeiro das operações com juros; além de um depósito de R$ 100 milhões (20 milhões de euros) da Alemanha, o único novo feito em 2023.
A previsão é que, nos próximos anos, a iniciativa dobre de tamanho com novas contribuições milionárias anunciadas por nações desenvolvidas. Desde janeiro, cinco países (Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Suíça, Dinamarca) mais a União Europeia se comprometeram com doações que somam R$ 3,4 bilhões, de acordo com o câmbio atual.
No entanto, apenas os R$ 100 milhões doados pela Alemanha (cerca de 2,9% do total prometido pelos países) chegaram efetivamente aos cofres do BNDES. O governo de Olaf Scholz anunciou, em janeiro, novo aporte ao fundo, no total de 35 milhões de euros (R$ 189 milhões). O montante faz parte de pacote mais amplo de 203 milhões de euro em iniciativas ambientais no Brasil.
O BNDES informou, por meio de nota, que as intenções de doação anunciadas estão em processo de negociação "para que a contratação seja possível e haja posterior internalização".
Efeito Bolsonaro
O Fundo Amazônia foi criado em 2008 para captar doações para investimentos não reembolsáveis, que não precisam ser devolvidos, aplicados para combater o desmatamento na Amazônia Legal. O mecanismo, considerado pioneiro na área, funcionou normalmente até 2019. Desde que assumiu, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) atacou a governança do projeto e extinguiu conselhos que formavam a base da iniciativa.
O então titular do ministério do Meio Ambiente, Ricardo Salles, também anunciou intenção de alterar o funcionamento do projeto para indenizar proprietários de terras. Com isso, a Alemanha e a Noruega, principais financiadores, paralisaram repasses e bloquearam verbas. A retomada do programa se deu este ano, no governo Lula.
Ex-ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc diz que a proposta original do fundo prevê uma relação direta entre os depósitos e a redução do desmatamento na Amazônia.
"A regra era essa: os doadores não interferem nos projetos, e a nossa obrigação é mostrar que eles foram bem concluídos. Existe uma doação genérica, assinada, mas isso não significa que o cheque é feito no dia seguinte", diz Minc, hoje deputado estadual pelo PSB no Rio.
O site do projeto esclarece que a captação de recursos é condicionada à comprovação da redução do desmatamento. Em setembro, o desmatamento na Amazônia Legal caiu na comparação com o mesmo mês do ano passado, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), mas, por enquanto, a medida não foi suficiente para acelerar as doações ao fundo, uma vez que o programa conta ainda com muito dinheiro em caixa.
Minc alerta: "É claro que novos projetos precisam ser executados para que outras parcelas sejam depositadas." Minc, que comandava o Meio Ambiente quando o Fundo foi criado, enfatiza que não houve provas de malfeitos ou corrupção com os recursos já utilizados.
- Foto: Arte/Valor
R$ 1,75 bilhão em 104 projetos
Desde que foi criado, o Fundo Amazônia investiu R$ 1,75 bilhão em 104 projetos. Os critérios para aplicação de recursos do fundo são estabelecidos pelo Comitê Orientador do Fundo Amazônia (COFA). O órgão, formado por representantes do governo federal, de governos estaduais e da sociedade civil, foi reativado em fevereiro.
Na ocasião, a ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Marina Silva, e o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, afirmaram que o projeto seria retomado com as mesmas diretrizes de 2018. A prioridade são operações de comando e controle, regramento territorial e estímulo a novas áreas de proteção, além de ações emergenciais para os povos indígenas.
Mas para o ambientalista Fábio Feldmann, ex-deputado federal e responsável pelo capítulo dedicado ao meio ambiente da Constituição de 1988, falta clareza sobre a estratégia do governo.
"A gente precisa entender melhor as estratégias de desembolsos desses recursos e, eventualmente, dos adicionais; R$ 3 bilhões não é uma quantia trivial", diz. Ele também reconhece que havia expectativa de maior agilidade de desembolso dos recursos. "Eu não senti, até agora, que a escolha do BNDES se confirmou positiva em termos de velocidade", critica.
Uma das estratégias adotadas pelo governo na retomada da iniciativa é dar prioridade à análise de projetos que estavam em fase avançada de aprovação, e foram suspensos com o abandono do fundo pela gestão anterior. Questionado pelo Valor sobre o andamento das negociações, o BNDES informou que dois projetos foram contratados em 2023.
Um deles, no valor de R$ 13,1 milhões, visa apoiar o cultivo de babaçu, no Maranhão. O projeto ainda não recebeu desembolsos. Outra iniciativa contratada foi o MapBiomas, que monitora o uso da terra no país. O programa recebeu, em outubro, R$ 5 milhões de um investimento total de R$ 11,2 milhões. O BNDES prevê assinar, nos próximos dias, um terceiro contrato, para fortalecer a gestão territorial indígena no Acre.
Adriana Ramos, assessora política e de direito do Instituto Socioambiental (ISA), entende que a tramitação está dentro do esperado: "Não dava para esperar que o programa fosse reativado e, no dia seguinte, os projetos fossem aprovados", diz. Mas a ambientalista defende que é preciso aumentar a capacidade institucional para atender a demanda do Fundo Amazônia nos próximos anos, sobretudo para dar mais suporte aos proponentes de projetos.
"O BNDES precisa de uma equipe maior para orientar os proponentes para que os projetos venham mais redondos e prontos para serem aprovados. Isso é importante para auxiliar principalmente municípios e organizações menores, que enfrentam mais dificuldades no processo", afirma.
O BNDES informou estar comprometido com a celeridade dos processos de análise e contratação relacionadas ao Fundo Amazônia. O banco espera concluir, até o fim do ano, análises que já estão em fase adiantada de tramitação.

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