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Eleições 2004: resultados e desafios para o movimento indígena

Coiab-Manaus-AM
20 de Nov de 2004

O resultado das eleições de 2004, confirma a tendência já registrada nas eleições de 2002, de uma maior participação indígena na disputa por assentos nas câmaras municipais de todo o país, refletindo significativamente um avanço na compreensão por parte dos líderes, povos e organizações indígenas de que esse espaço pode e deve ser ocupado como um instrumento a mais ao serviço dos interesses dos povos indígenas, independentemente do vínculo partidário dos candidatos indígenas.

O resultado, reflete, por outro lado, em alguns casos, mudanças no direcionamento do chamado voto étnico, tradicionalmente manipulado pelos partidos e políticos tradicionais, pois em alguns casos as comunidades tiveram participação direta na indicação dos candidatos indígenas, conseqüentemente na sua eleição. Não quer dizer que a estrutura e prática político-partidária tradicional seja tão tranqüila e sem contradições no interior das comunidades indígenas, pois na sua origem implicam em divergências de ordem ideológica e programática. Dessa forma, o envolvimento neste exercício democrático, de sair candidatos através de diferentes siglas partidárias, significou ainda, em alguns municípios, numa aparente fragmentação e enfraquecimento do movimento indígena, enquanto força política possível, no obstante a diversidade de povos e culturas que o sustentam.

Em efeito, a distância entre o número de indígenas eleitos e o número de concorrentes pode ser uma expressão desta fragmentação ou divisão interna provocada pela diversidade de partidos políticos aos quais se filiam os indígenas.

A experiência do povo Saterê Mawé, no Município de Barreirinha, no Estado do Amazonas, e do povo Xacriabá, no município de São João das Missões, no Estado de Minas Gerais, aponta, porém, possibilidades de unificação da perspectiva indígena, acima de filiações partidárias. Em Barreirinha, por exemplo, mais de 80% da população indígena votou no prefeito eleito, Mecias Pereira Batista / Saterê-Mawé.

Esse interesse em participar na política partidária se reflete no crescente número de candidatos indígenas. Mas os resultados são também sintomáticos, no sentido de o excesso de candidatos pode ter dispersado os votos dos eleitores indígenas, além de poder ter acirrado divisões internas. Dessa forma, nos três Estados -Amazonas, Amapá e Mato Grosso- onde a assessoria de comunicação da Coiab teve menos dificuldade em fazer o levantamento registrou-se um número de 106 indígenas candidatos, 103 a vereadores, 02 a prefeitos, e 01 a vice-prefeito. No Amazonas, de 84 candidatos a vereador, foram eleitos 17; dos dois candidatos a Prefeito - um em São Gabriel da Cachoeira e outro Barreirinha- foi eleito o deste último município. No Município de Oiapoque, no Amapá, de 07 candidatos a vereador, foram eleitos 03. E no Mato Grosso, o candidato a vice-prefeito, em Campinápolis, não foi eleito. De 14 candidatos para vereador foram eleitos 04.

Face a esses resultados, as instancias representativas e os líderes do movimento indígena têm o desafio de aprofundar na discussão sobre a questão da política partidária, tanto nas suas potencialidades ao serviço do movimento indígena como a respeito de seus efeitos negativos, o mesmo sobre os desafios que implica a participação nesses pleitos que até hoje carregam vícios e artimanhas inerentes à luta pelo poder a que os não índios estão costumados no interior dos partidos políticos tradicionais. Certamente aumentou nos últimos anos o número de indígenas participando como vereadores nas Câmaras municipais, e em alguns casos como vice-prefeitos e nas últimas eleições como prefeitos. Mas é notável que falta à maioria deles -os vereadores- capacitação para exercer o cargo e principalmente para defender à altura os direitos de seu povo. Percebe-se também que as comunidades indígenas ainda não tem consciência plena sobre o seu potencial de voto e a necessidade de se votar nos candidatos indígenas.

O movimento indígena, além desta discussão, precisaria ainda avançar na busca de outras alternativas de participação política, que não seja a estrutura político-partidária tradicional. Independentemente de seu vínculo político e ideológico, os líderes e organizações indígenas precisam discutir um espaço próprio onde possam aglutinar e definir demandas e ainda indicar os representantes dos povos indígenas ao Legislativo Brasileiro. O desafio neste sentido é trabalhar pela construção de um Parlamento Indígena, um tipo de Congresso dos Povos Indígenas, onde todos estejam representados, de tal forma que a nomeação de parlamentares indígenas não passem necessariamente pela via dos partidos políticos, mas por esta instância deliberativa própria.

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