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Em debate o futuro de Kyoto

CB, Mundo, p. 28
27 de Nov de 2005

Em debate o futuro de Kyoto
Países ricos e em desenvolvimento começam a negociar a segunda fase do tratado firmado para conter o efeito estufa. Para ambientalistas, documento já está obsoleto

Representantes de 190 países se reúnem a partir de amanhã em Montreal, no Canadá, para avaliar o futuro do Protocolo de Kyoto, iniciativa multilateral para reduzir a poluição atmosférica e deter o aquecimento global. O documento atual, que vigora até 2012, impõe aos países desenvolvidos limites para emissões dos gases causadores do efeito estufa, produzidos principalmente por fábricas, usinas termoelétricas e carros. O encontro deverá marcar o início oficial das negociações para o segundo mandato do protocolo, que começa em 2013. Ministros de Meio Ambiente de todo o mundo participarão dos últimos três dias da reunião, que deve ser encerrada no próximo dia 9. Há, no entanto, poucas perspectivas de que um acordo seja alcançado.
O Protocolo de Kyoto foi assinado em 1997, mas só entrou em vigor em fevereiro último - e, mesmo assim, sem a participação dos Estados Unidos, país que lidera as emissões e vê no tratado uma ameaça à sua indústria. Pelo texto em vigor, restam seis anos aos países desenvolvidos (do grupo chamado Anexo 1) para reduzir suas emissões em 5,2%, com base n os níveis de 1990. Nações em desenvolvimento, como Brasil, China e Índia, também se comprometem a combater o aquecimento global, sem metas compulsórias.
A expectativa é de que os países do Anexo 1 assumam metas maiores de redução para o pós-2012. Para o pesquisador canadense Philippe Lepestre, o tratado em vigor já está obsoleto. "Será que vale mesmo a pena manter um acordo que só poderá ser respeitado à custa de artifícios contábeis, e que continua sendo rejeitado pelos EUA?" Mas, segundo o italiano Giulio Volpi, coordenador para Mudanças Climáticas da WWF na América Latina, não há outra solução. "O Protocolo de Kyoto é até hoje a única ferramenta internacional na luta contra as mudanças climáticas", disse ao Correio.
Já os países em desenvolvimento deverão ser pressionados a aceitar compromissos mais estritos. Mas eles se recusam a aceitar as mesmas restrições impostas aos países ricos, pois julgam o uso de energia - para levar eletricidade a favelas ou construir estradas, por exemplo - essencial no combate à pobreza. As metas para os países pobres poderiam incluir a manutenção dos níveis atuais de emissões, promessas de "limpar" indústrias mais poluidoras, como as termoelétricas a carvão, e usar mais intensamente energias não poluentes, como a solar e a eólica.
Alguns especialistas defendem metas setoriais. Haveria, por exemplo, quantidades de carbono que poderiam ser emitidas por tonelada de cimento, além de padrões mundiais para emissões automotivas.
O único consenso é de que os 5,2% de redução fixados no protocolo não terão efeito significativo sobre o clima. "Tudo será muito complexo no encontro de Montreal", prevê Elliot Diringer, diretor do Centro Pew para a Alteração do Clima Global, em Washington. Um relatório da Comissão Européia se refere às negociações climáticas como "um nó górdio que exigirá muita criatividade para ser desatado".

Meta inicial cumprida
Se o Protocolo de Kyoto terminasse hoje, suas metas estariam cumpridas. Segundo o relatório mais recente divulgado pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, entre 1990 e 2003 os países industrializados reduziram a soma de suas emissões de gases em 5,9% - acima dos 5,2% exigidos. O grosso das reduções ocorreu na Europa central e oriental, nos países em transição para a economia de mercado, como resultado do colapso industrial que se seguiu à queda do comunismo, na década de 90. Nos últimos anos, as emissões têm se mantido estáveis, mas a previsão é que subam mais de 10% até 2010. Enquanto países ex-socialistas, como Rússia, Polônia e Romênia, reduziram a liberação de gases estufa em 39,6%, economias mais desenvolvidas, como EUA, Espanha e Japão, elevaram as suas emissões em 9,2%. O Brasil aparece com aumento de 11,1% entre 1990 e 1994. "O grande problema do Brasil é o desmatamento", conclui o ambientalista italiano Guido Volpi.
Ele rejeita o argumento, apresentado pelos EUA, de que uma redução brusca dos gases poluentes prejudicaria o crescimento econômico e aumentaria o desemprego. "O impacto do furacão Katrina está avaliado em US$ 150 bilhões, valor suficiente para desenvolver energias renováveis que reduziriam a emissão", destaca. Ele cita como exemplo as Filipinas, que tiram 40% da eletricidade da geotérmica, e a China, que adotou lei estipulando que as energias renováveis deverão responder até 2020 por 20% da demanda nacional. "O que impede outros países de adotar medidas semelhantes é o lobby da indústria do petróleo e carvão", lamenta.

CB, 27/11/2005, Mundo, p. 28

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