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18 de Mar de 2011
Qualquer abordagem sobre o polêmico desmatamento da área da Serra Vermelha deve iniciar-se sob a égide do Código Florestal Brasileiro, segundo a Lei n 4.771, de 15 de setembro de 1965, que no seu art. 1o prescreve: As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.
Um cidadão não pode, a seu "bel prazer", desmatar as florestas que cobrem o solo de suas propriedades, sem que esteja autorizado pelos órgãos competentes, os quais emitirão licenças, estabelecendo limites, conforme cada caso, atendendo as normas legais específicas, inspiradas em conteúdo constitucional, em especial no Código Florestal Brasileiro.
No caso do carvão produzido pela queima da floresta nas circunvizinhanças da Serra Vermelha, tendo por destino habitual os auto-fornos das siderúrgicas de Minas Gerais, o Código Florestal expressa com toda clareza: Art. 21. As empresas siderúrgicas, de transporte e outras, à base de carvão vegetal, lenha ou outra matéria prima florestal, são obrigadas a manter florestas próprias para exploração racional ou a formar, diretamente ou por intermédio de empreendimentos dos quais participem, florestas destinadas ao seu suprimento.
O Dr. Macário Oliveira, advogado, ex-procurador do INTERPI (Instituto de Terras do Piauí), profundo conhecedor do assunto, em artigo publicado no dia 09/02/11 no Jornal Diário do Povo, externa sua indignação sobre a devastação das matas na Serra Vermelha.
"Agora que o Tribunal de Justiça do Piauí, através da lucidez de Edvaldo Moura e de seus companheiros, resolveu enfrentar o problema através de uma vara especializada em questões fundiárias, é de suma importância que isso aconteça a fim de que não fiquemos a mercê de grileiros, dos devastadores de florestas, como vem ocorrendo com a J.B. Carbon, que está devastando imensas áreas dos Municípios de Morro Cabeça no Tempo e de Redenção do Gurguéia, produzindo carvão vegetal, agredindo todo o ecossistema da área da Serra das Confusões e, principalmente, na Serra Vermelha, detentora esta de ecossistema esplendoroso. O que causou espécie e continua ainda repercutindo é ter o Estado do Piauí, através do órgão competente, em determinado momento concedido licença para que fosse procedido esse remanejamento florestal da maneira mais perversa possível. As fotografias publicadas na imprensa mostrando a carvoaria que lá se implantou, demonstra ad nauseam, a monstruosidade que se está cometendo naquela área. São ao todo, 109.904 hectares de mata que estão sendo devastadas por cidadãos que não tem nenhum compromisso com o meio ambiente, que vieram de Balsas no Maranhão, Campo Grande no Mato Grosso do Sul, Vila Boa em Goiás, além de outros. As 36 áreas de terras que formam o Condomínio, estão todas dentro da Serra Vermelha (...) Neste processo da J.B. Carbon, existem coisas de arrepiar e causam espécie a qualquer pessoa menos avisada. Primeiramente, deve ser dito que os sócios da J.B. Carbon não procuraram os cartórios de registro de imóveis na área onde estão localizados os imóveis, para fazer os devidos registros de aquisição de área. Preferiram ir fazer os registros em Gilbués, no cartório do veterano Railon Barreira Seraine, aquele mesmo que, em outras oportunidades abriu seu cartório em Gilbués, no dia 07 de setembro, para registrar uma grilagem do então Prefeito de Monte Alegre do Piauí, Amando Gomes da Silva, que adquirira 3.600 hectares de terra, no Município de Parnaguá e depois vendeu a empresários do sul 11 mil hectares"...
Deixando de lado a questão fundiária, voltemos à verdadeira abordagem que deve merecer a Serra Vermelha. Em artigo publicado recentemente (17.02.11-Diário do Povo) - CONSIDERAÇÕES SOBRE A MATA ATLÂNTICA - Dr. Marcelo Coelho, Procurador Federal, ex-Deputado, ex-Secretario de Meio Ambiente do Piauí, acerta no alvo quando se expressa: "As discussões que vêm sendo travadas entre as diversas instituições governamentais e organizações não governamentais sobre o a existência do bioma Mata Atlântica na região da Serra Vermelha, no sul do Piauí, não podem tirar o foco principal e verdadeiro da questão que é processo brutal de desmatamento para produção de carvão vegetal de uma enorme extensão de terra numa região de biodiversidade riquíssima e formações rochosas de rara beleza, tão bem demonstradas nas fotografias e imagens feitas por André Pessoa e pelo Globo Repórter".
Há muitas teses acadêmicas tentando classificar a vegetação no entorno da Serra Vermelha e em consequência desviando o foco da questão. Variam desde Mata Atlântica; chapada, cerrado; cerradão ou cerradão com vestígio de Mata Atlântica. Tanto faz. O fato concreto é que ali a natureza se exibe de forma exuberante. Na flora, madeiras de leis as mais preciosas: ipê, aroeira, jatobá. Na fauna, tamanduá bandeira, anta, capivara, tatu, peba, veado, caitetu, gambá, seriema, jacu, codorniz, zabelê, araras e tantas outras espécies de aves e pássaros que vivem harmoniosamente nesse paradisíaco ecossistema.
No entanto, o IBAMA concedeu, no ano de 2005, ao grupo empresarial J.B.Carbon, licença para um Plano de Manejo Florestal Sustentado Integrado, permitindo à empresa desmatar 77.947,00 (setenta e sete mil, novecentos e quarenta e sete hectares) para simplesmente produzir carvão da luxuriante floresta ali existente. Por ironia, denominado "Projeto Energia Verde".
