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Escolas do Parque Indígena Xingu têm dificuldades para regularizar merenda adquirida nas aldeias

ISA
Autor: Maria Cristina Toncarelli
30 de Nov de 2000

O direito à uma alimentação diferenciada, que exclua alimentos industrializados, é ameaçado por entraves burocráticos.

Em outubro deste ano, uma série de reuniões realizadas no PIX (Parque Indígena Xingu) envolveu a diretoria da Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), diretores indígenas, professores representantes das escolas municipais, a equipe do ISA e uma educadora da SEDUC-MT (Secretaria de Educação do Mato Grosso), com o objetivo de organizar internamente as escolas do Parque, promover a interlocução dos agentes e instituições envolvidos nesse processo e o acompanhamento das lideranças na gestão das escolas.

Para consolidar o gerenciamento da educação escolar, foi criada a Coordenação das Escolas do PIX, da qual participam a ATIX, o ISA, a SEDUC-MT e os diretores das escolas. Ainda serão convidados a participar desta Coordenação representantes do Ministério de Educação, as Secretarias Municipais de Educação de Querência, Feliz Natal e Gaúcha do Norte, da FUNAI e do Conselho de Educação Escolar Indígena de Mato Grosso. Espera-se entre o final de 2000 e início de 2001 seja realizada uma reunião com todas as instituições envolvidas visando assegurar o cumprimento dos direitos das populações indígenas à escola diferenciada, assegurados na legislação.

Nesse contexto, foi consenso entre professores e lideranças a importância de manter e valorizar a alimentação tradicional, evitando que a escola incentive a entrada de alimentos industrializados. Por isso, a merenda é adquirida nas próprias comunidades e os diretores estão sendo capacitados para a distribuição dos recursos da merenda entre as escolas e prestação de contas à SEDUC-MT.

Não obstante, uma das dificuldades encontradas pelas comunidades no gerenciamento das escolas foi a recusa da prestação de contas dos recursos da merenda, primeiramente pelo FEE/SEDUC-MT e, depois, pelo Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT). A maneira como tem sido organizada a prestação de contas - apresentação de RPAs assinados pelas pessoas que prepararam os produtos consumidos nas escolas (peixe assado, beiju, mingau, frutas etc) - foi considerada incorreta, por se tratarem de recibos de prestação de serviço e não recibos de produtos ou bens de consumo. Mas essa foi a alternativa encontrada pela equipe de educação escolar indígena e a Coordenadora do Núcleo de Alimentação Escolar da SEDUC-MT para viabilizar a aquisição de produtos nas aldeias.

Talvez esse problema possa ser contornado com a substituição dos RPAs por recibos simples ou, então, a elaboração de um relatório financeiro, contendo informações sobre os valores recebidos e os gastos com a compra de alimentos tradicionais. Cabe lembrar também que a maioria dos fornecedores de alimentos das escolas não possui documentos pessoais.

Essas propostas visam flexibilizar as exigências burocráticas e adequar a aquisição de alimentos e a prestação de contas à realidade das escolas xinguanas. Caso contrário, de acordo com as regras estabelecidas pelo FNDE/PNAE, as escolas acabariam sendo obrigadas a comprar alimentos industrializados, o que não corresponde à expectativa das comunidades indígenas.

A resolução desse problema da merenda pode ser uma oportunidade do FNDE/PNAE e do MEC reestruturarem os programas de atendimento às escolas indígenas no sentido de contemplarem suas especificidades. Essa iniciativa deve ser ampliada para todos os programas do MEC, tais como a TV-Escola e o programa de materiais didáticos para bibliotecas escolares, por exemplo. Embora a legislação garanta o direito à especificidade no atendimento às escolas indígenas, na prática isso é inviabilizado por entraves burocráticos, pois as escolas indígenas são obrigadas a cumprir as exigências usadas para as escolas não-indígenas.

As escolas xinguanas

As escolas do PIX funcionavam, até 1997, ligadas a seis municípios da região do entorno do Xingu. Devido à distância de alguns municípios do PIX e ao descontentamento de muitas comunidades com o atendimento às escolas, lideranças e professores indígenas reivindicaram junto ao Estado de Mato Grosso a estadualização das escolas. Durante Assembléia promovida pela ATIX, lideranças e professores optaram pela estadualização de 21 escolas, estipulando três escolas centrais e as demais escolas como salas anexas, e a municipalização de outras 11 pelos municípios de Gaúcha do Norte, Querência e Feliz Natal.

Nas escolas estadualizadas, foram escolhidos três diretores entre os professores indígenas, que vêm se capacitando no gerenciamento do processo de administração escolar. Os professores indígenas das escolas vinculadas aos municípios estão tentando se organizar visando unir suas escolas e instituir diretores indígenas para obterem maior autonomia em relação à administração de recursos para as escolas.

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