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Em busca da sustentabilidade

OESP, Agrícola, p. 6-7
11 de Abr de 2007

Em busca da sustentabilidade
Pesquisadores da Embrapa desenvolvem sistema que analisa o nível de sustentabilidade de uma propriedade rural

Niza Souza

A exigência de produções sustentáveis como chave para o promissor mercado mundial está lançando um grande desafio para a agricultura moderna: oferecer justiça social e preservação do ambiente com garantia de lucro. A pesquisa brasileira começa a apresentar formas práticas de aplicação do conceito, que por enquanto é viável, comprovadamente, em pequenas propriedades.

Os pesquisadores Geraldo Stachetti Rodrigues e Clayton Campanhola, da Embrapa Meio Ambiente, criaram o método Avaliação Ponderada de Impacto Ambiental e Atividades do Novo Rural (Apoia-NovoRural), que está sendo testado pela equipe do pesquisador Pedro José Valarini.

O método é uma ferramenta de gestão ambiental que calcula a contribuição da atividade rural ao desenvolvimento sustentável, analisando a propriedade em cinco dimensões: ecologia da paisagem, compartimentos ambientais, valores socioculturais, econômicos e gestão e administração. As dimensões são divididas em 62 indicadores, como qualidade da água e do solo, lucro, diversidade de fontes, distribuição de renda e valorização da propriedade. Para ser considerado sustentável, o produtor tem que atingir pelo menos 0,7 em todos os indicadores.

RESULTADOS

Já foram avaliadas 30 propriedades rurais, dez orgânicas, dez convencionais e outras dez hidropônicas, todas em São Paulo. Os primeiros resultados mostram que as propriedades orgânicas qualificam melhor três (ecologia da paisagem, compartimento ambiental e gestão e administração) das cinco dimensões. No geral, apenas quatro propriedades, todas orgânicas, atingiram índice médio superior a 0,7. As convencionais ficaram em média, com nível 0,5 e as hidropônicas, em torno de 0,6.

Isso não significa que uma grande propriedade com monocultura não possa ser sustentável. 'Não devemos reduzir a dimensão sustentável apenas a procedimentos técnicos', diz o representante da FAO na América Latina, José Graziano da Silva. Ele destaca que a cana, por exemplo, absorve o mesmo volume de carbono que emite na etapa de produção e no uso posterior do álcool gerado e ainda é autosuficiente em energia elétrica. 'Muitas áreas usam adubação de cobertura com matéria orgânica e adubação verde para recompor o nitrogênio e a fertilidade do solo', diz. 'Neste caso, só não é sustentável se o produtor usar mão-de-obra em condições desumanas, pois falta-lhe a perna da sustentabilidade social.'

Para o presidente da Fundação de Agricultura Sustentável (Agrisus), Fernando Penteado Cardoso, antes de ser sustentável, o agricultor precisa se sustentar. 'Se não ganhar dinheiro, ele vai embora do campo.' Outra bandeira da fundação é o plantio direto, o que, para Cardoso, permite a uma grande área com monocultura se adequar ao conceito. Segundo a fundação, o Brasil tem cerca de 45 milhões de hectares plantados com culturas anuais, 22 milhões em sistema de plantio direto.

Grupo quer desenvolver certificação única

O ex-ministro Roberto Rodrigues (núcleo econômico), o diretor do Observatório Social da CUT, Kjeld Jakobsen (social), e o biólogo Cláudio Pádua (ambiental) coordenam um movimento, chamado Iniciativa Brasileira de Verificação da Atividade Agropecuária, que pretende criar um sistema articulado para integrar os selos de certificação brasileiros. 'A missão é criar um sistema de verificação voluntária e certificação independente que contribua para reduzir impactos, estimulando mudanças socioambientais com agregação de valor aos produtos agropecuários', explica Rodrigues, que atualmente é presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) e coordenador do Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas (FGV). 'Temos condições de criar um padrão de certificação de alto nível. Se não o fizermos, acabaremos tendo de engolir critérios importados de outros países, fundados em realidades incompatíveis com a brasileira.'

