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Em entrevista exclusiva ao site Coqui, a professora de Antropologia da UFBA, Maria Rosário Gonçalves de Carvalho

COQUI.com.br
Autor: Ugo Maia Andrade** e Ely Souza Estrela
30 de Set de 2003

aborda o processo de "desocultamento" dos índios no Nordeste, denuncia o "fritamento" do ex-presidente da FUNAI - Eduardo Almeida - e defende a retomada da Antropologia clássica pela etnologia indígena*.

Embora avessa a entrevistas, a conversa com a professora Maria Rosário Carvalho transcorreu em clima de fluência e cordialidade. Instada a falar de sua vida pessoal, mostrou-se retraída, dizendo: "Devo confessar, preliminarmente, que sempre tive pejo, e mesmo certo desinteresse, em me eleger como tema, em autoreferir-me, característica que vem se acentuando com o tempo. Assim, sempre fui avessa a confidências pessoais, não confiadas sequer a um 'diário secreto'. O que, pois, posso dizer a um freqüentador desconhecido, a um eventual leitor que essa conversa gravada e depois submetida a uma rápida revisão não consiga revelar, sugerir? O que, afinal, lhe posso dizer de interessante e de modo breve? Talvez que eu possuo - talvez cultive -- um forte sentimento de pertencer ao contexto sertanejo, sentimento esse ensejado pela linha materna, que sou a segunda das filhas de dois funcionários públicos federais que sempre conferiram valor à educação formal e cujo pai, notadamente, tinha certas veleidades intelectuais, e cuja irmã mais velha, falecida algo precocemente, introduziu, e guiou, pela literatura ficcional, da qual se apropriava com voracidade. E, finalmente, que a mãe era uma sertaneja bela, altiva, assustadoramente determinada, mas justa e delicada. Capaz de enfrentar qualquer 'poderoso de plantão' para cobrar um ato injusto, uma atitude mesquinha. Suponho que os três, cada um à sua maneira, contribuíram para forjar o meu caráter. Rendo-lhes, hoje como ontem, o meu tributo, e não tenho pejo em confessar o vazio que deixaram em parte significativa da minha vida".
Nascida em Cícero Dantas e criada em Alagoinhas - cidade com a qual ainda mantém relações pessoais e afetivas - Maria Rosário Carvalho é coordenadora do PINEB (Programa de Pesquisas sobre Povos Indígenas no Nordeste Brasileiro), presidente do conselho diretor da ANAÍ (Associação Nacional de Ação Indigenista) e também da Comissão de Relações Étnicas e Raciais - CRER da Associação Brasileira de Antropologia.
Embora os pais fossem ambos autodidatas, no seio familiar desfrutou de intensa vida intelectual. Da mãe, especificamente, herdou o senso de justiça e a capacidade de enfrentar qualquer "poderoso de plantão", sobretudo se este se colocar contra os interesses dos socialmente desprotegidos.

Coqui - Professora, como se deu sua aproximação com a Antropologia?
Maria Rosário - Quando chegou o momento de escolher o curso que ira fazer na universidade, a dúvida era fazer Direito ou Ciências Sociais. Bati par ou impar, caiu Ciências Sociais. Quando estava terminando o curso chegou o Pedro Agostinho. Tive bons professores, por exemplo, Maria Brandão, Zahidé Machado Neto, Inaiá Carvalho, entre outros. Maria foi uma pessoa marcante, perspicaz e muito criativa, às vezes surpreendente. Havia também o professor Antônio Luiz Machado Neto. Em suma, tive bons professores. Destacaria os dois: Maria Brandão e Pedro Agostinho. Quando estava terminando a licenciatura, ainda permanecia indecisa entre ensinar ou fazer pesquisa. Foi quando Agostinho chegou de Brasília. Ele era muito jovem e havia realizado trabalho de campo e produzido uma dissertação, na UnB, com qualidade de tese de doutorado, sobre os Kamayurá, povo tupi estabelecido no Xingu. Ele veio para a Bahia, mas ainda tinha uma preocupação muito grande, em termos científicos, pelo Xingu. O Xingu continuava parte de seu interesse etnográfico. Chegando aqui, ele procurou saber

