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Explosão urbana ameaça a Bacia da Guarapiranga

JT, Geral, p. 18A
05 de Nov de 1996

Explosão urbana ameaça a Bacia da Guarapiranga
Ocupação cresce 23% em sete anos, mapas mostram ainda que 65,2% da mancha urbana na bacia estão localizados em áreas inadequadas

'O poder público poderia orientar a ocupação para impedir que ela se desse em áreas desfavoráveis'
(De João Paulo Capobianco, do Instituto Socioambiental)

Ubiratan Muarrek

A bacia da Guarapiranga um conglomerado de rios, córregos e nascentes que desembocam na represa na Zona. Sul de São Paulo assistiu a uma expansão urbana de 23% entre 89 e 96.
Além disso, 65,2% da mancha urbana que se espalha em sete municípios estão localizados em áreas com "sérias" ou "severas" restrições à ocupação urbana: encostas íngremes, várzeas e aluviões. Apenas 7,7% da ocupação estão na chamada categoria "favoráveis" aos assentamentos.
Os dados constam de estudos realizados dentro do Projeto Ecoscambio, que reuniu organizações não-governamentais brasileiras e italianas para elaborar diagnóstico da bacia.
A partir de fotos feitas via satélite e do cruzamento de dados, foram elaborados doze mapas com várias faces da região, elaborados pelo Instituto Socioambiental, uma das ONGs que participam do projeto.
Análises criticas são obtidas da interpretação de mapas, como o que compara a expansão urbana entre 89 e 96 (veja nesta página). "Além do processo acelerado de ocupação, o que não é recomendável a um manancial, há o enorme agravante da falta de planejamento", diz João Paulo Capobianco, secretário-executivo do Instituto Socioambiental.
Os mapas e estudos revelam que; de toda a Bacia da Guarapiranga, apenas 5% da área são considerados favoráveis à ocupação urbana. Destes, cerca de 14,5% estão urbanizados. "O poder público poderia orientar a ocupação para impedir que ela se desse em áreas desfavoráveis", diz Capobianco.
São várias as conseqüências da ocupação irracional. Há remoção da cobertura vegetal: os terrenos e vias de acesso ficam com solo exposto, sem trabalho de captação da água da chuva. "Toda a água que cai encontra solo nu", explica Capobianco. "A água escorre e atinge rios e a represa, carregando lixo e material tóxico."
Há também assoreamento e erosão: a água que cai "desce" com mais velocidade, carregando junto a terra. Os córregos e a represa ficam, assim, mais "rasos", com o depósito de terra no seu leito.
Como muitos dos loteamentos são irregulares, não há coleta de lixo e tratamento de esgoto, o que provoca a poluição da bacia.
"Municípios como Itapecerica da Serra, Embu e Embu-Guaçu têm lixões dentro da própria bacia", explica Maria José Azevedo Marcondes, ex-coordenadora do Programa Guarapiranga da Secretaria Estadual do Meio Ambiente. "Mas o tratamento é insuficiente e irregular. Na área da bacia correspondente a São Paulo, não há lixões, mas boa parte do lixo é jogada em córregos."
As conseqüências dos poluentes e resíduos sólidos jogados na bacia são sérias. "Há perda de oxigênio dissolvido na água, aumento de bactérias e protozoários e mineralização da matéria orgânica, o que induz à proliferação de algas e mosquitos", diz Aristides Almeida Rocha, professor titular da Faculdade de Saúde Pública da USP.
Os prejudicados não são só os peixes. "A água fica com cor, sabor e cheiro putrefatos", diz Rocha. "Há aumento de microrganismos que causam doenças como disenteria e micose. O custo de tratamento da água se eleva muito. E a população sente o efeito do tratamento no gosto de cloro da água que recebe."

Informações reunidas
Diagnóstico servirá de base para intervenções

Produzido em parceria com ONGs que atuam na Guarapiranga, o diagnóstico da bacia deverá servir de base para intervenções na região.
"A população local nem sabe quais as características da área onde mora", diz Mauro Scarpinatti, secretário geral da ONG Espaço, que atua na região em questões de educação e ambientais desde 86.
"No grosso das áreas irregulares, a população foi para lá empurrada, excluída. Mesmo os formadores de opinião, como professores, têm uma vaga noção da importância da região para São Paulo".
No que seria uma segunda fase do projeto, a prioridade é para a conscientização da população da bacia. Num primeiro momento, as informações estarão disponíveis em cerca de 32 organizações não-governamentais locais, que realizarão seminários com a população.
"Queremos mais: levar essas informações para as escolas, associações de moradores e até mesmo igrejas que proliferam na região", diz Mauro Scarpinatti, que pensa até numa exposição ambulante e cartazes em pontos de ônibus, patrocinados por uma eventual parceria com a iniciativa privada - a um custo total de R$ 200 milhões. (U.M.)

Organizações italianas apóiam projetos
Ajuda de US$ 2,5 milhões

Idealizado durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente', à ECO-92, no Rio de Janeiro, o Projeto Ecoscambio -- cooperação entre organizações não-governamentais brasileiras e italianas -- prevê estudos e intervenções em cinco áreas do Brasil.
Além da Bacia da Guarapiranga, estão em andamento levantamentos na Reserva Extrativista de Ouro Preto (Rondônia), Parque Nacional da Serra da Capivara (Piauí), Parque Nacional da Chapada Diamantina (Bahia) e Parque São Bartolomeu (área metropolitana de Salvador).
O custo total do projeto, para os primeiros três anos, corresponde a US$ 2,5 milhões, financiados pelas instituições italianas COCIS e Legabiente. Foram liberados, até agora, re cursos para a primeira fase do projeto nas cinco áreas de atuação no País, num total de US$ 330 mil.
Para a realização do diagnóstico da Bacia do Guarapiranga, as ONGs brasileiras receberam, até agora, US$ 35 mil. Foram elas: Fundação SOS Mata Atlântica, Instituto Vitae Civilis, Espaço - Formação, Assessoria e Documentação, CESMA, SOS Guarapiranga, Instituto Socioambiental e Sociedade Ecológica do Embu. O financiamento da segunda fase do Projeto- Ecoscambio, de apoio a projetos com ação sobre problemas identificados nas cinco regiões, está em fase de negociação.(U.M.)

Bacia engloba sete municípios
Milhares de pequenos rios

Segundo ambientalistas, um dos principais problemas envolvendo a Bacia da Guarapiranga é justamente de enfoque: a visão sobre ela e seus problemas seria por demais "paulistana", na medida em que 90% da área da represa Guarapiranga estão localizados no perímetro de São Paulo.
A Bacia Guarapiranga, no entanto, é mais que a represa. E formada de "milhares" de rios, riachos e córregos que se entrelaçam e se espalham em sete municípios, numa área total de 636,98 krW.
"Isso implica uma complexidade enorme de gestão", diz João Paulo Capobianco, do Instituto Socioambiental. "A qualidade da água da represa em São Paulo depende de riachos e nascentes que estão em municípios relativamente distantes, como São Lourenço ou Cotia".
Ter uma visão "espacial" da bacia seria o primeiro passo para identificar a real dimensão dos problemas e a abrangência da questão.
"Antes, cada prefeitura dos municípios da bacia tinha um mapa", diz Mário Mantovani, do SOS Mata Atlântica. "As informações eram conflitantes e muitas não correspondiam à real situação da área envolvida." (U.M.)

JT, 05/11/1996, Geral, p. 18A

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