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Em busca de ossadas no Para

JB, Pais, p.A5
03 de Abr de 2005

Em busca de ossadas no Pará
Polícia Federal e Exército mapeiam cemitérios clandestinos em região onde Dorothy foi assassinada
Em silêncio, de forma secreta, a Polícia Federal e o Exército estão mapeando os cemitérios clandestinos no Pará. Já começaram a desenterrar ossadas de vítimas despejadas pelos pistoleiros. A Operação Pacificação- iniciada após o assassinato da missionária americana Dorothy Stang - já mapeou três cemitérios clandestinos e, na quarta-feira, desenterrou ossadas em um deles.
0 primeiro cemitério confirmado fica no município de Novo Progresso. Lá, as equipes desenterraram ossadas e partes de ossadas. Segundo fontes do governo federal que conduz as investigações de forma secreta -, são ossadas de vítimas que foram queimadas antes de morrer. Em uma cova, teriam sido enterradas quatro vítimas dos pistoleiros. Agora, os peritos procuram novas covas na área. Só os exames poderão comprovar o número de pessoas enterradas no primeiro cemitério clandestino. - As ossadas, partes de corpos humanos e materiais encontrados, passarão por rigorosas perícias e serão confrontadas com as características de vítimas do crime organizado na região. Os serviços de inteligência da Polícia Federal e os homens do Exercito na região, que estão recorrendo a informantes, também mapearam outros dois cemitérios clandestinos -no Pará, em áreas cujos nomes ainda estão sob sigilo.
Somente a PF está com 70 homens no Pará. Além dos cemitérios clandestinos, estão sendo realizadas prisões de diversas pessoas procuradas pela justiça e suspeitos de envolvimento com crimes diversos. Ao todo, já foram presas 25 pessoas suspeitas de envolvimento com a pistolagem. A Polícia Federal também aumentou o número de prisões em flagrante. Só no dia 12 de março, foram presas outras 19 pessoas, seis delas envolvidas com tráfico de maconha e crack.
No dia 11 de março, a PF e o Exército conseguiram apreender 20 armas no município de Porto de Moz. Em Anapu, onde foi assassinada a missionária americana, a população já entregou 37 armas espontaneamente à campanha do desarmamento. A população, para os investigadores, demonstra total interesse em colaborar com o desarmamento e ajuda os policiais, dando informações precisas.
A Operação Pacificação tem ainda o objetivo de desvendar casos ainda insolúveis, que podem ter grande repercussão sobre o crime de pistolagem. A Polícia Federal reabriu a investigação dos assassinatos do colono Daniel Soares e dos fazendeiros Antenor Marques Pinto, o "Novinho", e Heron Sales, no dia 21 de fevereiro. Novinho estava na sede de sua fazenda Juazeiro, na rodovia PA-160, município de Eldorado dos Carajás, quando foi assassinado, por volta de 21h. Em Parauapebas, Heron Sales foi assassinado dentro de casa. Foi na região de Eldorado do Carajás que 19 sem-terra foram assassinados em abril de 1996.
0 trabalho da PF inclui quase uma dezena de buscas e apreensões nas residências e escritórios de pessoas suspeitas, somente na região de Novo Progresso. Entre os presos em outras regiões do Pará estão um diretor do Centro de Recuperação Regional de Altamira, um coronel da PM.
A Polícia Federal e o Exército estão auxiliando o Incra a realizar vistorias em fazendas em algumas regiões do Pará, incluindo os municípios de Belo Monte e Bacajá. Nestas regiões, os técnicos do governo são constantemente ameaçados pelo crime organizado quando tentam fazer a reforma agrária.
As operações no Pará contam com a participação de policiais federais dos Estados do Rio de Janeiro, Ceará e Rio Grande do Norte. Participam ainda policiais lotados na Coordenação Geral de Defesa Institucional da PF. Os homens do Exército ajudam com informações, logística e apoio.
Segundo fontes do governo federal, a Operação Pacificação não tem prazo para terminar. Esta ação da PF no Pará, que vinha sendo planejada antes da morte da missionária americana, pode representar o resgate da presença do poder público em áreas de maior conflito fundiário e de pistolagem, segundo fontes do governo.

Crime repercutiu no exterior
Na manhã do dia 12 de fevereiro, a missionária americana Dorothy Stang, de 74 anos, foi assassinada com seis tiros em Anapu, no Pará. Há mais de 20 anos, ela trabalhava no estado defendendo causas ambientais e dos trabalhadores rurais sem-terra e afirmava que a violência fundiária, os crimes ambientais e a grilagem de terras na região estavam fora de controle. 0 crime repercutiu no exterior e três agentes do FBI foram enviados para a região.
No dia seguinte ao crime, a Polícia Federal e a Polícia Civil do estado já tinham o nome dos quatro suspeitos do assassinato e o governo federal começou a atuar no caso. Cinco dias depois, o Exército começou a enviar 2 mil militares para a região.
Uma semana depois do crime, o agricultor Amair Feijoli da Cunha, de 37 anos, conhecido como Tato, acusado de ter intermediado o crime se entregou à polícia paraense. Nos dois dias subseqüentes, os acusados de serem os autores dos disparos, Rayfran das Neves Sales, o Fogoió, e Clodoaldo Carlos Batista, conhecido como Eduardo, foram presos na região de Altamira, cidade vizinha Anapu.
Eles assumiram o crime e afirmaram que a morte teria sido encomendada por R$ 50 mil pelo pecuarista Vitalmiro Bastos de Moura, conhecido como Bida.
Depois de 42 dias de busca, o fazendeiro se entregou domingo passado à Polícia Federal em Altamira, mas negou a participação no crime.
Apesar das prisões, ambientalistas da região afirmam que ainda pode haver outros envolvidos no crime, que aconteceu uma semana depois de Dorothy ter uma reunião com o secretário de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, e denunciar que quatro pessoas da região estavam recebendo ameaças de morte de fazendeiros e posseiros. Ao longo dos últimos meses ela avisou diversas vezes que vinha sendo ameaçada de morte.

JB, 03/04/2005, p. A5 (País)

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