Em noticias recentes, o governo Federal anunciou com grande destaque o aporte de R$ 150 milhões de reais para indenização ao Estado do Piauí, sobre as terras que formam o Parque da Serra das Confusões...
Vejamos o contraditório do governo. No caso da Serra das Confusões tomou as medidas mais acertadas protegendo a flora e fauna da região ao longo da serras que formam o Parque. Não se sabe por que, despreza a mesma vegetação na vizinha Serra Vermelha e autoriza a carbonização de suas matas numa área tão imensa, para usufruto de um grupo empresarial.
O projeto Energia Verde ao desmatar com corte "raso" toda a camada vegetal, deixa um rastro de destruição no meio ambiente, atingindo diretamente o reino animal ali existente. Na realidade é a destruição da flora e da fauna. E isso tudo apenas para produzir carvão para os auto fornos das siderúrgicas, que após devastarem grandes áreas do Maranhão e dali proibidas de continuarem na exploração, encontraram abrigo no sul do Piauí.
Estamos vivenciando também, neste momento, grandes desmatamentos nos altiplanos do Cerrados piauienses para dar lugar ao plantio soja, milho e feijão. Nesse caso o enfoque já é diferente.
Para alimentar uma população demais de 6 bilhões de pessoas, o planeta terra vai perdendo sua cobertura vegetal nativa para dar lugar ao cultivo de grãos e expansão da agropecuária. A pressão sobre novas fronteiras agrícolas força a exploração dos cerrados e no caso do Piauí não seria diferente. Acontece que neste caso, parte da biodiversidade se mantém intacta, amparada pela lei que regulamenta as áreas de Preservação Permanente (mata cilar, encostas das serras, etc.) e pela Reserva Legal, que estabelece, em nosso Estado, uma preservação de 30% da mata nativa. Pretende-se com isso, formar corredores ecológicos para sobrevivência do ecossistema. Nada mais justo que os órgãos públicos relacionados ao setor, amparados nos limites da lei, dêem licenças para exploração agrícola no cerrado. E mais, permita que o desmatamento que seria queimado a céu aberto, seja utilizado na produção do carvão vegetal.
Diferentemente da licença liberada para a J.B.Carbon que autoriza o corte raso da mata nativa exclusivamente para produção carvão vegetal, com todas as desvantagens para a natureza e sem nenhum retorno para o erário público, o corte nos cerrados se justifica pela produção de gêneros imprescindíveis para a nossa alimentação.
Há de se perguntar quanto o Estado já arrecadou da exploração do carvão vegetal exportado para as grandes siderúrgicas. Com certeza uma insignificância, um nada, se comparado aos prejuízos causados ao meio ambiente, e quem lucra com tudo isto são grupos empresariais alienígenas, que destroem as nossas matas. O Estado herdará apenas rústicos fornos de barro, em ruínas e a devastação da flora e fauna.
O problema se agrava mais, pois, com a certeza que todo carvão produzido terá mercado consumidor, inúmeras carvoarias clandestinas se instalam. Segundo o Portal Ecol News, a SEMAR -Secretaria de Meio Ambiente do Piauí também tem liberado licença na mesma região: "A Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Piauí (SEMAR) autorizou o funcionamento de uma carvoaria com 570 fornos dentro da área onde está previsto a implantação do Parque Nacional da Serra Vermelha, nos municípios de Curimatá e Morro Cabeça no Tempo, no Sul do Estado. O curioso é que a carvoaria, pertencente ao baiano Edson Rocha, está usando toda a estrutura do projeto energia Verde da empresa JB Carbon, da qual é vizinha e que foi proibida de funcionar porque vinha destruindo uma rica biodiversidade.
O IBAMA e SEMAR não dispõem de infraestrura suficiente para fiscalizar tão imensa área. Com sua sede em Teresina, distante, portanto, mais de 900km do conflito do desmatamento o IBAMA não tem como fazer um acompanhamento sistemático. Basta dizer que dispõe apenas de dois fiscais sediados na região com o encargo de atender 14 municípios, alem do Parque das Nascentes do Rio Parnaíba, este, com área de 729.813 hectares.
Vez ou outra o IBAMA aparece na mídia, flagrando, multando e prendendo algum caçador pela captura de um peba ou tatu. São freqüentes apreensões de caminhões com madeira contrabandeada, cortada ilegalmente - sem a devida autorização - para uso na construção civil. Tudo bem, e é assim que deve proceder um órgão fiscalizador. Mas a pergunta que fica no ar, porque essa mesma zelosa repartição publica liberou e defende intransigentemente o desmatamento de mais de 77 mil hectares de mata nativa apenas para queima em carvão? As conseqüências da destruição do bioma, com o desabrigo de toda a fauna são imensuráveis em comparação ao fragrante de apreensão de um simples tatu, exposto com todo destaque pela mídia. As imensa áreas das carvoarias legais e clandestinas atingem proporções comparáveis às destinadas os parques ambientais Estação Ecológica Uruçui-Una ou Serra da Capivara.
Chamemos, pois a arqueóloga Niede Guidon, para exemplo do que promoveu em São Raimundo Nonato, desenvolver ali um projeto turístico auto-sustentável, com exploração dos sítios arqueológicos existente, preservando todo o ecossistema da região.
Seria a oportunidade de o Piauí vender para o mundo um produto raro, suas belezas naturais, mostrar a flora, a fauna, e o exuberante ambiente, que abrigou no passado os primitivos homens americanos (engenheiro Cid Dias)
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