PINEB

O PINEB é um Programa de Pesquisas radicado no Departamento de Antropologia e no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, tendo-se iniciado com um trabalho de campo entre os Índios Pataxó de Barra Velha, na chamada Costa do Descobrimento. Tal experiência desencadeou um processo de longo alcance, que teve, desde então, objetivos que são complementares entre si, e se desdobram em quatro planos:
No plano científico, o de produzir conhecimento o mais acurado possível sobre os povos indígenas do Estado da Bahia -- intenção essa que mais tarde se estendeu a seus congêneres de todo o Nordeste brasileiro --, tendo o cuidado de não vincular a pesquisa a fins práticos e imediatistas; e de fazer com que a produção de saber e a reflexão sobre ele fossem válidas como fins em si mesmos, e em seus próprios termos. Isto para fugir às estreitezas de quaisquer pragmatismos utilitaristas.
No plano didático, o de criar pessoal sistematicamente treinado para a pesquisa e o ensino superior de Antropologia, de modo a garantir a formação de quadros locais profundamente comprometidos com a problemática indígena e universitária regional, mas permanentemente articulados com esse campo científico em seus níveis supralocais. E capazes de garantir, a longo termo, a continuidade temporal das atividades do Programa, e mesmo do Departamento de Antropologia a que pertence. Procurou-se, desse modo, conjugar as vantagens locais e regionais da endogenia acadêmica -- vindas do arraigamento originário, dos especialistas assim gerados, a suas bases imediatas --, com o deliberado propósito de superar as inevitáveis limitações que um horizonte só local ou regional necessariamente acarreta. Atentando, ao mesmo tempo, contra o fácil e superficial sucumbir a modelos e valores importados, por vezes arriscado a ser quase servil, ou aos modismos que tão ligeira e fugazmente se instalam em nossa vida acadêmica.
No plano pedagógico, o de proceder de modo não-convencional, ao enfatizar uma cooperação em grupo capaz de reduzir ao mínimo a valorização social e burocrática da hierarquia acadêmica, assim como a competição interindividual e coletiva nos âmbitos interno e externo. E igualmente capaz de estimular, em simultâneo, a criatividade pessoal, garantindo, a cada membro do grupo, sem indagar de sua posição universitária, direito ao igualitário acesso ao conhecimento conjuntamente produzido, e ao uso da informação assim acumulada.
No plano político, o de usar o saber factual desse modo obtido, e a elaboração teórica que sobre ele se possa exercer, para pensar politicamente a questão indígena em todos os níveis de sua realidade. Isto de modo a gerar um potencial para a formulação de políticas - na acepção do termo inglês policies -, obviamente indigenistas, que fossem pontual, regional e nacionalmente pertinentes. E ainda para a intervenção, direta, na política indigenista, quer agindo junto à sociedade nacional e a seu arcabouço político-jurídico, quer junto aos povos indígenas, como seus aliados e assessores técnicos. Tais formulações de políticas, e as decorrentes intervenções diretas, respondem, em grande parte, por avanços importantes na situação atual dos índios na Bahia.

(Excerto do Programa do PINEB, elaborado pelo Prof. Pedro Agostinho - Maiores informações site www.ufba.br/~pineb

