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Febre amarela tem novo perfil

OESP, Vida, p. A20
21 de Mai de 2009

Febre amarela tem novo perfil
Ministério da Saúde investiga frequência maior de surtos e casos em locais antes considerados livres da doença

Lígia Formenti

Uma equipe de médicos, veterinários e biólogos destacada pelo Ministério da Saúde iniciou há alguns dias uma investigação em campo para descobrir por que o comportamento da febre amarela mudou no País. Os surtos da doença, que tradicionalmente ocorriam a cada sete anos, passaram a ser menos espaçados.

A geografia também mudou - antes concentrada em alguns pontos do território, a febre amarela avança aos poucos para áreas que antes eram consideradas livres da doença. Os exemplos mais recentes estão no Rio Grande do Sul e no sudoeste de São Paulo. Juntas, as duas regiões, antes sem risco para febre amarela, registraram entre novembro de 2008 e abril deste ano 43 infecções, com 16 mortes.

Diante desse quadro, a equipe foi para a região onde os surtos estão ocorrendo. O objetivo é decifrar as causas da mudança e, principalmente, tentar antever quais os caminhos mais prováveis para a doença num futuro próximo. Com base nesses dados, epidemiologistas pretendem traçar uma estratégia para prevenir novos casos a curto prazo.

Os trabalhos de pesquisa começaram há três meses. Semana passada, um grupo de especialistas foi ao Rio Grande do Sul pesquisar as áreas afetadas, a última etapa do trabalho. O mesmo processo foi feito em São Paulo. A expectativa é de que, até julho, os resultados preliminares do trabalho estejam concluídos.

Na visita, os especialistas procuraram respostas para várias perguntas. Entre elas, se há aumento de criadouros do vetor da doença e se há tendência de migração de macacos - e por que isso estaria ocorrendo. A doença é transmitida pela picada de mosquito. Nas matas, macacos são o principal reservatório do vírus. "São várias as hipóteses para explicar essas mudanças", diz a coordenadora adjunta do departamento de vigilância epidemiológica do ministério, Carla Domingues.

As mudanças climáticas são uma das primeiras razões lembradas. O clima mais quente favorece a proliferação do mosquito vetor da doença, o Haemagogus. O desmatamento, além de favorecer o o aumento da temperatura, também pode causar o deslocamento de primatas para as áreas mais habitadas. Em São Paulo, a mudança pode ter sido provocada por alterações na agricultura, aumento da temperatura e obras na região. "A área afetada no Estado está muito próxima de represas. A combinação de vários fatores pode ter levado a essa mudança."

Neste ano, por exemplo, a temperatura no Rio Grande do Sul foi bem alta, o que pode ter favorecido o aumento dos criadouros. "Por enquanto temos várias especulações. O trabalho pretende entender a dinâmica e, a partir daí, antever outras áreas suscetíveis à expansão da doença", diz Carla. Com a confirmação das infecções, foi organizada campanha de vacinação nas cidades afetadas e áreas próximas.

Dados oficiais mostram que no Rio Grande do Sul 2,2 milhões de doses foram aplicadas . Em São Paulo, 1,5 milhão de pessoas foram imunizadas. "Esse número deve aumentar até o fim do mês, quando termina a iniciativa", afirma Carla Domingues.

Mais vacina será comprada

Lígia Formenti

O Ministério da Saúde vai ampliar a compra de vacina contra febre amarela para 2010. O aumento, de dimensão não definida, servirá para formar um estoque a ser usado em uma eventual mudança na estratégia de combate à doença. Com a febre amarela se alastrando, a previsão é de que, em 2010, haja a necessidade de ampliar as áreas em que a vacina é recomendada como rotina.

Não se sabe em quais regiões tal mudança se daria. Para isso, é preciso aguardar o resultado dos estudos encomendados pelo ministério para decifrar as causas das alterações no alcance da doença. Será também a partir das conclusões desse grupo que o ministério ampliará a compra da vacina. Para 2009, foram adquiridos 28,5 milhões de doses.

