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Estatísticas (in)sustentáveis da CoP-21

Valor Econômico, Opinião, p. A13
Autor: ATHAYDE, Eduardo
29 de Jun de 2015

Estatísticas (in)sustentáveis da CoP-21
A indústria solar fotovoltaica é a área que mais emprega em todo o mundo, com 2,5 milhões de pessoas. A bioenergia foi a segunda em crescimento global, com 1,8 milhão de pessoas empregadas, ficando o Brasil na liderança com 845 mil postos de trabalho

Eduardo Athayde

Primeiro Estado americano a conquistar 5% de sua eletricidade exclusivamente a partir de energia solar, a Califórnia, com um PIB de US$ 2,5 trilhões, já estabeleceu o objetivo de ter 50% de energias renováveis em 2030. O Havaí fixou meta para ser 100% renovável em 2045. Onze Estados americanos geram mais de 10% da sua eletricidade a partir de fontes de energia renováveis não-hidro; três deles - Iowa, Dakota do Sul e Kansas - superam os 20%. Se a fonte hídrica for incluída, quatro Estados - Idaho, Washington, Oregon e Dakota do Sul - excedem 70% de fontes renováveis.
Estatísticas confiáveis ajudam a sintonizar investimentos e prevenir prejuízos, públicos e privados. Nos Estados Unidos, onde custos do esgotamento dos ecossistemas e da poluição são medidos, os impactos na saúde pública já ultrapassam US$ 1 trilhão por ano, 6,2% do PIB americano, informa o WWI-Worldwatch Institute. Ameaças ocultas para a sustentabilidade, os efeitos das flutuações de preço da energia fóssil, alternativas para o crescimento econômico perpétuo num planeta finito e como governos nacionais podem gerir a transição são questões analisadas no relatório do WWI, Estado do Mundo 2015, inédito no Brasil.
Enquanto estatísticas chinesas omitem custos dos impactos nos ecossistemas hídricos e climáticos, a Noruega inova investindo na rota de descarbonização. O correspondente do New York Times em Pequim, Edward Wong, escreveu: "Os residentes das cidades chinesas e um número crescente de regiões rurais, questionam a segurança do ar que respiram, a água que bebem e os alimentos que ingerem. É como se eles estivessem vivendo no equivalente chinês a áreas de desastre nuclear de Chernobyl ou Fukushima".
Alinhado com marcos regulatórios da descarbonização o parlamento norueguês votou, em 05 de junho, dia mundial do meio ambiente, a favor da mudança nos investimentos do fundo de pensão público, de US$ 890 bilhões - o maior fundo soberano do mundo - determinando a venda de suas participações de bilhões de dólares em ações de empresas cujos negócios dependam de pelo menos 30% de carvão, para focar no setor verde.
Atentos à tendências da 21ª Conferência do Clima (CoP-21) da ONU, que reunirá o mundo em Paris entre 30 de novembro e 11 de dezembro de 2015, os noruegueses, que já investem no Fundo Amazônia gerido pelo BNDES, confrontam as impactantes estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) de subsídios diretos e indiretos de US$ 5,3 trilhões anuais para os combustíveis fósseis; com a força dos ativos de US$ 59 trilhões sob gestão do PRI (Principles for Responsable Investments - unpri.org), avançando taticamente no jogo econômico da sustentabilidade.
Posicionando-se em relação aos efeitos esperados da CoP-21, grandes corporações transnacionais como Google, Apple,
Amazon e General Motors adotaram ações climáticas nas estratégias empresariais de longo prazo. Cerca de 40 países, incluindo os 28 Estados membros da União Europeia, EUA e México, já apresentaram suas "contribuições nacionais", ou seja, seus compromissos de adaptação às mudanças climáticas. O documento brasileiro, muito aguardado em função da liderança do país nos ativos ambientais, ainda não foi apresentado.
Transformando tradição em inovação, o valor adicionado pelo setor de bens e serviços ambientais, chamado setor verde, do Reino Unido, contribuiu com US$ 40 bilhões para a economia em 2012. Entre 2013 e 2014 a produção total na
economia verde aumentou para US$ 84,6 bilhões, gerando 357 mil empregos, informa o Office National of Statistics (ons.gov.uk), que coleta, analisa e interpreta dados.
Registrando um crescimento de 18% em relação ao ano anterior, 2014 atingiu o recorde global de 7,7 milhões de postos de trabalho na indústria de energia renovável, principalmente solar e eólica. O primeiro lugar no ranking foi da China, com 3,9 milhões de empregos; o Brasil ficou no segundo lugar, com 934 mil postos de trabalho e os Estados Unidos na terceira colocação, com 724 mil registros. Neste universo, a indústria solar fotovoltaica é a área que mais emprega em todo o mundo, com 2,5 milhões de pessoas. A bioenergia foi a segunda em crescimento no mundo, com 1,8 milhão de pessoas empregadas, ficando o Brasil na liderança com 845 mil postos de trabalho. A eólica, terceira colocada, ultrapassou a marca de 1 milhão de empregos.
Destacado por ter 16% do biopotencial do planeta, o Brasil, com baixo investimento em ciência e tecnologia, ainda desconhece o real valor dos serviços ambientais produzidos pela Amazônia, calculados pelo Instituto Nacional de Ciência eTecnologia dos Serviços Ambientais da Amazônia (INCT), sabe que a floresta Amazônica lança diariamente na atmosfera cerca de 200.000 m3 de água por segundo. É um volume equivalente à vazão do rio Amazonas no Oceano Atlântico. Por meio da transpiração das plantas e da evaporação dos rios, forma os chamados rios voadores que, carregados pelo vento, irrigam o PIB da agricultura e da indústria no Sudeste, refletindo no Índice de Sustentabilidade Empresarial da BM&FBovespa.
Na cidade de São Paulo - consumidora, receptora e difusora desses fatos e dados globais, demograficamente inchada e comprometida na capacidade de reabastecimento hídrico, estatísticas informam que o gasto médio direto de água é de 120 litros/ pessoa/dia, não computando o uso indireto de água (per capita) no consumo de produtos e serviços: ovo, 196 litros/unidade; batata, 287 litros/Kg; pão, 1.608 litros/Kg; macarrão, 1.849 litros/kg; arroz, 2.497 litros/Kg; calca jeans, 11.000 litros/unidade; carro, 400.000 litros/unidade (média). Ajudando na estatística hídrica paulistana, dados oficiais revelam que, só em 2014, 186 mil carros (509 por dia) foram acrescentados à frota urbana. As reuniões da ONU são chamadas de "Conferência das Partes" CoPs, porque, para assumirem status global, os dados têm que ter antes o interesse local. Baseado nisto, vale a pergunta: quantos paulistanos têm, pelo menos, uma calça jeans? A que custo hídrico?

Eduardo Athayde é diretor do WWI-Worldwatch Institute no Brasil. eduathayde@gmail.com.

Valor Econômico, 29/06/2015, Opinião, p. A13

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