o que poderia ser feito para a formação dos estudantes. Ele sempre teve uma preocupação muito grande com a formação dos jovens de quem ele viria a se constituir mentor. Justamente nesse momento, fizemos um seminário com ele; matriculamo-nos no seminário, no bacharelado de Ciências Sociais, concentração em Antropologia. É interessante assinalar que a UFBA, melhor dizendo, a Faculdade de Filosofia, possui, há já bom tempo, uma concentração em Antropologia. O curso de Ciências Sociais abarca três concentrações: Sociologia, Antropologia e Ciência Política. O estudante de Ciências Sociais pode fazer a licenciatura e o bacharelado. Em geral, faz-se licenciatura e depois bacharelado. Hoje isso mudou. A pessoa, segura de sua vocação para a pesquisa, vai direto para o bacharelado. Eu fiz a licenciatura e, logo depois, o bacharelado. Foi justamente no início do bacharelado que Pedro Agostinho organizou o já referido seminário. O título do seminário era "Fricção interétnica". No curso, a gente leu sistematicamente toda a literatura produzida sob a égide da teoria da "fricção interétnica" do Roberto Cardoso de Oliveira. A teoria interétnica estava voltada, justamente, para os povos indígenas em contato com a sociedade nacional. Essa teoria foi uma boa ferramenta teórico-metodológica para se estudar os povos indígenas que já mantinham um contato mais sistemático com o Estado nacional, a exemplo daqueles estabelecidos no contexto etnográfico do nordeste. Então, fizemos esse seminário com o Pedro. O seminário foi muito interessante, muito rico. Compúnhamos um grupo relativamente pequeno, não excedia 30 pessoas. A partir daí, as pessoas começaram a definir seus orientadores, e eu solicitei ao Pedro Agostinho orientação para o bacharelado. Eu já tinha um projeto desenvolvido. Ele aceitou. Ao cabo dessa experiência, nós fizemos um trabalho de campo. O primeiro trabalho de campo mais sistemático realizado, no âmbito do Depto. de Antropologia, envolvendo um grupo de estudantes e um professor com formação antropológica.

Coqui - A Antropologia na Bahia esteve, durante várias décadas, voltada para o estudo dos elementos afros de nossa cultura. Em que momento e em que contexto começam os estudos de etnologia indígena na Bahia?
Maria Rosário - Exatamente. Era a grande tradição até a chegada do Pedro Agostinho. A tradição eram os estudos de religião, principalmente voltados para os segmentos negros, desenvolvidos por Vivaldo Costa Lima, entre outros tantos. Havia Thales de Azevedo, voltado para as tradições raciais e para os temas do quotidiano. Depois Vivaldo C. Lima o substituiu.
Então, quando Pedro Agostinho chega, a grande tradição era a dos estudos voltados para a população negra, notadamente no campo da religião. Ele, efetivamente, inaugura uma nova tradição de estudos etnológicos na Bahia, orientada para as populações indígenas. E depois desse seminário, realizado no contexto de uma disciplina formal, partimos para o trabalho de campo. Ele teve a coragem de conduzir cerca de 20, 25 estudantes, que haviam realizado o seminário como etapa preparatória, para realizar trabalho de campo fora do contexto urbano.

Coqui - Onde se realizou esse trabalho de campo?
Maria Rosário - Na Aldeia de Barra Velha, localizada nos limites do Parque Nacional do Monte Pascoal. Extremo sul da Bahia, Porto Seguro e adjacências. Isso foi um grande avanço para os estudos etnológicos. A grande questão era: a presença indígena, aqui, não se fazia notar, como, por exemplo, ocorre hoje no Rio Grande do Norte, não é? Havia uma espécie de ocultamento da presença indígena. Era como se eles não existissem, como se todos tivessem desaparecido.

Coqui - Os índios viviam uma espécie de invisibilidade.
Maria Rosário - Os índios eram absolutamente invisíveis. E foi o Pedro Agostinho quem, efetivamente, retirou-os da sua invisibilidade. Como? Para vocês terem uma idéia, começamos a fazer uma espécie de "escavação arqueológica" nas bibliotecas. Mas o que nos deu mais evidências empíricas da presença indígena na Bahia foram os jornais, principalmente o Jornal A Tarde. Isso é muito interessante. Por que a escolha dos Pataxó? Porque em 1951 houve um fato que traumatizou extremamente os Pataxó e que terminou por lhes dar visibilidade. Curiosa e ironicamente. Esse fato, segundo denominação dos Pataxó, ficou conhecido como "O fogo de 1951" ou a "Revolta de 1951". Vou contar rapidamente a história. Entre 1949 e 1950, um índio Pataxó chamado Honório Borges, preocupado com o direito deles sobre as terras, na área onde, viria a ser implantado o Parque Nacional do Monte Pascoal...

