VOLTAR

Exploração de madeira liga juiz a narcotraficante

O Liberal-Belém-PA
06 de Jan de 2003

O procurador da República, Ubiratan Cazetta, não acredita que a relação do juiz Licurgo de Freitas Peixoto com o narcotraficante Leonardo Dias Mendonça - divulgada, com exclusividade, na edição de ontem de O LIBERAL - seja motivada pelo tráfico de cocaína, mas por questões relativas à exploração e ao comércio de madeira. É que aquela região possui uma grande quantidade de mogno e são muitos os casos levantados pelo Ministério Público Federal de magistrados da Justiça Comum que concederam decisões irregulares nessas situações, apesar do assunto ser de competência da Justiça Federal. O procurador especula que a madeira seja o segundo maior negócio de Leonardo, utilizado para lavar o dinheiro do tráfico. A presença dele, que é um dos maiores criminosos do País, no Pará, já é de conhecimento do MPF, há alguns anos.

Na matéria de ontem foi divulgado um texto escrito à mão e assinado por Licurgo, no verso de uma nota promissória, referente à dívida de R$ 20 mil mantida com o advogado Mário Pinto da Silva e datada de 28 de outubro do ano passado, em que o juiz pede amigavelmente a "Léo" que providencie o pagamento. Em entrevista concedida pelo advogado, foi confirmada a identidade do citado "Léo", como sendo do narcotraficante preso no final do ano passado. Inclusive, o próprio Mário Pinto da Silva disse ter encontrado com Leonardo, na companhia do juiz, para discutir o pagamento do débito.

Ubiratan Cazetta disse que é de conhecimento do MPF que Leonardo Dias Mendonça circula em São Félix do Xingu, há alguns anos, onde constuma promover rodeios, bem como no município de Tucumã, onde possui uma fazenda. "Nos últimos anos, já com o Licurgo e o Deliane (juiz Francisco Deliane, que também atuou na comarca de São Félix do Xingu e acabou perdendo o cargo em processo administrativo disciplinar do TJE, também acusado de corrupção) passou a ocorrer com freqüência naquela comarca a concessão de decisões irregulares em questões relativas a madeira. Investigamos vários incidentes desse tipo", conta.

No Sul do Pará Leonardo Mendonça costuma manter negócios com Wilson Torres, que ficou conhecido por se apropriar de uma área dos índios Paracanã, conhecida como Apyterewa, no início dos anos 90. O narcotraficante tinha uma construtora que dominava as licitações de diversas prefeituras do Sul do Pará, principalmente para a construção de estradas custeadas pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

Mas o procurador esclarece que o MPF não tem competência para processar o juiz Licurgo, apesar do seu envolvimento com madeira e o narcotraficante - já que o narcotráfico também é assunto de competência federal -, mas somente a Procuradoria Geral de Justiça do Pará.

Administrativo - A presidente do Tribunal de Justiça do Pará, desembargadora Climeniè Pontes, disse ontem que desconhecia a ligação do juiz Licurgo com Leonardo Mendonça. Ela ressaltou que o juiz já está afastado do cargo, desde o início de 2001, e responde a processo administrativo disciplinar, pois é acusado de envolvimento em corrupção quando esteve à frente da comarca de São Félix do Xingu, em 1999. Climeniè acredita que o processo seja julgado no início deste ano. A penalidade mais grave que pode ser aplicada ao magistrado é a aposentadoria compulsória, sendo que a perda do cargo só é possível com a interposição de uma ação criminal pelo Ministério Público do Estado.

Licurgo liberava despachos favoráveis em troca de parte dos honorários de advogados

No processo administrativo, Licurgo é investigado por comandar um grupo de advogados somente para o qual liberava despachos favoráveis em troca de uma parte dos honorários desses profissionais. Também é apurada a apropriação ilegal da serraria "Rio Fresco" - cujo dono, Ita Alves de Oliveira, respondia a ação de execução de autoria do ex-proprietário, que cobrava o pagamento dos 30% restantes do valor da venda do estabelecimento. A cobrança era feita através da nomeação, como fiel depositário, do escrivão não concursado Manoel Alexandre Ferreira, o "Maninho", que, por interferência do magistrado, teria administrado a serraria, inclusive, vendendo as toras de madeira que lá se encontravam e outros bens da empresa e impedindo o acesso de Ita, que residia no local.

Para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Pará, Ophir Cavalcante Júnior, a relação de Licurgo com o narcotraficante é preocupante e não surpreende diante da "biografia" do magistrado. A própria OAB, segundo ele, chegou a remeter denúncias de corrupção contra ele à Corregedoria Geral de Justiça. Mas, Ophir reclama que a apuração está demorando: "Essa demora prejudica a imagem do Judiciário, que tem que dar uma resposta à sociedade o quanto antes".

Advogado - Ophir Cavalcante Júnior anunciou ontem que abrirá um processo ético-disciplinar contra o advogado Mário Pinto da Silva, já que, na notícia publicada ontem, ele afirma que os R$ 20 mil cobrados do juiz correspondiam à metade do valor de um processo de execução movido por ele contra um antigo cliente - o grileiro de terras José Marinho Gomes, falecido há cerca de dois anos, num quarto de hotel, em Belém -, relativo a honorários devidos, cujos autos desapareceram do cartório de São Félix à época em que o escrivão era "Maninho" e o titular da comarca, Licurgo Peixoto.

"Não é recomendável esse tipo de relação do juiz com a parte. Há uma previsão legal para se cobrar honorários", reprovou. Ele explicou que, em caso de perda de processo, o meio correto é a restauração dos autos, cabendo, ainda, uma ação de indenização por danos contra o Estado, o qual, por sua vez, poderia cobrar do juiz o direito de regresso.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.