"Certamente para 2010 haverá um aumento", adiantou a diretora adjunta do departamento de Vigilância Epidemiológica do ministério, Carla Domingues. Por enquanto, ela descarta a possibilidade de vacinação em massa. "A vacina pode ter efeitos colaterais. Não há por que expor a população a um risco desnecessário." Mas admite que, a cada ano, a tendência é de haver número maior de regiões onde a vacina tem de ser incorporada ao calendário.

A equipe que pesquisa o comportamento da febre amarela tenta agora verificar quais são as próximas áreas de risco da doença. "A ideia é tentar desvendar a forma de expansão. Pesquisar ecossistemas parecidos, avaliar a necessidade de vacinar municípios contíguos ou que integram a mesma bacia hidrográfica", disse. A expectativa é de que essa projeção esteja pronta em julho, quando será realizada a reunião com a Biomanguinhos, a fabricante da vacina.

Mosquito da malária migra para regiões urbanas
Estudos alertam para larvas achadas em recipientes artificiais, como caixas d'água e barris, em vez de rios

Fabiane Leite

Nova pesquisa realizada pela Fundação Nacional de Saúde alerta que o mosquito transmissor da malária, que normalmente deposita seus ovos em águas mansas de rios, brejos e lagoas, tem utilizado como criadouros também recipientes artificiais das cidades, como caixas d'água, barris, garrafas, pneus' e vasos, que já são os preferidos do mosquito da dengue.
"Sua presença em recipientes artificiais mais abundantes em áreas urbanas pode indicar futuro aumento do risco de transmissão da doença", afirma o trabalho, publicado na última edição da revista Epidemiologia e Serviços de Saúde, publicação do Sistema Único de Saúde brasileiro.
Os achados são importantes porque indicam uma possível mudança dos hábitos do inseto, o que poderá ter implicações no controle da doença no futuro.
No entanto, ainda não há evidências de que os novos criadouros já tenham contribuído para a transmissão da malária ou para sua expansão em grandes cidades.
Hoje a malária é uma doença endêmica na Amazônia Legal, registrando média de 500 mil casos anuais, incluindo registros em cidades como Manaus. Fora desta região, há surtos esporádicos, notificados principalmente por Estados do Sudeste, como Espírito Santo, São Paulo e Paraná, e relacionados principalmente ao fluxo de pessoas de áreas endêmicas para estes locais.
O trabalho recém-publicado relata o encontro de larvas de mosquitos anofelinos, os transmissores da malária, em seis cidades do Espírito Santo entre 2000 e 2005, durante atividades de controle de focos do mosquito da dengue. Os recipientes artificiais como caixas d'água são os preferidos do Aedes aegypti e por isso são constantemente monitorados pelos setores de vigilância epidemiológica dos governos.
Trabalhos anteriores também apontaram focos do mosquito da malária em recipientes artificiais em São Paulo e no Rio de Janeiro.
"Isso vem acontecendo em alguns Estados. Ainda é preciso um trabalho mais sistematizado, mas de qualquer maneira é um indício de modificação do comportamento da espécie", afirma o biólogo Helder Ricas Rezende, da Fundação Nacional de Saúde no Espírito Santo, que assina o trabalho. Ele explica que os mosquitos poderiam se adaptar, por exemplo, a recipientes deixados em parques e em outras áreas de matas nas cidades.
Rezende destaca ainda que os achados ocorreram em períodos de estiagem e que o comportamento das fêmeas pode ser também explicado pela ausência de criadouros naturais.
SEM TRANSMISSÃO
Segundo a entomologista Maria Anice Sallum, professora da Faculdade de Saúde Pública da USP, os trabalhos não conseguiram provar que os novos criadouros contribuíram para a transmissão da doença. A malária é causada por um parasita, cujo principal reservatório são os humanos, e que é transmitido de pessoas infectadas para os mosquitos, que por sua vez transmitem o parasita da doença para outras pessoas.
"Para haver transmissão é preciso uma série de situações.
É necessário o vetor (o mosquito),.o homem infectado e o homem suscetível, além de condições ambientais", ressalta Maria Anice, autora de trabalho anterior que encontrou anofelinos em recipientes artificiais em Ribeirão Preto (SP).

OESP, 21/05/2009, Vida, p. A20

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