Coqui - Já era Parque na época?
Maria Rosário - Eram as primeiras demarches para a criação do Parque, mas pra lá já se deslocara uma equipe que se apresentou aos índios, dizendo que estava ali a mando do governo para medir a área. E os índios, efetivamente, colaboraram nos trabalhos de medição. Depois a gente constata, com base na documentação, que a medição estava sendo realizada, visando à criação do Parque Nacional. E os índios colaboraram, não é? A tradição oral sobre esse momento é muito interessante. Os índios, efetivamente colaboraram com a equipe que era encabeçada por um tal "Dr. Barros". Até hoje eles referem, com muita vivacidade e riqueza de detalhes, à presença desse "Dr. Barros". Depois da saída dessa equipe e da demora do seu retorno, prometida, tudo indica que os índios começaram a ficar inquietos. Provavelmente, os regionais começaram a acenar-lhes com a possibilidade de que eles viessem a ser retirados da sua área de ocupação tradicional, onde sempre estiveram estabelecidos. Nessa época, a aldeia se chamava Bom Jardim, denominação depois alterada para Barra Velha, em razão do deslocamento da foz do rio Corumbau. A retificação do cordão litorâneo parece ocorrer regularmente na região. Então, volta e meia, a foz do rio se desloca, daí a reiterada referência, pelos cronistas, por exemplo, a barras velhas. Desse modo, com o deslocamento da foz, a aldeia de Bom Jardim passou a se chamar aldeia de Barra Velha.
Voltando à história. Os índios começam a ficar preocupados. Uma liderança, Honório Borges, teve a idéia - provavelmente ela não partiu só dele, foi do conjunto de toda a população Pataxó - de ir ao Rio de Janeiro. Na época, o Serviço de Proteção ao Índio - SPI - estava sediado no Rio de Janeiro. Ele foi, fundamentalmente, para pedir ferramentas e, na expressão de um documento que registra esse momento, pedir ao presidente do SPI - Marechal Cândido Rondon - que não permitisse que o "pessoal da Índia" tomasse suas terras. O fato mostra como na época eles estavam isolados e também como o chamado "mito fundador" do descobrimento era extremamente forte. Sem dúvida nenhuma, esse "mito fundador" estava, digamos, sendo atualizado pelos regionais que viviam no entorno. As pessoas que podiam tomar-lhes as terras eram caraterizadas, denominados como oriundas da "Índia". Essa ida do Honório ao [Rio de Janeiro] é um fato extremamente importante, porque ela vai provocar, logo depois, em 1951, a diáspora Pataxó. Por quê? Essa é uma questão muito delicada. Há vários anos estou tentado esclarecer o fato, mas agora parece que reunimos maiores evidências. O que a tradição Pataxó relata é que nesse deslocamento de Honório Borges ao Rio de Janeiro, ele conheceu agentes do SPI e outras pessoas às quais confiou as inquietações dos Pataxó em relação à sua terra. Até hoje eles acreditam que duas dessas pessoas que Honório conheceu no Rio de Janeiro deslocaram-se, em 1951, para a aldeia de Barra Velha. Eu estou supondo que essas duas pessoas que chegaram aí - não reuni, ainda, as evidências necessárias - tinham ligações com o Partido Comunista. Na época, o Partido Comunista estaria tentando realizar algumas incursões às áreas rurais, como parece ter ocorrido na Bahia, entre os Pataxó, e em Minas Gerais, neste último caso, entre os Xakriabá. Vale notar que essa é uma hipótese, carente de mais sólida evidência empírica e eu estou tentando reunir mais fontes para confirmá-la ou abandoná-la. De todo modo, o fato é que duas pessoas chegaram lá, dizendo-se, respectivamente, engenheiro e tenente, conduzindo os índios para uma grande aventura. Estou apenas relatando o que preconiza a tradição Pataxó. Em resumo, para a aventura se realizar era preciso gêneros alimentícios. Então, foram ao povoado de Corumbau, próximo à Barra Velha, onde havia um comerciante, proprietário do melhor comércio da redondeza, e ali os índios, juntamente com esses duas pessoas, assaltaram o comerciante, etc. e tal. Terminaram matando o comerciante. O fato provocou uma violência tremenda sobre os Pataxó. As polícias de Porto Seguro e do Prado entenderam a ocorrência como um plano de maiores proporções, e a repressão foi desmedida. Para resumir o relato do caso, as duas pessoas estranhas à área, ou seja, os não-índios, que diziam estar ali por determinação do governo, para demarcar a área para os índios, morreram, dois índios também foram mortos, e os Pataxó se dispersaram.

