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Entidades manifestam apoio aos Xukuru

Diário de Pernambuco-Recife-PE
Autor: Marco Bahé
19 de Set de 2001

Índios avançam na luta contra construção de megasantuário em Cimbres, projeto defendido por Diocese
Os índios Xukuru conseguiram conquistar aliados valiosos na luta contra a implentamentação do turismo religioso dentro de seu território. Numa reunião realizada ontem, na aldeia São José, representantes do Ministério Público Federal, da OAB, da Comissão de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, da Câmara dos Deputados e de ONGs manifestaram apoio para preservação da área e da cultura indígena.A ação se contrapõe à intenção da Diocese de Pesqueira, da Prefeitura do município e do Governo do Estado de instalar um "megasantuário" para adoração de Nossa Senhora das Graças, na área pertencente à aldeia do Guarda, dentro da reserva. Anualmente, cerca de 30 mil romeiros visitam o local onde a Santa teria aparecido, em 1936.De quebra, os líderes ganharam um round na luta contra a divisão da nação Xukuru. No dia 17 de agosto, representantes de três das 23 aldeias iniciaram um movimento dissidente. O movimento é encabeçado por Expedito Alves Cabral, o Biá , que apóia o novo santuário. Segundo o cacique Marcos Luidson, Biá se aliou a empresários de Pesqueira, que desejam desenvolver o turismo religioso no local. "Ele foi indicado pelo novo prefeito para a Secretaria de Assuntos Indígenas, criada à nossa revelia", acusa Luidson.O cacique denuncia que a Prefeitura, junto com a Fundação de Desenvolvimento Municipal (órgão do Estado), inicou a construção de uma estrada que facilitaria o acesso ao local do novo santuário. A pedido dos líderes indígenas, a obra foi embargada pelo MP. Os representante dos órgãos federais e os parlamentares se reuniram também com o prefeito João Alves Machado Tenório (PFL). "Discutimos o santuário e da saída dos posseiros que continuam ocupando terras Xukuru já homologadas pelo Governo federal", disse o deputado Fernando Ferro (PT/PE).Para o advogado do Centro Indigenista Missionário (Cimi), Sandro Lôbo, o projeto não toca na discussão sobre a retomada das terras pelos índios. "Empresário e representantes do Governo estão incentivando a divisão interna do povo Xukuru, natentativa de implementar esse projeto". Lôbo também diz ser impossível a criação de uma nova tribo dentro da reserva por vários fatores. Entre eles estaria o fato de Cimbre (uma das aldeias dissidentes) ter sido o local do primeiro aldeamento e do início da luta Xukuru.Questão polêmica entre religiososA notícia de que a Igreja teria comprado terras dentro da área dos Xukuru criou uma polêmica. Enquanto a Diocese de Pesqueira patrocina o projeto de construção de um santuário para Nossa Senhora das Graças, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) condena a prática. A divergência colocou em atrito autoridades religiosas do Estado. As terras, onde teria havido uma aparição da santa, ficam na aldeia Guarda e têm sido negociadas desde 1990, quando o frei italiano José Maria Del Giudice chegou a Pesqueira. Os índios falam que se trata de 360 hectares, mas o frei rebate. "A área que adquirimos é de 70 hectares". Giudice reconhece que o resto foi arrendado por 20 anos como parte do pagamento ao antigo ocupante."Isso é ilegal e viola o usufruto dos índios. Tivemos uma reunião com o bispo de Pesqueira, dom Bernardino Marquió, em 1998. O então bispo de Garanhuns pediu que a diocese local deixasse de apoiar as negociações e interviesse junto a frei José", diz o advogado do Cimi, Sandro Lôbo. Dom Dino, como é conhecido o bispo de Pesqueira, diz que "a maioria dos índios querem o santuário, porque eles serão beneficiados com a venda de seus materiais aos turistas. Mas os líderes estão sendo manipulados pelo Cimi". Ele fala que a Diocese está disposta a abrir mão do projeto. "Vamos doar a terra para os índios e cancelar a construção do santuário."Funai nega formação de nova triboO administrador da Fuunai no Estado, Moacir Santana, disse ontem aos líderes Xukuru que o órgão não reconhece a formação de uma nova tribo dentro do território demarcado. A declaração é um duro golpe nas intenções de membros das aldeias de Cimbres, Cajueiro e Guarda, que haviam decretado a autonomia das outras 20 comunidades que compõem a maior nação indígena de Pernambuco. Santana também negou que houvesse convênio celebrado entre a Funai e os dissidentes, conforme estes divulgaram.Ele explicou que o reconhecimento oficial de uma tribo depende de um laudo antropológico, a exemplo do que ocorreu com os Xukuru. "O que está ocorrendo são opiniões diferentes sobre as prioridades na aplicação dos recursos da União. Os líderes têm que chegar a um acordo sobre como resolver esse problema".O cacique Marcos Luidson mantém a versão de que houve fraude no abaixo-assinado apresentado pelos dissidentes como prova da vontade dos moradores das aldeias. "Muita gente nos disse que eles prometiam construir casas com banheiro e esgoto, caso o povo assinasse. Também soubemos que turistas e não- índios também assinaram o documento". O cacique pediu à Funai uma consulta legítima aos moradores das aldeias.Caso terá delegado especialA única medida efetiva anunciada ontem, na reunião dos índios Xukuru com representantes do Governo federal e da Câmara dos Deputados, foi a indicação de um delegado especial da PF que trabalhará exclusivamente nas investigações dos assassinatos do cacique Xicão (em 1998) e do chefe da aldeia Pé-de-Serra, Chico Quelé (em 23 agosto). O delegado Marcos Contrim, que atuava na sede regional da PF em Salgueiro, foi designado para a tarefa. Contrim disse que a elucidação dos crimes é uma questão de honra para a PF. "A falta de esclarecimentos sobre a autoria das mortes incomoda a Polícia. Devemos respostas à sociedade".A indicação de um delegado especial foi bem aceita pelos índios, que não deixaram, porém, de tecer críticas. "O povo daqui, a Justiça e a Polícia sabem quem mandou matar Xicão. Só não prenderam até agora os culpados porque não quiseram", alfinetou o vice-cacique Zé de Santa".Para a advogada Maria José do Amaral, indicada pela OAB para acompanhar as investigações, o novo delegado tem poucas chances de chegar aos autores da morte do cacique Xicão. "Evistiram várias oportunidades desde 1998 para apontar os autores, porque o inquérito deixa claro que o crime ocorreu por causa da luta pelas terras contra os fazendeiros. Passado esse tempo, porém, as provas foram se perdendo". Ela, no entanto, acha que a morte de Chico Quelé pode ser qualificada como um crime de continuidade, como seqüência do assassinato de Chicão. "Por ser mais recente, há chances de o crime ser elucidado. Só falta vontade política".Maria José também denuncia que sofreu uma ameaça de morte depois que foi indicada para acompanhar as investigações. "Em 13 de maio, recebi uma ligação originada de Nova Iguaçu, no Rio, na qual um homem que se identificou como do Comando Vermelho falava que eu deixasse de contrariar os interesses de amigos seus em Pesqueira".

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