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Estamos no pior cenário em 650 mil anos, mostra estudo

OESP, Vida, p. A27
17 de Set de 2006

Estamos no pior cenário em 650 mil anos, mostra estudo
Dados preliminares mostram a maior concentração de gases do efeito estufa

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que reúne milhares de especialistas do mundo, prepara um novo relatório sobre o tema para o próximo ano, o quarto de sua história. A expectativa é que o cenário proposto pelo grupo seja ainda mais cinzento e quente do que o último, lançado em 2001.

Recentemente uma cópia preliminar do documento vazou quando um comitê do Senado americano a tornou disponível na internet. Ela traz sinais inequívocos de que a humanidade enfrentará tempos difíceis nas próximas décadas, e que evitá-los pede ações imediatas de adaptação e mitigação tomadas por todos os países.

Ela diminui o grau de incerteza da variação de temperatura média global. Também diz que a mudança acontecerá antes do que era previsto. As concentrações de dióxido de carbono, metano e outros gases do efeito estufa são as mais altas em pelo menos 650 mil anos. E a causa é indubitavelmente a ação humana, que alterou paisagens e aumentou a taxa destas substâncias na atmosfera a partir da Revolução Industrial, que promoveu a queima de combustíveis fósseis como o petróleo.

Então, se antes o painel falava em um acréscimo de 1,4oC a 5,8oC até 2100, agora indica uma variação mais estreita, entre 2oC e 4,5oC. Só que todas as mudanças são previstas num prazo mais curto: 1oC a mais em 15, não 20 anos; 3oC em 25, não 40 anos; e 5,8oC em 60, não 90 anos. "Ter 1oC a mais é realidade para 2015", diz o pesquisador Eduardo Assad, da Embrapa Informática.

Em 100 anos, se não houver controle, o aumento poderia chegar a absurdos 9oC extras, afirma o meteorologista Hilton Silveira Pinto, da Unicamp, que tem acesso ao documento. "As previsões anteriores do IPCC, feitas no terceiro relatório, estão totalmente superadas."

Eventos climáticos extremos, como furacões, secas e ondas de calor, vão se tornar mais freqüentes e recordes continuarão a ser batidos - até agora, cinco dos seis dos anos mais quentes já registrados aconteceram entre 2001 e 2005, com picos em 1998 e 2005.

O nível dos oceanos poderia subir entre 14 e 43 centímetros até o fim do século, e o aumento para os 200 anos seguintes seria o dobro disso por causa do derretimento de geleiras continentais e polares. Nesta semana, pesquisadores da Nasa demonstraram que o Ártico perdeu 700 mil quilômetros quadrados de gelo só entre 2004 e 2005, um encolhimento de 14% em relação ao período anterior. Nos outros anos, a taxa era de 0,7%.

A alteração dos resultados deve-se a dados mais robustos, produzidos desde então por cientistas de todo o mundo. Os modelos climáticos, que projetam as tendências de acordo com variáveis como concentração de gás carbônico, foram refinados desde o último relatório do IPCC. Um exemplo do detalhamento é que há mais chance de que a temperatura suba 2,9oC - há 5% de probabilidade de o valor ser menor do que 4,5oC.

Segundo Pinto, apesar de os fatos indicarem com mais clareza o que acontece com o planeta, há perguntas cruciais que ainda não foram plenamente respondidas pelo painel: as alterações fazem parte de um processo natural, agravado pela ação humana? Qual é a durabilidade deste efeito, depois que ações de controle das emissões se tornarem efetivas? Quando começa a próxima era glacial? São estes os desafios do grupo para o quinto relatório.

INÉRCIA

Boa parte das alterações acontecerá de qualquer jeito por causa da quantidade atual de gases do efeito estufa na atmosfera, especialmente aquelas de curto prazo, mesmo que diretrizes restritivas aplicadas à produção e à emissão dos gases do efeito estufa fossem implantadas imediatamente.

O Protocolo de Kyoto, acordo global para atacar o problema, é sabidamente um primeiro e tímido passo, com metas muito aquém do necessário para resolver a questão. O principal emissor do mundo, os Estados Unidos, não participa do esforço. Debates sobre medidas mais rígidas caminham num ritmo mais lento do que o processo de aquecimento global.

Em novembro, os membros da Convenção do Clima das Nações Unidas se reúnem em Nairóbi (Quênia) para debater o futuro do planeta. O quarto relatório, apesar de não publicado, fará certamente parte das negociações internacionais.
C.A.

OESP, 17/09/2006, Vida, p. A27

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