Coqui - Os índios acreditavam que os dois estranhos estavam dando continuidade ao trabalho anterior?
Maria Rosário - Exatamente. As evidências eram muito fortes para fazer Honório e outros acreditar nas palavras dessas pessoas estranhas. Pouco antes, Honório tinha ido ao Rio de Janeiro, como já assinalado, e logo depois chegaram duas pessoas afirmando-se agentes governamentais com orientação para demarcar a área indígena. Eles acolheram a determinação. Como eles iam questionar diretrizes dos agentes governamentais? Então, fizeram aquilo que lhes foi recomendado. As duas pessoas morreram, assim como dois índios, e a polícia os reprimiu violentamente.

Coqui - Antes desse fato não havia histórico de conflitos envolvendo índios e não-índios?
Maria Rosário - Não. Possivelmente, havia pequenos atritos, pontuais, decorrentes de discriminação. Situações a que os índios, invariavelmente, são submetidos, mas nada que, efetivamente, ganhasse a dimensão que ganhou esse fato. Mulheres pataxó foram seviciadas, violentadas; homens pataxó foram violentamente espancados, muitos tendo, segundo relatos dos índios sobreviventes, morrido em decorrência desses espancamentos. A coisa foi tão séria que por vários dias, os jornais noticiaram a revolta dos índios Pataxó. O saldo da aventura é bastante negativo, como vimos: mortes e a dispersão da população Pataxó. O fato, ainda hoje, repercute, negativamente, na memória Pataxó.

Coqui - E novamente o conflito envolvendo os Pataxó e não-índios está na mídia.
Maria Rosário - Sem dúvida. Vamos retomar o ponto da definição da minha vida profissional. Essa viagem de campo, à qual me referi, abriu para mim o que seria, afinal de contas, minha escolha profissional. Estávamos entusiasmados com nosso primeiro trabalho de campo, mas Pedro Agostinho é muito criterioso. Antes do trabalho de campo, houve toda uma preparação prévia, como vimos. O já mencionado Seminário foi apoiado em significativa base bibliográfica. Foi aí que nos confrontamos com esse ocultamento - a própria literatura especializada considerava estintos os Pataxó e outros grupos da região - e partimos para a consulta aos jornais. Descobrimos, através dessa fonte, que em 1951 houvera aquela tremenda repressão e resolvemos fazer o trabalho de campo na aldeia Pataxó.

Coqui - O conflito marca a visibilidade dos Pataxó?
Maria Rosário - Exatamente. Se em 1951 eles estavam lá, é possível que em 1970 continuassem no mesmo lugar, era a suposição lógica prevalecente entre nós. A viagem foi uma aventura. Não tínhamos dinheiro. A universidade pública, como vocês sabem, quase invariavelmente não dispõe de recursos; mas os colegas eram muito impetuosos e estavam determinados a realizar o projeto. Daqui e dali, no final, conseguimos recursos para a viagem. A SULBA nos deu um ônibus. Chegamos lá! A partir daí, a história começa. Nossa chegada à aldeia foi interessantíssima. Pedro Agostinho, de barba e cajado, acompanhado de um monte de estudantes... Os Pataxó ficaram deslumbrados. Um bando de estudantes saídos de uma cidade grande como Salvador para "reparar" como eles viviam. Foi a primeira experiência deles com antropólogos. Aliás, um antropólogo só, pois nós éramos estudantes. Permanecemos lá uma semana. Eles estavam numa situação de penúria tremenda. Prevendo isso, havíamos transportado boa reserva de alimentos; preparávamos comida para nós e compartilhávamos com eles. Para nós foi uma experiência extraordinária e para eles também, suponho. Voltamos. A partir daí, não tive mais dúvidas, comecei a definir que eu queria me tornar antropóloga. Fiz o meu primeiro projeto de caráter etnológico, voltado para o estudo dos Kaimbé de Massacará, aldeia localizada no município de Euclides da Cunha.

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