O biólogo Cláudio Pádua vai além. 'A iniciativa pretende criar um selo único de sustentabilidade para produtos brasileiros, que seja aceito no mundo inteiro. Pretendemos chegar a uma certificação da propriedade e não apenas de um produto.' Ele admite que a missão é difícil, pois cada setor tem seus interesses distintos. E é justamente por isso que o grupo tem representantes de todas as vertentes envolvidas. 'Estamos trabalhando para cada um ceder um pouco e chegarmos a um consenso.' A expectativa é de que isso ocorra em dois anos. Só a partir desse consenso será possível definir um sistema para a certificação.

Grande ou pequeno, caminho é o mesmo

Com adoção de ações conservacionistas, como plantio direto, grande propriedade também pode ser sustentável
Quando converteu a Fazenda Sula em orgânica, em 1997, Ricardo Schiavinato já considerava a propriedade, de 100 hectares, em Serra Negra (SP), sustentável. Dez anos depois, entretanto, ele considera-se ainda mais sustentável. A Sula faz parte do programa Apoia-NovoRural, da Embrapa, e sua avaliação subiu de 0,61, em 2000, para 0,78 no ano passado. Aliás, não seria considerada sustentável hoje se mantivesse o mesmo índice da primeira avaliação.

O produtor diz que conseguiu melhorar vários aspectos, em especial a qualidade da água. 'A água sai da fazenda melhor do que entra.' Graças ao aumento das áreas arborizadas, principalmente nas encostas. São cerca de 20 mil árvores plantadas, nativas e frutíferas. 'Isso ajuda a melhorar a ecologia da paisagem, oferece sombra aos animais e reduz os riscos de erosão.'

Ele destaca outras ações importantes, como recomposição da mata ciliar e plantio direto. Para atender às outras pontas do tripé, Schiavinato registra todos os funcionários, que têm boas condições de vida, e vive do que planta.

GRANDE, PORÉM SUSTENTÁVEL

O produtor Paulo Rodrigues gerencia duas propriedades, uma em Jaboticabal (SP) e outra em Delfinópolis (MG). Ao todo, são cerca de 6 mil hectares de área plantada com cana-de-açúcar. Para alguns ambientalistas, ele jamais seria exemplo de sustentabilidade, mas Rodrigues garante que, 'apesar da monocultura e da grande área de plantio, somos sustentáveis, sim.'

Ele se apóia na prática do plantio direto, usada desde a década de 1970, quando adotou também a rotação de cultura. 'Fazemos rotação com soja em 15% da área, anualmente. Depois, é feito o plantio da cana em cima da soja', explica. Outra medida importante foi em relação à colheita. Em 1992, lembra Rodrigues, iniciou um processo gradual de mecanização da colheita da cana. Começou com 2% da área e hoje já são 98%. 'Neste restante de área que falta não é possível mecanizar, por causa da topografia. Por isso, estamos estudando outras alternativas de cultura para estas áreas, que no futuro deixará de ter cana.'

Outra ação importante é o projeto de reflorestamento permanente, pelo qual já foram plantadas 400 mil árvores nas duas propriedades. 'Usamos os recursos naturais de forma conservacionista e fazemos também manejo integrado de pragas', destaca, lembrando que em 2000 iniciou dois projetos, o de resíduo zero e outro para eliminar, gradativamente, o uso de produtos químicos.

Na área social também há diversas ações de valorização do homem. Uma preocupação desde o tempo em que o avô administrava a fazenda. Muito mais do que o registro em carteira para todos os funcionários, a fazenda usa sistema de remuneração variável e dá participação nos lucros.

Como seu avô já fazia, Rodrigues incentiva os funcionários a estudarem. 'Pagamos um curso profissionalizante ou faculdade, conforme a vontade de cada um, mesmo que eles não sigam carreira na fazenda. Em contrapartida, eles não podem reprovar.'

Rodrigues lembra ainda que a fazenda mantém um programa de financiamento para moradia, sem juros. 'Mais de 90% dos funcionários têm casa própria.'

OESP, 11/04/2007, Agrícola, p. 6-7

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